Grupo de brasileiros organiza feijoada para dar adeus a médicos cubanos

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Seis dos nove médicos cubanos que trabalham em Dourados foram recebidos com uma festa neste sábado (17). Os profissionais do “Mais Médicos” foram convidados para uma feijoada como forma de agradecimento pelos serviços prestados ao município. A iniciativa partiu do professor e advogado Tiago Botelho, que queria agradecer em nome de todos os brasileiros.

Pelas redes sociais, Tiago saiu em busca dos convidados, e através de uma amiga chegou em um dos médicos, que de início ficou ressabiado. “Essa minha amiga conversou com o amigo dela que conhecia um cubano e disse que eles podiam confiar, aí começamos a conversar e eu perguntei quantos eram e que eu estava convidando eles para uma feijoada”, conta.

O almoço seria na casa do professor, mas os amigos brasileiros começaram a pedir para participar e a feijoada ganhou status de festança, com mais de 40 pessoas. Sem conhecê-los ainda, Tiago recebeu os médicos com um discurso de agradecimento. “E eles se sentiram à vontade também para se apresentar, dizer de onde vinham e há quanto tempo estavam no Brasil”, relata.

Emotivos, tanto os cubanos quanto os brasileiros, os médicos contaram como são formados e o que pensam sobre o programa. “O mais bacana é ouvir a relação deles com a Medicina, que eles são formados para lidar com pobre, com o povo. Eles não têm essa ganância financeira como os médicos do Brasil”, compara.

“É uma relação muito diferente, que a gente não consegue entender. Todos eles estão dispostos a ir para outro país ajudar, eles são cidadãos que podem ir para o mundo todo ajudar pessoas. Eles também disseram que nunca se sentiram menosprezados, pelo contrário, que construíram uma relação de amizade, porque aqui no Brasil não é comum ir à casa dos pacientes, como é em Cuba”, descreve o professor.

Aos 32 anos, o médico que pediu para não ser identificado, conversou por telefone com o Correio do Estado. Depois de viver 1 ano e 5 meses em Dourados, ele está fazendo as malas para voltar a Cuba. “Quis me formar médico desde muito pequeno. Eu olhava as pessoas doentes e tinha este sentimento, de que podia estudar uma carreira com o objetivo de salvar vidas”, narra.

Curar pacientes foi o que levou o rapaz a estudar Medicina em Cuba. “Este é o maior sacrifício e reconhecimento de um médico. Quando chega um paciente que está doente e triste e você faz um tratamento para ele e, depois, ele chega até você e se sente agradecido, diz que vai se lembrar de você”, conta. No caso das gestantes que ele acompanhou durante nove meses, o profissional diz que até já foi homenageado. “Doutor, meu filho vai ter o seu nome. Eu tive essa experiência, e é um agradecimento realmente muito lindo. Isso é o que sente um médico que ama a profissão”, completa.

A vinda dele foi com o objetivo de trabalhar, atender a população e estar em locais que precisavam de médicos. “O objetivo do nosso País e de nós, médicos cubanos, é de chegar a essas partes onde precisam. É igual no Brasil e em outras partes do mundo. Cuba tem muitas missões nos países do sul-americanos e sul-africanos. Médico cubano é caracterizado por isso: por ajudar a curar, por dar todo o conhecimento nosso para isso”, explica.

Sobre os salários e parte deles serem direcionados para Cuba, o médico diz que muitos desconhecem a realidade de seu país de origem. “Nós recebemos uma parte do salário e a outra é destinada para a população de Cuba, porque lá nós temos uma educação gratuita, uma saúde gratuita. Você mora lá, tem sua família e você sabe que quando precisar ir a um hospital, vai ter internação, remédio e cirurgia gratuitamente. Eu me formei médico e não tive que pagar nenhum dinheiro pela minha formação”, ressalta.

“Acho errado falar que somos escravos. Nós tínhamos um contrato que sempre nos foi explicado e não somos escravos, estamos de acordo, porque nós estamos ajudando também ao nosso povo. Muitas pessoas em Cuba precisam de atendimento médico, diabéticos, hipertensos que têm suas dietas e que o governo dá gratuitamente”. “Todos nós médicos saímos de Cuba para ajudar nosso povo, para seguir melhorando dia a dia. Ninguém conhece mais de Cuba do que nós. Eu convido essas pessoas que acham que nosso País é assim para ir visitar”, reforça.

Em pouco mais de 1 ano, tempo em que esteve em Dourados trabalhando, o médico diz que aprendeu muito sobre trabalhar em equipe, com enfermeiros, agentes de saúde, odontólogos e auxiliar de enfermagem. “Isso eu aprendi aqui, a fazer um trabalho em equipe, e que não é uma só pessoa que faz a conduta e, sim, uma equipe num trabalho organizado com o objetivo de trabalhar bem”.

Se, de um lado, nos últimos dias o noticiário foi tomado de declarações infelizes por parte do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL), por outro, o que o médico viveu na prática em todos esses meses se resume a elogios. “O Brasil é um país muito agradecido. Os pacientes agradecem muito e quando falamos que somos médicos cubanos, eles nos dizem que somos muito bons, que nos querem. A população nos ama”, compartilha.

Onde vão um, vão todos – Este foi o lema adotado pelos médicos cubanos em Dourados, e quando a notícia da feijoada chegou, só foram por confiar no colega que tinha recebido o convite. “Ele falou: ‘vamos lá? Eu confio, sei que não querem fazer mal para nós’. A gente tem medo e fica sentido por não conhecer as pessoas”, explica.

Entre músicas brasileiras e cubanas, além de muitas fotos, nosso personagem se sentiu grato. “Foi muito legal, estamos agradecidos pelo convite, sempre foram respeitosos conosco”. O médico volta em dezembro para casa, com o sentimento de dever cumprido. “Nossa consciência está tranquila, porque sabemos que somos médicos e estamos trabalhando por uma população. Nós vamos embora, mas com dignidade de que fiz aqui no Brasil um bom trabalho, ajudando muitas pessoas e isso era o mais importante”.

Do Correio do Estado.