Investigação aponta doença mental de Adélio e frustra teorias políticas de Bolsonaro

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Na tarde desta segunda-feira, às 17 horas, o presidente Jair Bolsonaro se reuniu no Palácio do Planalto com as principais autoridades envolvidas na investigação da facada que levou durante ato de campanha em Juiz de Fora, em setembro passado. Em seu gabinete, estiveram reunidos o ministro da Justiça, Sérgio Moro, o diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo, o superintendente da PF em Minas Gerais, Cairo Costa Duarte, e o delegado que de fato investiga o crime, Rodrigo Morais Fernandes. Com uma hora e meia de duração, a conversa serviu para atualizar o presidente a partir do que se descobriu até agora sobre o esfaqueador Adélio Bispo de Oliveira – e também para contar-lhe as diligências que estão por vir.

Intercalando momentos de curiosidade e mostrando-se, vez por outra, impressionado com a quantidade de dados levantados sobre Adélio, Bolsonaro pareceu satisfeito com o trabalho da PF. O inquérito 503/2018, o segundo que apura o caso, deve ser concluído até abril. Como no primeiro, a conclusão deve ser a de que Adélio agiu sozinho, sem qualquer influência de um terceiro.

Contudo, um ponto preocupa o presidente Bolsonaro em especial. A condição mental de Adélio. ÉPOCA apurou que os laudos psiquiátrico e psicológico, que correm à parte em um inquérito sob sigilo, apontam que o esfaqueador foi considerado paranoico pelos médicos que o examinaram.

Ao que tudo indica, Bolsonaro não quer que Adélio seja considerado pela Justiça um “maluco”, nas palavras do próprio presidente. Essa conclusão tornaria o esfaqueador inimputável, o que o impediria de ser condenado a cumprir pena comum e culminaria com sua transferência para um manicômio judicial.

O advogado Antônio Pitombo, assistente de acusação contratado por Bolsonaro, analisa se pedirá a impugnação dos laudos. “Vou analisar tecnicamente. Isso depende de uma perspectiva médico-legal”, disse ele a ÉPOCA, sem entrar em detalhes.

O procurador Marcelo Medina, do Ministério Público Federal em Juiz de Fora, pediu perícia nos laudos. “Solicitei esclarecimentos quanto aos laudos. Eles não são harmônicos nem convergentes em todos os pontos”, afirmou.

Para o advogado de Adélio, Zanone Manuel de Oliveira, que é especialista em incidentes de insanidade mental, não há dúvidas sobre a saúde do cliente. “Eu sei desde o início, ele não é são. Ainda bate na tecla de que foi Deus quem o enviou para cometer o atentado. No fim, vão dizer: ‘Zanone tinha razão’.”

As próximas diligências incluem as análises do conteúdo extraído do celular do advogado, cuja perícia foi concluída este mês. Os agentes se debruçam principalmente sobre o conteúdo armazenado em nuvem, na intenção de identificar quem bancou a defesa do esfaqueador.

Conforme ÉPOCA revelou em reportagem de capa há uma semana, sobre isso, há duas suspeitas. A primeira considera que o Primeiro Comando da Capital (PCC), possa ter apadrinhado Adélio ao enxergar no atentado um ato heroico. Aplaudido por presos ao chegar no presídio de Juiz de Fora no dia seguinte à facada, Adélio foi assistido por dois advogados cuja cartela de clientes possui membros da facção em Minas Gerais. A segunda hipótese é que a defesa pode ter abraçado o caso para ganhar visibilidade midiática.

Outra diligência em andamento, as entrevistas com pessoas que mantiveram contato com Adélio nos últimos dez anos devem ser concluídas em breve. Essas pessoas foram identificadas por meio das análises da quebra de sigilo telefônico, e-mails, redes sociais e das oitivas com antigos empregadores, amigos e familiares de Adélio.

Os policiais também foram até a Câmara dos Deputados para tentar obter imagens das câmeras de segurança do dia em que um recepcionista incluiu o nome de Adélio no sistema que lista os visitantes da Casa. Valdir Barbosa dos Santos, funcionário da empresa Saga Serviços, que presta serviços para a Câmara, alegou em depoimento ter inserido o nome do agressor no sistema ao fazer, a pedido dos agentes da Polícia Legislativa, “uma pesquisa do nome de Adélio”.

O aparelho DVR da Câmara, entretanto, não continha mais as imagens que os agentes federais procuravam “por causa do espaço curto de armazenamento do HD”, segundo informou um investigador que falou a ÉPOCA sob anonimato. “As imagens foram sobrepostas por outras. Na data de interesse, não havia mais imagens”, disse.

Um dia depois da reunião que tratou do caso Adélio no Planalto, o filho do meio do presidente, Carlos Bolsonaro, publicou um tuíte insistindo na tese conspiratória que repete há cinco meses, desde que a facada foi consumada em Juiz de Fora. “imagine se fosse um candidato à presidência do PSOL levando uma facada de um ex-integrante do partido de Bolsonaro e tivesse fotos ainda mostrando sua veneração pela ideologia de direita… o que parte desta imprensa imunda junto a este partideco estariam fazendo até hoje?”, escreveu, ao comentar uma reportagem do SBT que relata investigações do Ministério Público Federal sobre a suposta doutrinação pelo partido de esquerda de estudantes em um colégio público do Rio.

Enquanto a investigação caminha para o fim, Adélio segue preso na penitenciária federal de Campo Grande, em Mato Grosso do Sul. Bolsonaro e seus filhos – principalmente o vereador Carlos – mantêm um padrão quando tocam no assunto em suas redes sociais: nunca citam o nome de Adélio nem comentam seu passado de doente mental. Sempre mencionam que o agressor é “ex-integrante do PSOL”. Tentam pregar no agressor a pecha da motivação política – quando a realidade parece mais banal.

Da Revista Época