EUA, Irã, Brasil e a cegueira ideológica

Opinião do blog

Sempre digo aos amigos: se me tornar fanático por alguma idéia ao ponto em que não consiga levar em conta qualquer ponderação sobre ela, por mais sensata que seja, matem-me rapidamente e sem dor. Prefiro a morte do que me tornar um ser dirigido por idéias pré-concebidas, venham de onde vierem.

Porque a ideologia fanatiza muito mais do que a religião. Cega. Torna o indivíduo um robô teleguiado que precisa consultar suas fontes de sabedoria para ter uma opinião, ignorando solenemente aquela voz interior que grita, desesperada, que alguma coisa não bate com aquilo em que se está depositando tanta fé.

A discussão bizantina sobre se Dilma deveria ou não receber Obama ou se deveria ou não afrontá-lo com acusações e exigências assemelha-se em tudo à gritaria que fizeram por conta da visita de Mahmoud Amadinejah ao Brasil, que, de tanto que gritaram, acabou não ocorrendo.

É absolutamente ridículo dizerem que o Irã cometeu mais barbaridades do que os EUA. Se não recebemos Ahmadinejad – mesmo que tenha sido por decisão dele diante da possibilidade de a mídia local desencadear uma catarse contra si –, foi por uma burrice; se não recebêssemos Obama, seria por outra. Nem um nem outro criaram os regimes equivocados que presidem.

Em qualquer dos dois casos, discursos afrontosos atirados nos rostos dos visitantes seriam igualmente idiotas. Somos anfitriões. Podemos ponderar, até. Os descontentes com políticas norte-americanas ou iranianas poderiam pleitear reuniões com Obama ou Ahmadinejad. Diriam muito mais e talvez obtivessem alguma coisa. Com intolerância, não obterão nada.

Os EUA matam inocentes com suas guerras alucinadas, torturam, infringem até as próprias leis no desrespeito amplo que praticam cotidianamente contra os direitos humanos. O Irã adota punições medievais contra seu povo por questões de foro íntimo de cada indivíduo tais como sexualidade ou religião. Mas e o Brasil, o que tem a ensinar a esses países?

Creio que foi o próprio Ahmadinejad quem bem lembrou que um país em que a tortura está em qualquer delegacia da mesma polícia que já foi acusada várias vezes pela ONU de execuções sumárias, nada tem a ensinar nem aos americanos, nem aos iranianos.

Se disserem que os crimes do Irã e dos EUA são cometidos pelo Estado, direi que se um ser humano é torturado ou executado dentro de órgãos do Estado como a polícia, essa é, sim, uma política de Estado igual às de americanos e iranianos. Podem ter certeza de que não haveria tortura nas cadeias brasileiras sem a conivência dos governadores.

Que bom que Obama vem, portanto. Seria péssimo se acontecesse o que aconteceu com Ahmadinejad, quando a gritaria da mídia perturbou a relação do Brasil com outra nação com a qual mantém relações diplomáticas e comerciais, as quais obrigam chefes de Estado a se visitarem mútua e periodicamente.