A recaída de Victoria

Crônica

Com uma guerra política em curso, sei que tomo o tempo do leitor ao vir aqui cobrar a conta da leitura que lhe ofereço cotidianamente. Quem paga tal conta não é o Lula, o Zé Dirceu ou o Carlinhos Cachoeira, mas você, leitor. O acordo sempre foi este: de vez em quando, venho aqui desabafar sobre minha única fraqueza, a saúde de minha filha Victoria. E você me lê.

Desde julho do ano passado, ela vinha melhorando a olhos vistos. Após uma internação de 30 dias, que terminou naquele mês, e de uma suspeita de septicemia, que acabou não se concretizando, ela nunca mais adoecera. Mas eis que, de uma semana para cá, começou a ter febre. Dali em diante, o eterno, interminável e impiedoso script se cumpriu com precisão milimétrica.

Victoria foi piorando, piorando até que, ontem à tardinha, uma ambulância aportou diante do prédio em que resido a fim de levá-la ao hospital. Lá chegando, pouco se conversou: ela foi direto para a Unidade de Terapia Intensiva.

Essa é a minha criptonita. Ver a Victoria sofrer é o único medo insuportável que me restou.

Nada, nem a pior tortura, nem a visão de minha própria morte me assustariam tanto quanto me aterroriza vê-la sofrer. E ela ter recaído na doença, estar agora ligada àqueles aparelhos, tudo isso me faz sentir como se vivesse preso em um eterno déjà vu. Parece que eu e ela caminhamos, caminhamos e voltamos sempre ao ponto de partida…

Ontem, ainda no pronto-socorro, enquanto esperava para “subir” para a UTI, ela teve a primeira convulsão em meses. Achava que não veria mais aquilo. E achava que ela não voltaria para o hospital, ainda mais para a UTI, e muito menos com pneumonia de novo, que, no caso dela, é gravíssima, pois se alguém com seu quadro clínico é tolhido por uma pneumonia de último grau o risco de óbito chega a tenebrosos 90%.

Sei que estou negativista, mas vai passar. Foi o choque de realidade, da consciência de que tenho que aprender a conviver com essa situação. De que é um auto-engano achar que ela não recairá. Mas sei que em vez de me lamuriar por ela estar sofrendo devo tentar mitigar esse sofrimento. Todavia, sou só um homem. Falível, fraco, impotente. Mas eu me levanto.

Vou ficando por aqui. Passei em casa – resido perto do hospital – para pegar uma muda de roupa e já volto para lá. Minha mulher não pode ficar. Está resfriada. É um risco para a menina, ainda mais estando ela na UTI.

A madrugada já vai alta e não posso mais deixar a Victoria sozinha. Só queria soltar um pouco a angústia, aqui. E, quem sabe, durante o dia ler as palavras de conforto que sempre me deixam e que tanto ajudam não só a mim, mas à minha família. É bom saber que há tanta gente solidária, ainda.

E me perdoe por ocupá-lo com meus problemas, leitor. É só de vez em quando, você sabe. É só hoje. Amanhã, sei que estarei em condição de retomar normalidade do trabalho neste blog. Terei muito tempo naquele hospital nos próximos dias. Mas hoje não deu.

PS: durante esta terça-feira não terei como responder a comentários, pois os liberarei pelo celular.