Moro sugere que esposa e amigo eram office-boys de doleiro

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Tem uma peça publicitária circulando por aí que afirma que, no Brasil, “A lei é para todos”. Propaganda enganosa. O principal beneficiário dessa “marquetagem” vem se esforçando para mostrar que, no Brasil, a lei está longe de ser para todos. Muito menos para juízes que gostam de aparecer, como mostra o vídeo abaixo.

Essa aura de santidade do juiz Sergio Moro, porém, vem sendo posta à prova depois que reportagem publicada na Folha de São Paulo trouxe à tona que a esposa dele se envolveu em sociedade com amigo do marido em um escritório de advocacia e esse escritório mantinha negócios com o escritório também de advocacia – e, nas horas vagas, de lavagem de dinheiro – pilotado pelo advogado foragido da Justiça brasileira Rodrigo Tacla Durán.

No dia 27 de agosto último, a jornalista Monica Bergamo publicou em sua coluna na Folha de São Paulo que:

“O advogado Rodrigo Tacla Duran (…) acusa o advogado (…) Carlos Zucolotto Junior, amigo e padrinho de casamento do juiz Sergio Moro, de intermediar negociações (…) com a força-tarefa da (…) Lava Jato. A mulher de Moro, Rosangela, já foi sócia (…) de Zucolotto (…) As conversas de Zucolotto com Tacla Duran envolveriam abrandamento de pena e diminuição da multa que o ex-advogado da Odebrecht deveria pagar em um acordo de delação premiada. Em troca, segundo Duran, Zucolotto seria pago por meio de caixa dois. (…)”

Trocando em miúdos: O doleiro “espanhol” Tacla Durán acusa Sergio Moro de vender abrandamento das penas que impõe aos réus da Lava. Moro usaria o escritório pilotado pelo amigo e pela esposa para esse fim.

É óbvio que é uma acusação muito séria. Não pode ser dada como verdadeira ou falsa, só pode ser profundamente investigada.

Sergio Moro montar um esquema tão escandaloso e perigoso para ganhar alguns milhões é tão inverossímil quanto Lula fortalecer os órgãos de combate à corrupção no poder público e depois montar um esquema de roubalheira institucionalizada.

Essa, porém, não é a questão. Não podemos julgar Sergio Moro – condená-lo ou absolvê-lo. É uma acusação que vai precisar de provas. Acusar autoridades importantíssimas de crimes tão graves não pode ser feito sem todas as provas possíveis e imagináveis. Mas tampouco é aceitável que essas autoridades ajam como se investigar qualquer denúncia contra si, mesmo sendo fraca, fosse ilegal ou descabido.

A denúncia do doleiro foragido contra Moro é fraca. Tão fraca quanto a denúncia de delatores da Lava Jato contra Lula. Por quê? Simplesmente porque tanto o delator de Moro quanto os delatores de Lula não apresentaram provas.

Todos assistiram o depoimento de Lula a Moro em Curitiba no dia 10 de maio deste ano. Todos viram as afirmações de gente da Lava Jato e até do próprio Moro dizendo que o ex-presidente teria “caído em contradição”, o que, na verdade, foram suposições dos procuradores e do juiz.

Eis que o mundo gira e Moro acaba tendo que se explicar para não ser acusado de montar um esquema de corrupção para extorquir os réus que julga. E dá explicações, no mínimo, contraditórias…

No texto publicado na internet, diz Bergamo, Tacla Durán afirma que, entre março e abril de 2016, tratou das investigações da Lava Jato com Zucolotto. O escritório do advogado atuava havia dois anos como correspondente da banca Tacla Duran Advogados Associados, no acompanhamento de audiências trabalhistas e execuções fiscais.

“Carlos Zucolotto então iniciou uma negociação paralela entrando por um caminho que jamais imaginei que seguiria e que não apenas colocou o juiz Sergio Moro na incômoda situação de ficar impedido de julgar e deliberar sobre o meu caso, como também expôs os procuradores da força-tarefa de Curitiba”, escreveu Duran.

Ele disse que estava nos EUA e que, por isso, a correspondência entre os dois ocorria através do aplicativo de mensagens Wickr, que criptografa e pode ser programado para destruir conversas.

“Ao se prontificar a me ajudar”, segue, “Zucolotto explicou que a condição era não aparecer na linha de frente. Revelou ter bons contatos na força-tarefa e poderia trabalhar nos bastidores”.

Antes que Zucolotto entrasse no circuito, segundo ainda o texto de Duran, o procurador Roberson Pozzobon teria proposto que ele pagasse uma multa de US$ 15 milhões à Justiça. Duran diz que não aceitava a proposta.

“Depois de fazer suas sondagens, Zucolotto conversou comigo pelo Wickr”, afirma o ex-advogado da Odebrecht.

Na suposta correspondência, Zucolotto afirma ter “como melhorar” a proposta de Pozzobon. Diz também que seu “contato” conseguiria “que DD [Deltan Dallagnol]” entrasse na negociação.

Ainda segundo Duran, a ideia de Zucolotto era alterar o regime de prisão de fechado para domiciliar e diminuir a multa para um terço do valor, ou seja, US$ 5 milhões.

“E você paga mais um terço de honorários para poder resolver isso, me entende?”, teria escrito Zucolotto, segundo a suposta transcrição da correspondência entre eles. “Mas por fora porque tenho de resolver o pessoal que vai ajudar nisso.”

Duran diz então que, “de fato, os procuradores Julio Noronha e Roberson Pozzobon enviaram por e-mail uma minuta de acordo de colaboração com as condições alteradas conforme o que Zucolotto havia indicado em suas mensagens”.

Ele teria recebido a proposta no dia 27 de maio de 2016, uma sexta-feira. Teria que voltar ao Brasil três dias depois, para assinar o acordo.

“Sozinho na minha casa na Flórida, pensei muito sobre isso e decidi que não assinaria nem voltaria ao Brasil”, afirma Duran. Ele diz ter enviado um advogado para representá-lo na reunião.

“Ao serem informados da minha recusa em admitir crimes que não cometera, os procuradores de Curitiba não quiseram mais conversa e encerraram as negociações”, diz. “Foi nosso último contato”, afirma Duran na última linha de seu texto.

O juiz Sergio Moro, então, saiu em defesa do advogado Carlos Zucolotto Junior – e de si mesmo – e disse, por meio de nota, ser “lamentável que a palavra de um acusado foragido da Justiça brasileira fosse utilizada para levantar suspeitas “infundadas” sobre “a atuação da Justiça”.

“A alegação de Rodrigo Tacla Duran de que o sr. Carlos Zucolotto teria prestado alguma espécie de serviço junto à força-tarefa da Lava Jato ou qualquer serviço relacionado à advocacia criminal é falsa”, disse o magistrado.

Moro admite que os dois são amigos –Zucolotto foi padrinho de casamento dele e os dois vão juntos a programas como um show do Skank, em Curitiba.

“O sr. Carlos Zucolotto é pessoa conhecida do juiz titular da 13ª Vara Federal [o próprio Moro] e é um profissional sério e competente”, afirma o magistrado, referindo-se a sim mesmo na terceira pessoa (?!).

“O sr. Carlos Zucolotto atua na área trabalhista e jamais advogou em matéria criminal”, disse ainda o juiz.

Segundo a reportagem de Monica Bergamo, “o próprio Moro, ao receber os questionamentos da Folha, entrou em contato com o advogado e enviou as explicações dele ao jornal”.

É nesse ponto, então que a explicação de Moro se torna verdadeiramente absurda, inverossímil, esquisita… Quase tão esquisita quanto o fato de esse magistrado parecer achar que ser seu “amigo” isenta qualquer um de qualquer suspeita…

A pergunta óbvia a se fazer nesse caso é: que relação, diabos, o amigo e padrinho de Moro e a esposa de Moro mantinham com um escritório de advocacia fajuto e que a própria Lava Jato afirma que se dedicava a “lavagem de dinheiro de propinas”?!

A explicação de Moro é estarrecedora. Sua esposa e seu amigo são advogados importantes, ligados àquele que talvez seja hoje o juiz mais importante do país, que edita sentenças que a sociedade acompanha de mãos postas e olhos arregalados. Eis o tipo de serviço para o qual o escritório de lavagem de dinheiro do foragido Tacla Durán os contratou, segundo Moro:

“A partir das perguntas efetuadas, o sr. Carlos Zucolotto, consultado, informou que foi contratado para extração de cópias de processo de execução fiscal por pessoa talvez ligada a Rodrigo Tacla Duran em razão do sobrenome (Flávia Tacla Duran) e por valores módicos”, diz Moro.

Flávia, para quem não sabe, é irmã de Rodrigo Tacla Duran.

Moro afirmou ainda que sua mulher, Rosangela, participou “de uma sociedade de advogados” com Zucolotto, mas “sem comunhão de trabalho ou de honorários”, mas a coluna radar, da Veja, mostrou que a história é bem diferente.

Segunda a Veja, porém, há dois anos, pelo menos, que a força tarefa da Lava-Jato em Curitiba sabe que o escritório de advocacia Zucoloto – do qual Rosângela Moro, esposa do juiz, foi sócia – era correspondente na cidade paranaense do escritório de Duran. Essa informação consta na resposta enviada pela Receita Federal ocultada dos autos pelo Ministério Público.

Ora, se a Receita Federal está no meio é óbvio que houve movimentação de  valores envolvendo Rosangela, Zucolotto e Tacla Durán. A RF cuida de impostos, ou seja, de dinheiro devido ao fisco por conta de transações comerciais.

Não demorou para surgirem detalhes desse fato, na matéria de Luis Nassif que confirma essa suposição obrigatória a partir da informação de que os dados sobre a relação entre Durán e as pessoas ligadas a Moro constam em documentos da Receita Federal.

O que sobressai nesse caso é a explicação de Zucolotto para o tipo de serviço que seu escritório e da mulher de Moro prestava ao doleiro que lavava mais branco: EXTRAÇÃO DE CÓPIAS DE PROCESSOS DE EXECUÇÃO FISCAL!!

Trocando em miúdos: o escritório de advocacia de Rosângela Wolff Moro e Carlos Zucolotto Júnior foi contratado pelo escritório de Rodrigo Tacla Durán, foragido da Justiça brasileira, para ir até o Fórum e tirar xerox de processos de execução fiscal. Provavelmente, mandavam algum estagiário tirar essas cópias…

Quanto o primeiro amigo e a única mulher de Moro recebiam por isso? Não achavam estranho ganhar dinheiro tão fácil? Não tinham maior interesse nas atividades de um escritório fake de advocacia que se dedicava a lavar dinheiro da corrupção? São mesmo ingênuos assim? Nunca teria havido uma conversa de alcova sobre essa empresa esquisitíssima?

Não é fácil acreditar nessa história. Se não está sendo investigada, é óbvio que fica provado que a lei, no Brasil, está longe de ser “para todos” e não é um filme igualmente esquisito (patrocinado por gente que teme divulgar seu nome) que irá fazer algum brasileiro decente e dotado de neurônios acreditar nessa balela.