Feliz aniversário, minha filha distante

Crônica

Naquela tarde de 26 de abril de 1986, eu e a mãe de Gabriela decidíramos sair para fazer um lanche, apesar de que, por estar no último mês de gravidez, minha jovem esposa não deveria. Foi dito e feito: durante o lanche, começou a sentir dores discretas.

Como estávamos há algumas quadras do hospital, fomos caminhando. Examinada, constatou-se que estava em trabalho de parto.

Estávamos só os dois, no hospital. Carla, a primogênita, então com quatro anos, fora enviada à casa da avó materna. Optamos por deixá-la lá enquanto a irmãzinha não aportava no mundo. A decisão se revelaria sábia, porque haveria complicações no parto.

Tal qual o neto do jornalista Ricardo Noblat – que, no domingo, relatou, ansioso, os problemas do netinho –, a criança aspirara o líquido amniótico, que lhe congestionou os pulmões. Assim, também foi para a UTI neonatal.

Quando vi Gabriela pela primeira vez, entrei em pânico. Jamais vira um ser tão miudinho. Seus pezinhos eram torcidos para dentro. Achei que nascera com defeito físico, apesar de os médicos negarem. Mas quem tira essas minhocas da cabeça de um pai com a filha na UTI?

Não sabia o que dizer à minha esposa, quando, no quarto de hospital, exasperava-se por ainda não lhe terem trazido a filha que acabara de nascer. Naquela noite, não dormi. Perambulei pelo hospital entre lágrimas, suores frios, tremores e o mais puro desespero.

Na tarde do dia seguinte, finalmente mãe e filha se reuniram. Jamais senti tal alívio, depois daquele dia.

Apesar de escrever isto nas últimas horas de 25 de abril, na Austrália já é dia 26. Gabriela vive lá, do outro lado do mundo.  Pergunto-me como fui permitir que a minha filha me deixasse. Há um ano e meio que não a vejo. Não sei como suporto essa dor.