Polícia de SP obedece Doria e já pratica execuções de suspeitos

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Relatório da Ouvidoria da Polícia de São Paulo concluído nesta semana afirma haver “fortes indícios” de que os quatro adolescentes mortos em uma ação da Força Tática da PM no mês passado, em uma favela da zona oeste da capital, foram atacados a tiros sem esboçarem reação à abordagem policial.

A conclusão tem como base depoimento de testemunhas, vídeos gravados na noite das mortes e os laudos periciais produzidos pela Polícia Científica de São Paulo. São perícias feitas no local do ataque, nos corpos das vítimas e nas armas dos PMs e naquelas apreendidas como sendo dos jovens.

Os laudos convergem para o possível assassinato dos jovens, de 15 a 17 anos, com uma série de disparos nas costas e nos braços das vítimas, inclusive quando estariam com as mãos para cima.

“Há indícios muito fortes de que, nessa ocorrência, não houve confronto armado, ou seja, as vítimas foram mortas sem mostrar resistência”, diz o ouvidor das polícias Benedito Mariano. “Há indício forte de que a versão dos policiais não condiz com a realidade dos fatos.”

Procurado pela Folha, o Corregedor Geral da Polícia Militar de São Paulo, coronel Marcelino Fernandes, disse ter recebido o relatório da Ouvidoria e que concorda haver “provas indiciárias” contra os policiais. “Não houve a obediência aos padrões de abordagem”, disse o oficial.

Além da corregedoria, o documento também foi enviado ao DHPP (departamento de homicídios, da Polícia Civil), que será responsável pelo possível indiciamento dos policiais. O relatório da Ouvidoria é, na prática, uma manifestação pública do órgão de que houve uma possível ação ilegal dos PMs.

A morte dos quatro ocorreu ao final de uma perseguição que terminou dentro de uma favela conhecida como Areião, no Jaguaré, logo após a PM ter identificado como roubado o carro em que os quatro adolescentes ocupavam, um Ford Focus preto.

Na versão dos policiais, os suspeitos no veículo atiraram contra o carro policial na perseguição e, durante a abordagem, também dispararam na direção dos PMs e, dessa forma, foi necessário o revide.

Três armas foram apresentadas pelos PMs como sendo dos jovens, uma pistola e dois revólveres. Os laudos feitos nessas armas indicam que apenas uma delas chegou a realizar um disparo, um revólver calibre .32. Também indicam que um revólver .38 apreendido na ação estava com o tambor quebrado e, assim, em tese, sem condições de realizar disparos.

Os responsáveis pela investigação podem realizar uma reprodução simulada dos fatos, para tentar afastar ou confirmar as versões contraditórias dos policiais.

Desde o início, a história contada pelos policiais sofreu forte resistência dos moradores da favela que presenciaram a ação e, também, na própria cúpula da PM, que considerou a versão “quadrada” demais. No jargão policial, seria o oposto das ações legítimas, chamadas de “redondas”.

A Folha apurou que o próprio comandante-geral da PM, Marcelo Vieira Salles, pediu atenção especial na apuração por não concordar com ações com mortes desnecessárias.

Moradores e familiares das vítimas ouvidos pela reportagem dizem que os quatro foram mortos já rendidos. “As pessoas ouviram eles dizendo: ‘Perdemos, senhor. Perdemos’”, diz Flávia (nome fictício), mãe de um dos adolescentes mortos pela PM.

Um das principais testemunhas a contestar a versão de confronto é uma adolescente de 15 anos que estava no veículo com os adolescentes. Ela afirmou à polícia não ter visto nenhum deles armado.

A adolescente prestou depoimento à Polícia Civil e afirmou ter sido ameaça pelos PMs casos contasse que as mortes dos quatro ocorreram quando eles já estavam rendido.

O suposto confronto que levou à morte dos quatro ocorreu por volta das 19h40.

Eles estavam em veículo roubado por eles de um motorista de aplicativo na Vila Leopoldina, também na zona oeste, quatro horas antes das mortes. O dono do carro disse à polícia que três adolescentes entraram no carro, um no branco da frente e dois no banco de traseiro. A vítima disse que um dos que estavam atrás “simulou” estar armado.

A favela do Areião tem apenas quatro ruas e 540 casas de alvenaria, segundo controle da associação dos moradores que funciona como uma unidade dos correios local.

Os moradores dizem ainda que a comunidade é pacífica, sem controle do crime organizado, e que nunca houve no local ação violenta da PM e outros confrontos com criminosos. “Nunca tivemos problemas com a polícia. Agora, não posso ver ninguém de farda que quero xingar”, disse Maria (também fictício), tia de uma das vítimas.

Os familiares contam que os quatro adolescentes cresceram juntos e, até o começo deste ano, tiveram uma vida sem problemas com Justiça. Desde janeiro, porém, três deles foram flagrados portando ou vendendo drogas. Um deles também era suspeito de participação no roubo de um carro, nas mesma circunstâncias do caso de sábado.

Dizem ainda que os adolescentes não eram violentos e que possivelmente roubaram o carro para exibi-lo para a adolescente. “Não estou dizendo que eram santos, mas a polícia não está aí para servir e proteger?” disse Flávia.

Da FSP