Não se trata de planos, mas de estratégia. E a estratégia foi traçada por Lula.

Análise, Todos os posts, Últimas notícias
Foto: Edilson Dantas

 

Por Francisco Celso Calmon

Não se trata de planos, mas de estratégia. E a estratégia foi traçada por Lula. É preciso tirar os antojos das análises e dos interesses umbilicais para enxergá-la em sua inteireza e sutilezas.

“Lula está tranquilo, consciente de ser vítima de uma armadilha política e diz que vai se manter firme e quer provar que mesmo prisioneiro ele conta com o apoio, a força e toda energia positiva de todo povo consciente que tem desejo e gana de ver esse país livre do imperialismo. E ele é mas candidato do que sempre. ‘Se eu desistir eu reconheço minha culpa, e como eu sou inocente, eu tenho que provar minha inocência mantendo minha candidatura e fortalecendo minha candidatura, e eles que sejam capazes de dizer não. Eu só vou desfalecer quando conseguir construir um mundo de direito para todos os cidadãos e todas as pessoas humanas'”. (monge beneditino Marcelo Barros ao sair da visita a Lula na Polícia Federal de Curitiba na segunda, dia 14/05).

Antes de adentrar no debate sobre a necessidade de pensar em plano B ou não, é preciso afirmar que os planos são as expressões táticas da estratégia que adotamos.

Não cabe, em uma conjuntura acirrada e vacilante como a que vivemos desde o golpe de 2016, tratarmos o debate tático de forma rasa, é preciso estar vigilante e mirar na estratégia que orienta nossa ação imediata. Se a conjuntura oscila e nos impõe reavaliar a tática cotidianamente, que o façamos com a firmeza de não desviar do objetivo.

Houve o trabalhismo encarnado pelo Getúlio, Jango e Brizola. Há o lulismo fazendo história e com o seu protagonista-mor ainda vivo, felizmente, portanto, um lulismo inacabado, em devir, cuja meta é:  construir um mundo de direito para todos os cidadãos e todas as pessoas humanas.

Em seu discurso histórico no sindicato de São Bernardo, no dia 07/04/2018, Lula dispara para a multidão presente e para todos os que acompanharam no Brasil e no mundo:

Não adianta eles acharem que vão fazer com que eu pare, eu não pararei porque eu não sou um ser humano, sou uma ideia, uma ideia misturada com a ideia de vocês.

Nesse momento ele se dispõe a ser o que a história exige, ainda que muito lhe custe. Se propõe a ser o expoente das ideias que resistem. E não somente das ideias que se alinham às suas próprias, percebam: naquela multidão estavam sindicalistas da CUT, da CTB, movimentos sociais, como o MST, MTST, estudantes representados pela UNE, a militância partidária, religiosos, parlamentares, e, ao seu lado,candidaturas do PCdoB e do PSOL à presidência da república, ele aceitou se misturar a todas essas ideias.

 A própria ação da direita fez a síntese da esquerda em Lula, quando o perseguiram e condenaram sem prova.

Não é que ele não seja, de fato, humano, entretanto, não atacam o ser humano Lula, e sim o que ele representa no horizonte estratégico e para a história – é o que mais teme a burguesia internacional e o poder hegemônico no país.

Assumindo ser uma ideia misturada com as ideias dos protagonistas do povo, ele aponta para um projeto de nação em construção, mas indica que a fonte é a sua história e o vir a ser da mistura das ideias.

O golpismo é complexo, mas seguro de seus objetivos, ou não seria capaz de manter um governo com denúncias de corrupção, que se utiliza de medidas de exceção e que tem enorme rejeição entre a população brasileira.

Os que apostam em planos B ou C se equivocam na leitura das forças do golpe e de suas movimentações. Há, sim, a possibilidade de orientados por uma mesma estratégia adotar planos diversos, como as candidaturas de Manuela, pelo PCdoB, ou Boulos, pelo PSOL, pois elas não seguem uma estratégia enviesada, apenas adotam táticas específicas de seus partidos. Eles não propõem que Lula não se candidate, mas utilizam a via eleitoral como trincheira de luta e com interesses legítimos de fortalecer seus partidos e propostas.

Diferente disso, aparece a defesa do apoio à candidatura de Ciro Gomes. Ciro não é alternativa da esquerda. Pode vir a ser da direita. E contará com o apoio de parte da esquerda, já que a sua competência professoral permite que seu discurso atinja a academia e a intelectualidade. Ao dizer que Lula é a causa do ódio na sociedade e que deve retirar sua candidatura, está se alinhando ao discurso do golpe, enunciado pela Globo, e também aos golpistas que bradaram o mesmo sobre a Dilma.

Aceitar isso equivale a convalidar o golpe, é regular a mira para que acertem o alvo pretendido.

Lula é esperança de paz contra o ódio provocado e incitado pela Globo, destarte, não se trata simplesmente de ter simpatia e apoiar Ciro, mas no que isso implica:  o PT transferir seu capital eleitoral (em torno de 22%) – ou Lula, com quase 50% de preferência eleitoral , para um candidato que não tem identificação ou comunicação com o povo, daí patinar nos 7% da preferência dos eleitores, por quais razões?

Por mais competente tecnicamente que o Ciro seja, não é suficiente para a esquerda adotá-lo como o seu principal candidato.

Lula ou nada é uma proposta precoce no momento, pois para ser crível, requer convergência das principais forças de esquerda.

Lula é um preso político. Essa é a contradição central do inimigo. Deixar de expô-la, abrir mão dela, é um erro que será cobrado no futuro. Ele aponta essa contradição em seu discurso ao afirmar que cumpriria o mandado de prisão para “fazer a transferência de responsabilidade“. Isso quer dizer que ele se entregou para externar o julgamento político do TRF4, para desnudar o Judiciário, e, outrossim, para que essa conta seja cobrada a quem tem, em última instância, a responsabilidade da dívida, desde o golpe de 2016, com a nação.

“Se eu não acreditasse na Justiça, eu não tinha feito partido político. Eu tinha proposto uma revolução nesse país.”(*)

O campo do golpismo almeja consolidar, institucionalmente, o golpe, e tem nas eleições essa oportunidade. Contudo, não existe candidatura de direita que sequer dispute com Lula. Para alcançar seus objetivos, as forças do golpe o perseguem e tentam desmoralizá-lo, e na sequencia o seu partido, o PT, e suas aguerridas lideranças. Não é nosso o papel tirá-lo do cenário eleitoral. As instituições corrompidas que se comprometam ainda mais com a sociedade e a história ao fazê-lo.

A consolidação do golpe nas urnas, além de rasgar completamente o pacto democrático, firmado quando da promulgação da Constituição Federal de 1988, é a abertura de um abismo entre a esquerda e a disputa do poder de Estado, o que sentencia o povo trabalhador a um longo período de decadência econômica e social.

Lula não é a bala de prata, mas é o alvo principal do inimigo. É o alvo porque o inimigo o teme como candidato e receia que o lulismo ganhe um corpo invisível e irreversível, contudo,  ainda se dispõe a realizar as eleições. Se não dispusesse de meios para impedir Lula de ganhar o pleito, acabariam com a eleição ou implantariam o parlamentarismo (é o plano B dos canalhas, o tal do semipresidencialismo).

Nos cabe avaliar seriamente se abrir mão da figura de Lula agora aglutina ou desarticula. Além do aspecto ideológico: abandonar companheiro na estrada, já é ausência de solidariedade, imagine deixar na prisão. No caso concreto seria falta de solidariedade, de gratidão e de reconhecimento do seu valor atual como estrategista democrático.

Jogarmos o xadrez sem a peça principal, a mais poderosa, a dama, é aceitar a tabuleiro imposto pelos golpistas, é homologar o jogo viciado, é ser cúmplice na trapaça da roleta de candidaturas.

O Estado, através do governo dos canalhas, submergiu a soberania e se tornou vassalo do imperialismo.

Os que temem o potencial organizativo da esquerda e por isso atacam Lula, sabem que seu problema não é Lula, o que eles temem é que as intenções de voto se convertam em povo nas ruas com mais consciência.

“O problema deste país não se chama Lula, o problema deste país chama-se vocês, a consciência do povo, o Partido dos Trabalhadores, o PCdoB, o MST, o MTST, eles sabem que têm muita gente.”(*)

Há três lutas a serem travadas: ideológica, institucional e de massas. Não há uma sequer que seja descartável e não imporemos derrota ao golpismo se não operarmos concomitantemente as três.

Em Crítica da Filosofia do Direito de Hegel de 1843, Marx afirma que “a arma da crítica não pode substituir a crítica da arma, o poder material tem de ser derrubado pelo poder material, mas a teoria se torna força material quando se apodera das massas”.

Na experiência com o povo, a militância promove a formação, a organização e a disputa das ideologias na consciência da classe trabalhadora. Em 27 de maio de 2018 Lula assertivou: Não é dinheiro que resolve o problema de uma greve, não é 5%, não é 10%, é o que está embutido de teoria política, de conhecimento político e de tese política numa greve.

Sofremos uma derrota estratégica com o golpe que nos exige uma postura de defesa e não nos cabe optar por fazê-la de forma cabisbaixa ou derrotista, mas impera que adotemos uma resistência ativa e que busquemos horizontes de ruptura.

Numa guerra, seja ela de qualquer tipo, o apoio logístico é vital para as frentes de batalha. A história é farta em mostrar derrotas causadas pela falta desse apoio para algum dos exércitos. Na guerra que travamos hoje, quem fornece apoio à tirania togada e ao governo dos canalhas é a mídia, sobretudo a Rede Globo. Mirá-la como alvo principal é uma tarefa urgente e fundamental.

O nosso alvo tem três círculos: no maior está o STF e devemos explorar as suas contradições, no circulo imediatamente menor está o  agente do imperialismo, Moro, e no centro do círculo do nosso alvo está a Globo.

A luta ficará no limite que o inimigo delimitar ou seguirá uma estratégia de longo prazo?

É o momento de encarnar a força revolucionária, de se armar daquilo que temem os poderosos: a certeza de que somos muitos e de que estaremos juntos.

É tempo de fazer nascer vários Lulas, enquanto durar a prisão arbitrária e injusta, e  como ele próprio disse: Eles têm de saber que a morte de um combatente não para a revolução”

Portanto,  Lula não é  a bala de prata, é o alvo central do inimigo, por ser a ideia. A ideia de resistir,  a ideia de esperançar, a ideia do país sem fome,  a ideia de não tirar os sapatos diante dos EUA, a ideia de um mundo multipolar – BRICS, Mercosul, outros Bancos mundiais, outras moedas transnacionais no comércio internacional…

A estratégia contra a tirania togada ou ditadura do judiciário ou Estado policial, ou golpismo,  o nome importa menos, mas o conceito vai nos levar a táticas diferentes. Como resistir vai ser decorrência da identificação do tipo de inimigo que definirmos.

O teatro de operações imediato tem nas eleições seu eixo principal. Mas qual deve ser o eixo  principal da resistência? O lugar que nos pertence não é a ocupação do chão: do campo,  das ruas, das fábricas, das escolas, das instituições, usando o método de guerrilhas democráticas?

Eu vou cumprir o mandado [de prisão] e vocês vão ter de se transformar […], vão virar Lula e vão andar por este país fazendo o que vocês têm que fazer e é todo dia! Todo dia!(*)

Lula está no cárcere da tirania togada, mas a militância ainda não está andando por este país todos os dias pregando a resistência; por ora, estamos engatinhando. Temos que contribuir no que pudermos para que as caravanas continuem. Caravanas menores, provavelmente, mas serão tão eficientes se, além de levar a esperança, fomentar a  organização popular em comitês pela democracia.

“‘Os poderosos podem matar uma, duas ou três rosas, mas jamais poderão deter a chegada da primavera’. E a nossa luta é em busca da primavera.”(*)

E o que é a primavera para nós senão a transformação das estruturas opressoras e exploradoras do sistema, em estruturas novas nas quais todos tenham condições e oportunidades iguais para usufruir do que produzem e constroem.

“Companheiros, eu vou dizer uma coisa pra vocês: Vocês vão perceber que eu vou sair desta maior, mais forte, mais verdadeiro, e inocente, porque eu quero provar que eles é que cometeram um crime, um crime político de perseguir um homem que tem 50 anos de história política, e por isso eu sou muito grato.”(*)

Explicitar o caráter fraudulento, embusteiro e tirânico do Judiciário para que os magistrados honestos e a sociedade em geral tomem consciência e levem ao constrangimento e pressão ao simulacro de justiça.

A fim de que a previsão do Lula se realize, é essencial seguir a única estratégia capaz de enfrentar globalmente a tirania togada.

O governo dos canalhas na política está enterrado e na economia é um fracasso. Acontece que o golpe foi firmado “com o Supremo, com tudo…” e articulado de fora.

Na ditadura militar, a economia foi a razão maior para os ditadores terem entregue o poder, na atual conjuntura pode ser o caldeirão que ferva as togas assassinas do judiciário e o governo de canalhas.

 

Dia 27 de maio é o pré lançamento da candidatura do Lula, e a orientação dele é a de criar comitês por sua candidatura em todos os cantos do país, não importa se com 3, 13, ou com muitos mais.

—————————————————————–

* Discurso do Lula no sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo no dia 07/04/2018.

 

Autoria Xico Celso Calmon com a colaboração de Allana Soares.
Allana Soares é psicóloga e da coordenação do Levante Popular da Juventude.