Analistas criticam postura de Bolsonaro ao bloquear usuários nas redes

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Após o presidente Jair Bolsonaro transferir o controle de suas redes sociais para a Secretaria de Comunicação de seu governo, analistas ouvidos  afirmaram que, por se tratarem, agora, de canais considerados ‘oficiais’, medidas como o bloqueio de usuários críticos não deveriam mais ocorrer.

Para o pesquisador Ivar Hartmann, professor do curso de Direito da FGV-Rio, esse tipo de medida desrespeita o direito de acesso à informação. “A partir do momento em que se trata de um meio de comunicação público e ‘oficial’, não se pode excluir pessoas do debate que se cria ao redor da conta”, avalia.

“A nível de direito constitucional, há a proibição de o Estado discriminar cidadãos em suas comunicações de acordo com suas convicções”. Hartmann destaca, no entanto, que o presidente tem toda a liberdade de manifestar suas visões e seu ponto de vista ideológico.

Em 22 de dezembro, a conta do Twitter do presidente, que tem 2,93 milhões de seguidores e é usada para dar declarações diárias e realizar anúncios sobre medidas do governo, bloqueou o jornalista Leandro Demori, editor do portal The Incercept, de reportagens investigativas. Quando um usuário é bloqueado, ele não tem mais acesso ao material publicado naquela página. No Facebook, Bolsonaro tem outros 9 milhões de seguidores e atualiza a página com conteúdos do governo e anuncia medidas de sua gestão.

Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília, Alexandre Veronese cita como argumentos contrários ao bloqueio de cidadãos o fato de a conta ser gerida por um agente público. “Um presidente ou deputado eleito tem que preservar essa liberdade. Se você é candidato e está uma tendo atuação durante a campanha, é diferente”, pondera, dizendo que esse não é mais o caso.

Veronese cita como exemplo a decisão da Justiça dos Estados Unidos que proibiu o presidente Donald Trump de bloquear cidadãos que faziam críticas em seu Twitter por configurar-se uma afronta à liberdade de expressão, prevista na legislação daquele país. “Há a proteção de que o Estado não limite a liberdade de expressão dos indivíduos. É como se a página fosse um foro público”, compara. “Por questão de paralelismo com os EUA, aqui também não seria razoável bloquear usuários”.

Para o advogado Saulo Stefafone, especialista em direito público, a prática pode configurar violação do direito à informação. “Ele é o presidente de todos os brasileiros, mesmo dos críticos. Não pode impedir que um cidadão brasileiro tenha acesso à informação postada nas suas redes sociais. Como presidente e figura pública, ele altera o limite de sua privacidade”, diz.

Na avaliação do pesquisador Ivar Hartmann, da FGV Rio, uma regulação para esclarecer quais regras pessoas que estão no poder público, como juízes ou ministros, devem seguir para atuar nas redes sociais. “Seria muito bem-vinda uma legislação sobre quais as impossibilidades e proibições de atuação uma pessoa pública tem ao utilizar uma conta de rede social com finalidade de comunicação pública”.

Segundo ele, a partir do momento em que uma conta adquire seguidores, relevância e poder de disseminação, já existe abertura para impossibilitar bloqueio de terceiros em função da opinião pessoal, por exemplo. Segundo Hartmann, é preciso deixar claros os limites e regras. “Isso é muito necessário”.

Do Estadão