Um segundo turno que decidirá o futuro da democracia brasileira

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O Nordeste garantiu o segundo turno, mas as outras regiões, levando Jair Bolsonaro a tão perto da vitória no primeiro, fortalecem profecias de um segundo turno sangrento. “É porrada. Se tiver segundo turno, o confronto vai ser direto”, disse o presidente do PSL, Gustavo Bebiano. Será outra eleição, Bolsonaro terá que se expor e dizer o que pensa, ou dissimular o que pensa, mas a verdade tem que ser dita: será muito difícil impedir que ele se eleja.

O candidato do PT, Fernando Haddad, liderando a frente de centro-esquerda que deve começar hoje mesmo a ser construída, terá que conquistar eleitores (46,38%) que votaram em Bolsonaro. Terá que fazê-lo encolher, como Lula fez com Alckmin em 2006, quando o tucano, no segundo turno, perdeu 2,5 milhões de votos. Não será fácil, depois da forte adubação do antipetismo. Por isso agora ele precisa ir além do PT, além da esquerda. Como candidato de Lula, ele foi até onde deu. Lula também já fez por ele o que podia. Agora ele precisa ser o candidato da unidade democrática, como dizíamos no tempo da ditadura.

Bolsonaro estava crescendo, sabíamos, mas nenhuma pesquisa captou a força do furacão de extrema-direita que vinha varrendo os estados do Sul, Sudeste e Centro-Oeste, atropelando os concorrentes à direita, abduzindo seus votos e arrastando os indecisos para produzir uma vitória que não se confirmou por muito pouco.

O furacão sumiu com os votos de Marina Silva, que saiu do pleito atrás do Cabo Daciolo, com menos de 1% dos votos. O voto antipetista que ela tinha foi para Bolsonaro e o voto progressista para Ciro ou Haddad, quando o eleitor sentiu a força do vento.

O PSDB encerra melancolicamente sua trajetória como partido líder da direita liberal. Geraldo Alckmin ficou com menos 5% dos votos e não chegou a 10% em São Paulo, reduto tucano. O voto antipetista que estava com ele migrou para seu novo e verdadeiro dono. Muitos foram os tucanos derrotados nos estados, como Beto Richa (PR) e Marcone Perillo (GO).

O furacão arrasou com oligarquias e forças conservadoras, o que torna Bolsonaro ainda mais imperial. Com a votação que teve, não vai negociar com ninguém. Se virar presidente, depois verá o problema da governabilidade. Adesistas não faltarão num congresso que virá renovado pela direita. Foram derrotados nomes Eunício Oliveira, Edison Lobão, Sarney Filho, Ricardo Ferraço, Roberto Requião, entre tantos.

O PT, sofreu derrotas estaduais importantes, como as de Fernando Pimentel e Dilma Rousseff em Minas, mas garantiu a sobrevivência elegendo bom número de governadores e senadores no fiel Nordeste. Ciro Gomes afirmou-se como alternativa de esquerda ao PT, para o futuro. Boulos tornou-se conhecido e conferiu ao PSOL a relevância não obtida com a candidatura de Luciana Genro em 2014.

Bolsonaro furioso

Para quem esperava liquidar a fatura no primeiro turno, ter que disputar o segundo por menos de quatro pontos porcentuais será motivo de fúria, elemento já tão próprio de Bolsonaro. Ele agora não poderá se esconder como no primeiro turno e a blindagem da facada já terá passado. Terá que enfrentar nos debates um candidato intelectualmente superior e conferir alguma densidade aos dez minutos diários que ele e Haddad ocuparão, isonomicamente, no rádio e na TV.

Aos inconvenientes de uma nova disputa, soma-se a criação de uma nova correlação de forças. Os que votaram em Bolsonaro sabem que é um risco real à democracia e não se incomodaram. Foram declarações dele, muitas delas gravadas, que lhe deram a fama de racista, machista e misógino, de defensor da tortura e da ditadura, mas os que votaram nele não se incomodaram. Mas existe a outra metade do país que rejeita esta marcha regressiva, e terá como alternativa o candidato do PT que, no segundo turno, terá que se transfigurar, liderando uma frente democrática, negociando seu programa, congregando a esquerda, parte do centro, o que inclui adversários do PT que não flertam com o fascismo. A hora exige de todos, grandeza.

Do Jornal do Brasil.