Editora da Veja faz proposta a credores: calote

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O Grupo Abril, que pertence à família Civita, propôs aos seus credores pagar apenas 8% de sua dívida em até 18 anos. Se a oferta acabar sendo aceita, significará um calote de 92% dos débitos, que chegam a R$ 1,6 bilhão.

O prazo de pagamento previsto pela companhia é dividido em três anos de carência e um parcelamento mensal com 15 anos de duração. O indexador de reajuste sugerido é a TR, a mesma utilizada para a poupança, que atualmente está zerada.

A proposta consta no plano de recuperação judicial do Grupo Abril, ao qual a reportagem teve acesso. Em agosto, a empresa solicitou à Justiça uma trégua no pagamento de seus compromissos.
Fundada em 1950 por Victor Civita, o Grupo Abril —dono da Abril, a maior editora de revistas do país, que publica Veja e Exame— enfrenta grave crise financeira.

No ano passado, o conglomerado registrou prejuízo consolidado de R$ 331,6 milhões. O patrimônio líquido estava negativo em R$ 715 milhões, o que significa que seus ativos não cobriam sua dívida.

Os maiores credores do Grupo Abril são Itaú, Bradesco e Santander. Os bancos adquiriram debêntures (títulos de dívida) da companhia, que chegam a quase R$ 1 bilhão.

Mas também há dívidas com fornecedores de papel, empresas de telefonia, postos de gasolina, editoras concorrentes, centenas de microempresas, ex-funcionários etc.

As dívidas trabalhistas do Grupo Abril, que incluem débitos com jornalistas, gráficos, pessoal administrativo, entre outros profissionais, estão em cerca de R$ 90 milhões, o que significa apenas 5,6% do total. A administração da empresa propôs condições diferenciadas de pagamento de uma parte desse débito.

A empresa diz que vai quitar integralmente as dívidas trabalhistas até o limite de 250 salários mínimos por pessoa —o equivalente a R$ 238,5 mil. O débito seria pago ao longo de 12 meses após a aprovação do plano de recuperação.

Já aqueles funcionários cuja indenização supere esse patamar receberiam o restante nas mesmas condições dos demais credores —ou seja, apenas 8% do total em parcelas mensais durante 18 anos.

“Essa proposta é indecente. Os ex-funcionários com mais tempo de casa serão aqueles que terão o maior prejuízo”, diz Patrícia Zaidan, que integra o comitê de jornalistas demitidos da Abril.

Procurado pela reportagem, o presidente do Grupo Abril, Márcio Haaland, informou que o plano de recuperação foi protocolado no processo há cerca de um mês e está disponível aos credores, mas não quis comentar os detalhes.

Advogados de credores da empresa, ouvidos sob a condição de anonimato, acreditam que apresentar uma proposta tão agressiva de quitação das dívidas foi uma estratégia do Grupo Abril, porque qualquer concessão feita a partir daí é vista como um benefício importante.

O plano de recuperação judicial tem que ser aprovado por uma assembleia de credores, que ainda não tem data marcada para ocorrer, e homologado pela Justiça.

No documento apresentado aos credores, o Grupo Abril atribui suas dificuldades à crise do mercado editorial brasileiro. A administração da empresa diz que a circulação anual de revistas impressas no país caiu de 444 milhões de exemplares em 2014 para 217 milhões em 2017.

Também argumenta que a concorrência por anúncios com as mídias digitais reduziu a fatia dos investimentos em publicidade das grandes empresas nas revistas impressas de 8,4% em 2010 para 3% em 2017.

O plano de recuperação é vago sobre quais medidas serão tomadas pela administração do Grupo Abril para recuperar a companhia e torná-la lucrativa novamente.

O documento admite a possibilidade de entrada de novos sócios e a venda de bens e outros ativos. Menciona explicitamente a intenção de se desfazer das revistas VIP, Boa Forma, Casa Cor, Arquitetura & Construção, Placar, Minha Casa, Mundo Estranho e Viagem & Turismo, além das operações gráficas e das empresas Tex Courier, Dilogpar e Casa Cor.

Pouco antes do pedido de recuperação judicial, a família Civita já havia contratado a consultoria Alvarez & Marçal, especialista em reestruturação das empresas. Haaland, que é sócio da consultoria, assumiu o comando do Grupo Abril em julho de 2018 no lugar de Giancarlo Civita, filho de Roberto Civita, morto em 2013.

Como parte das medidas de saneamento das contas, a empresa já descontinuou vários títulos e demitiu cerca de 900 funcionários.

Da FSP