Voto de Gilmar Mendes contra a Escola sem Partido foi inesperado

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Os militantes contra a “doutrinação política” nas escolas, reunidos sob a bandeira do projeto Escola Sem Partido, encontraram, inesperadamente, um opositor inflamado no Supremo Tribunal Federal: o ministro Gilmar Mendes.

Inesperado porque, nesta quarta-feira, os ministros discutiam (e referendavam por unanimidade) a decisão liminar de Cármen Lúcia que considerou ilegais, no último sábado, decisões de juízes eleitorais pelo país que enviaram a polícia a várias universidades a pretexto de combater propaganda política.

Terceiro a votar, depois de Cármen Lúcia e Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes surpreendeu ao incluir, em seu voto, severas críticas à deputada bolsonarista recém-eleita Ana Caroline Campagnolo (PSL-SC), que incitou estudantes a gravar os professores e enviar o conteúdo para uma página de denúncia.

Para Gilmar, a deputada eleita por Santa Catarina promoveu a “incitação à violação à liberdade de cátedra”, ferindo os direitos fundamentais assegurados pela Constituição.

No voto, Gilmar atacou alguns postulados do projeto Escola Sem Partido, mesmo sem citá-lo nominalmente: “As universidades são um profícuo ambiente da reflexão crítica e de circulação de ideias, inclusive políticas, sendo propícias ao surgimento de lideranças políticas dos movimentos estudantis. Algo que já foi bem mais presente no Brasil e merece ser reavivado.”

Mendes citou uma decisão do tribunal constitucional alemão que considerou que direitos fundamentais – como a liberdade de expressão e pensamento – podem ser postos em risco não apenas por decisões judiciais e ações autoritárias de agentes estatais, mas também por particulares – caso, segundo ele, da deputada catarinense.

Gilmar disse que cabe ao Estado assegurar os direitos fundamentais ameaçados por terceiros e propôs que os demais ministros usassem a decisão do plenário para incluir um mandato de injunção para tirar do ar a página de denúncia da deputada catarinense.

“É inadmissível que justamente num ambiente em que deveria imperar a livre circulação de ideias se proponha um policiamento político-ideológico da rotina acadêmica”, prosseguiu. “A política encontra na universidade uma atmosfera favorável, que deve ser preservada.”

Segundo ele, distorções devem ser corrigidas não pela censura, mas “pela ampliação dos espaços democráticos de discussão”.

Antes de incluir a deputada catarinense no voto, Gilmar Mendes comparou as decisões de juízes eleitorais que autorizaram operações policiais nas universidades à ditadura nazista (1933-1945).

“Esses episódios ligados à presença da polícia nas universidades trazem memórias extremamente tristes da história mundial. Basta lembrar a grande queima de livros realizadas em diversas cidades da Alemanha, em 10 de maio de 1933, em perseguição a autores que se opunham ou não se alinhavam às diretrizes do regime nazista”, comparou Mendes.

O ministro lembrou que a destruição de obras de Freud, Brecht, Marx, Hemingway e Thomas Mann atendiam a um imperativo da ditadura de Hitler da “purificação da cultura alemã”.

E citou o eminente educador baiano Anísio Teixeira (1900-1971): “Democracia é o regime do saber e da virtude. Saber e virtude não vêm de berço, são aquisições lentas e penosas por processos voluntários e organizados”.

BuzzFeed News tentou falar com a deputada estadual eleita Ana Caroline Campagnolo, mas ela não ligou de volta nem respondeu às mensagens enviadas.

Do BuzzFeed