Em defesa da Seleção

Opinião do blog

 

A overdose de opiniões sobre “A” derrota parece ter praticamente esgotado o assunto, até por ação de uma patética uniformidade opinativa oriunda do medo de divergir e da “necessidade” psicótica de grande parte dos brasileiros de se autoflagelar com requintes de crueldade.

Desde o ano passado muitos descobriram que a censura oficial dos anos de chumbo foi substituída por um ímpeto censor diferente, do qual o pior efeito é a autocensura dos que temem danos à própria imagem se divergirem do consenso momentâneo que se estabelece sobre várias questões.

Foi assim durante as manifestações de junho de 2013. Posso garantir ao leitor que muitos dos que sabiam que aquele movimento só serviria para desgastar Dilma Rousseff – e para mais nada –, de forma ignóbil fizeram mais do que se calar: aderiram ao que achavam ser errado.

Como sei disso? Muitos amigos me recomendaram que não contestasse o que, então, desfrutava de apoio quase unânime no país – cerca de 80% dos brasileiros chegaram a apoiar aquilo. Fizeram-me inúmeras ponderações sobre “suicídio imagético”.

Hoje, para os que se calaram sobre aquele movimento de massas ficou tão fácil criticá-lo quanto, para os que o defenderam de forma irreversível, ficou difícil voltar atrás e reconhecer o erro de avaliação.

Isso, porém, não muda o fato de que a grande maioria percebeu que aquele movimento resultou em nada, se se desconsiderar o prejuízo a um único partido político.

Cumpre-me, pois, nadar de novo contra a corrente dizendo o que penso do “vexame” da Seleção e – para os que substituíram o complexo de vira-lata pelo de ameba – “do Brasil”. Vou, aqui, defender a Seleção.

Mas, antes, faço algumas outras considerações.

A quantidade de cretinices que se leu e ouviu nos últimos dias deve superar a de estrelas em uma noite de firmamento límpido. A pior dessas cretinices foi compararem Brasil e Alemanha como sociedades. A segunda pior foi atribuírem a derrota “vexaminosa” ao governo Dilma.

Comecemos pela segunda: se o desempenho de uma seleção de jogadores de futebol for mérito ou demérito de governos, então o melhor de todos os governos brasileiros deve ter sido o do ditador Emílio Garrastazu Médici, durante o qual o Brasil sagrou-se tricampeão com um magnífico futebol.

Mas a comparação entre o bem-estar social do povo germânico e do tupiniquim é muito pior. A história germânica remonta a uns 4 mil anos. Precisa dizer mais?

Chegaram a comparar a saúde, a educação e até a quantidade de prêmios Nobel que o povo alemão conquistou. Por que? Por causa do futebol…

Se futebol fosse medida de desenvolvimento social os pentacampeões deveriam ser os alemães, não os brasileiros. A nossa hegemonia nesse esporte ao longo do século XX e na primeira década do século XXI – com a conquista do penta, em 2002 – decorre, inclusive, de nosso subdesenvolvimento.

A valorização do futebol, no Brasil, é um dos passivos do país. Este que escreve não torce por nenhum time de futebol e sempre se desesperou com o verdadeiro transe deste povo que esse esporte desencadeia.

Porém, minha opinião sempre foi a de que realizar uma Copa por aqui nada tem que ver com o tempo, a atenção e os recursos exagerados que o brasileiro despende com um simples esporte.

A Copa de 2014 está sendo a nossa grande oportunidade de mostrar ao mundo que o Brasil é um excelente roteiro turístico e, além disso, de que somos capazes de realizar, com brilho, um grande evento internacional.

Isso sem falar na montanha de dinheiro que o país está ganhando com a Copa, em um nível de lucratividade que supera em muito os custos.

Então, vamos à defesa da Seleção. Não são necessários muitos neurônios para entender por que ocorreu o “desastre” desportivo. E este não se deveu, apenas, a nenhum dos jogadores brasileiros em campo, com exceção do goleiro, ter disputado uma Copa.

É claro que foi uma aposta extremamente ousada de Felipão convocar uma equipe virgem em Copas do Mundo, mas a Copa das Confederações insinuava que aquela equipe poderia brilhar, de novo, em outra competição internacional.

Mas é claro que não foi só isso – aliás, a inexperiência em Copas poderia ter sido superada.

A juventude e a inexperiência dos jogadores, porém, foram fatores que se exacerbaram devido a outros fatores, ou melhor, devido à literal sabotagem que a Seleção sofreu por parte da mídia brasileira e de grupos políticos.

Alguns profetas dos fatos ocorridos agora se gabam de terem “acertado” ao criticarem a Seleção e, como “prova” disso, esfregam a derrota fragorosa nos rostos de quem não quis se juntar à uma verdadeira matilha de lobos que tratava de desmotivar aqueles jovens.

Seria normal haver críticas contra a Seleção, mas o espalhafato dos protestos violentos, a apatia da torcida, a frieza inicial da população com a Copa, tudo isso pressionou emocionalmente uma equipe imatura.

Imagine, leitor, quantas foram as noites em que aqueles garotos sonharam… Ou melhor, imagine quantos pesadelos eles tiveram com o desastre que se materializou. Sabiam muito bem que teriam que conquistar o povo brasileiro, ineditamente indisposto com o esporte que ama.

Mesmo vendo os problemas – sobretudo o da inexperiência e o do emocional da Seleção –, quem não queria o desfecho que sobreveio tinha OBRIGAÇÃO de combater o derrotismo e a pressão psicológica disparados sem piedade contra aqueles garotos assustados.

Ao longo da competição, a equipe mais criticada pela mídia foi, de longe, a nossa. Chega a ser ridículo que alguém se jacte de ter “avisado”. Ora, quem não “avisou”? A mídia em peso “avisou”. O tempo todo. Sem parar. Dia e noite.

As arbitragens questionáveis e o desfalque de dois jogadores importantíssimos acabaram com o pouco de equilíbrio emocional que havia.

É óbvio que uma equipe com jogadores tão valorizados no mercado mundial de futebol não deveria ter sofrido aquela derrota, naquele nível de contundência. O que aconteceu nada tem que ver com o futebol brasileiro, que um ano antes brilhara na Copa das Confederações.

Aliás, a mídia previa sucesso dentro de campo e vexame fora, por conta da organização do evento. Ocorreu o contrário.

Após o primeiro jogo da Seleção na Copa deste ano, reclamaram providências da Comissão Técnica para contornar o problema emocional que já naquele jogo foi visto, com o gol contra de Marcelo. Ok, mas não disseram como fazer isso.

Alguém saberia dizer como se faz para acalmar garotos que nunca disputaram uma competição como essa e que passaram os últimos 12 meses vendo o clima de guerra no país contra a Copa, sem falar na avalanche de desqualificações?

Se alguém tem alguma culpa, é Felipão. Infelizmente, essa é a verdade.

Escalar uma equipe cem por cento inexperiente – o goleiro Júlio Cezar não atenua esse déficit –, foi uma temeridade. Ainda mais sabendo de quantos interesses políticos havia em que o fracasso sucedesse dentro e fora de campo.

E, por fim, como a burrice entrou em campo de forma tão acintosa, logo aparece aquele argumento estúpido sobre quanto ganham os jogadores – como se só craques brasileiros fossem bem pagos, como se no mundo inteiro os craques não ganhassem fortunas.

Ora, nossos jogadores bem pagos não roubam ninguém. Ganham muito porque dão muito lucro. Simples assim. E merecem ganhar, pois a disputa para chegar aonde chegaram é imensa, incomensurável.

Tudo isso me leva a uma única conclusão: não conseguiram sabotar a organização da Copa, mas conseguiram sabotar a Seleção. Quem sabotou? Os partidos políticos e os grupos de mídia que contavam com essa derrota em campo para lograrem uma vitória nas urnas.

Será que se darão bem?