Edital do Mais Médicos não irá suprir déficit de profissionais

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Mesmo que consiga preencher todas as vagas hoje ocupadas por médicos cubanos, possibilidade vista com desconfiança por especialistas, o Mais Médicos ainda deve continuar com um déficit de ao menos 2.091 profissionais até o início do próximo ano.

O valor corresponde ao total de vagas abertas desde o fim de 2017 com a saída de médicos que já encerraram os três anos de contrato para atuação no programa. O problema é que, desde então, essas vagas ainda não foram preenchidas “nem há prazo para isso”.

Na quarta-feira (14), o governo de Cuba anunciou o fim da participação no Mais Médicos. A decisão ocorreu após o presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), questionar a qualificação dos médicos cubanos e devido a sua intenção de modificar o acordo, exigindo revalidação de diplomas no Brasil e contratação individual.

No mesmo dia em que Cuba anunciou sua saída do programa, o Ministério da Saúde informou que lançará um edital emergencial de reposição.

De acordo com o ministro da Saúde, Gilberto Occhi, essa chamada, no entanto, deve valer apenas para as 8.332 vagas abertas com a saída dos médicos cubanos.

Caso não preencha nenhuma das vagas disponíveis com o fim da cooperação com Cuba até o fim deste ano, o déficit total de médicos, somado aos 2.091 que já encerraram seus contratos com o programa, será de 11.423 profissionais.

Ainda não há previsão de reposição em municípios que já estavam sem médicos. “Isso vai ficar para outro edital”, afirmou à Folha nesta quinta.

Segundo ele, a ideia é que uma nova chamada só ocorra após a publicação de uma portaria com novos critérios para distribuição de vagas por município. A mudança é alvo de estudos desde o início deste ano, mas ainda não tem prazo.

“Os critérios já estão bem adiantados, e podem ser anunciados logo. Mas nossa prioridade agora é dar a cobertura para a saída dos médicos cubanos”, afirma.

O atraso na reposição das vagas, porém, preocupa representantes dos municípios.

Para Mauro Junqueira, presidente do Conasems, o lançamento de um novo edital apenas para as vagas dos médicos cubanos “não tem sentido”. “Estamos há mais de seis meses cobrando essa reposição”, afirma ele, que lembra que o último edital do Mais Médicos foi publicado em novembro de 2017.

Até então, o ministério publicava novas chamadas a cada três meses.

Em meio ao impasse, municípios que já tinham falta de médicos temem que a saída dos cubanos gere o risco de completa desassistência.

Em Embu-Guaçu, na Grande SP, de 18 vagas de médicos do Mais Médicos, 16 são cubanos. Desde o início do ano, a cidade, que depende do programa, também tem vagas não repostas. “Como a reposição ainda não aconteceu, e com a saída dos médicos cubanos, minha atenção básica inteira não terá médico”, afirma a secretária municipal de Saúde Maria Dalva dos Santos. “Corremos risco de desassistência e até de mortes.”

Segundo Junqueira, presidente do Conasems, o histórico de editais do Mais Médicos aponta que, ainda que um novo edital seja lançado na próxima segunda-feira (19), a reposição não deve ser tão rápida.

Em geral, a seleção engloba etapas como análise de inscrições, seleção dos profissionais, indicação dos municípios e confirmação do interesse do profissional nas vagas. “Se o ministério tiver muita agilidade, acredito que até meados de fevereiro já tenhamos médico. Antes disso é difícil”, avalia Junqueira.

Em nota, o Ministério da Saúde aponta que está adotando todas as medidas necessárias “para garantir a assistência dos brasileiros atendidos pelas equipes da Saúde da Família que contam com profissionais de Cuba”.

Se não há previsão para reposição completa das vagas abertas por médicos cubanos, a saída desses profissionais já começa a ser delineada.

Inicialmente, a previsão é que comecem a deixar o Brasil já no dia 25 deste mês. A saída deve ocorrer de forma gradual até o dia 25 de dezembro. Em alguns dias, haverá mais de um voo de volta.

Os dados foram informados em reunião nesta quinta da embaixada de Cuba com representantes do Conasems, e membros da Opas (Organização Pan-Americana de Saúde).

No encontro desta quinta, representantes da embaixada comunicaram os municípios que a decisão é “irrevogável”.

Também fizeram um pedido para que prefeitos apoiem a saída —do contrário, além do fim do vínculo com o programa, os médicos ficariam em situação irregular no país.

Para Arthur Chioro, ex-ministro da Saúde no governo de Dilma Rousseff (PT), a saída dos cubanos do programa deve gerar um “caos” na organização do SUS. Segundo ele, além de desassistência, a medida pode gerar reflexo em indicadores.

“Isso terá um impacto em mortalidade infantil, diabetes e outras causas que são sensíveis à atenção básica”, afirma.

Da FSP