Moro diz que endurecer penas não é fascismo

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O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, afirmou que não é “fascismo” endurecer as penas contra quem comete crimes graves. Esse é um dos pontos do pacote anticrime que irá apresentar ao Congresso.

“Hoje, homicidas qualificados ficam menos de dez anos na prisão e isso causa revolta na sociedade. Estamos propondo que, nesses casos, se endureça o regime de progressão da pena. Isso não é autoritário, nem fascismo, temos que ser rigorosos com a criminalidade grave”, disse Moro ao explicar o projeto a jornalistas.

Segundo o ministro, “regime fechado é que é prisão de verdade”, então, por isso, é necessário aumentar o tempo na cadeia. Moro defendeu o endurecimento das penas, inclusive para crimes de corrupção. “Em casos de crime contra a administração pública, como corrupção e peculato, o regime inicial deve ser fechado. A exceção é se a vantagem indevida for de pequeno valor”, afirmou.

O ministro disse que a proposta de estender o excludente de ilicitude para policiais não dará aos agentes uma “licença para matar”, como afirmam críticos à ideia. “Quem afirma isso não leu o projeto”, disse.

A proposta sobre o excludente de ilicitude foi uma das bandeiras do presidente Jair Bolsonaro durante a campanha. Esse ponto já está previsto no artigo 23 do Código Penal brasileiro, mas o texto de Moro amplia o que pode ser considerado legítima defesa.

Pelo projeto, policiais e agentes de segurança também serão beneficiados, ficando isentos de punições, caso haja vítimas durante um conflito armado ou em situações com reféns. “A proposta retira dúvidas de quais situações caracterizam legítima defesa. Às vezes, por questões subjetivas, a atuação dos policiais não eram entendidas”, afirmou o ministro.

A proposta também amplia o conceito de legítima defesa e diz que uma pessoa pode se livrar da punição caso mate alguém e consiga comprovar que praticou o ato diante de “excusável medo, surpresa ou violenta emoção”.

“Alguém que tem que se defender e, por momento de tensão, acaba cometendo excesso, dá ao juiz a possibilidade de deixar de aplicar a pena. É melhor a legislação ter uma solução para esta questão”, disse.

O projeto anticrime de Moro vai alterar o conceito de organização criminosa. Como adiantou o Valor nesta segunda-feira, a proposta vai enquadrar as milícias como organizações criminosas e endurecer as penas para os integrantes de facções.

O texto também cita explicitamente na lei exemplos do que são considerados grupos criminosos, como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV).

O projeto também defende que lideranças de organizações criminosas armadas devem começar cumprimento de pena em regime de segurança máxima. “A progressão de pena existe para ressocializar o preso, mas é óbvio que, se o condenado é membro ativo de organização criminosa, não tem condições de ser colocado em liberdade”, disse o ministro.

Segundo Moro, você tem que colocar para fora da cadeia alguém que tenha capacidade de se reinserir na sociedade, sem cometer novos crimes, o que não seria possível para participantes de facções.

O ministro também defendeu que condenados por crimes hediondos só poderão progredir após 3/5 do cumprimento da pena – hoje, isso acontece a partir de 2/5 do cumprimento. “Vocês vão ouvir críticas de advogados e especialistas, mas temos um bom álibi que é o Código Italiano. Buscamos fazer a lei para produzir efeitos práticos e não para agradar professores de direito penal”, disse.

Segundo ele, a única proposta de incremento de pena do projeto é relacionada ao armamento. “Prevemos que, se a pessoa tiver registros criminais e for pega com uma arma ilegalmente, a pena é maior. O objetivo é tirar da rua pessoas indevidamente armadas”.

Além disse, o projeto também propõe a medida do confisco alargado de bens, incluindo a possibilidade de a Justiça tomar bens que foram transferidos a terceiros. Segundo o ministro, as obras de arte que forem apreendidas poderão ser enviadas a museus.

Moro também afirmou que garantir prisão após condenação em segunda instância é uma prioridade. “O governo federal tem que assumir a liderança desse processo de mudança”, disse.

Segundo ele, o Supremo Tribunal Federal (STF) já afirmou quatro vezes que a prisão após a condenação em segunda instância é constitucional, mas é preciso deixar isso claro na legislação ordinária.

“Não apresentamos PEC porque estamos respeitando entendimento do Supremo, apenas queremos deixar claro em lei”, disse, em relação ao projeto não ser uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), que precisa de um número maior de votos para ser aprovada no Congresso.

Moro disse que a redução da maioridade penal, sim, deve ocorrer por meio de PEC – e, justamente por isso, apesar de ser uma bandeira do presidente Jair Bolsonaro, ficou de fora do projeto de lei anticrime.

O governo federal espera, segundo Moro, que o STF mantenha o entendimento de que é constitucional a prisão após condenação em segunda instância.

A jurisprudência atual do tribunal é a de que antecipar a execução da pena não fere o princípio da presunção de inocência, previsto na Constituição Federal. O STF tem um novo encontro com o tema em 10 de abril, quando julga duas ações que buscam derrubar a medida.

“O governo não tem a pretensão de controlar o Supremo, mas a expectativa é de que sejam mantidos os seus precedentes”, disse Moro.

Moro disse ainda que o governo, através da Advocacia-Geral da União, vai alterar sua posição no Supremo e apoiar a prisão após condenação em segunda instância. Essa não era a posição do governo do ex-presidente Michel Temer, alvo de denúncias por corrupção.

De acordo com o ministro, a proposta prevê casos excepcionais de suspensão da prisão após segunda instância, mas que essa não será a regra. Moro também afirmou que o projeto prevê a execução automática de sentenças proferidas por tribunais de júri.

Em relação ao caixa 2, Moro afirmou que o pacote vai incluir a criminalização da prática. “É um passo importante que o governo federal precisa apresentar ao Congresso. Uma medida importante para eliminar esse fator de trapaça dentro do processo eleitoral”, disse.

Segundo ele, o texto sobre a criminalização segue a proposta defendida pela Transparência Internacional. Moro defendeu que a Justiça Eleitoral tem papel fundamental na democracia, mas que a separação dos processos, para que sejam analisados também pela esfera criminal, é importante para dar mais eficácia à punição de quem combate ilícitos.

Moro incluiu no projeto anticrime uma medida conhecida como “plea bargain”, em que o acusado opta por um acordo em vez de responder a um processo.

O ministro explicou que a medida não se confunde com acordo de colaboração premiada, pois a delação é quando um criminoso resolve trair seus pares e colaborar revelando os crimes e recebendo benefícios.

Já no plea bargain, o criminoso admite o crime e negocia a pena. “É uma proposta para crimes menos graves, de crimes de até quatro anos, com a possibilidade de deixar de apresentar a ação criminal”, disse Moro.

De acordo com o ministro, o Ministério Público poderá negociar a pena, a partir de confissão circunstanciada, e apresentar uma proposta de punição, diminuindo os custos do processo judicial.

Moro também rebateu as críticas à proposta. “Há críticas ao plea bargain por levar à condenação de inocentes, mas o risco de erro judiciário é presente em qualquer relação humana. O risco acontece com ou sem plea bargain, embora a gente queira um sistema perfeito. Não é a introdução do plea bargain que aumenta esse risco”, disse.

Outra proposta do pacote anticrime de Moro é ampliar as vídeoconferências para tomar depoimentos. “A videoconferência com acusado preso hoje é exceção, e os Estados têm tido gastos milionários com deslocamento de presos. Alteramos ligeiramente a lei para ampliar as possibilidades de videoconferência com acusados presos”, disse.

Para o ministro, é “irreal” a ideia de que a videoconferência fere o direito do preso. Outra proposta é que os Estados possam ter presídios de segurança máxima.

O ministro também afirmou que, “pensando no futuro”, o projeto cria o Banco Genético, que será muito importante para a resolução de crimes.

O pacote também prevê a criação do Banco Internacional de Perfis Balísticos e do Banco de Impressões Digitais, além de estabelecer a possibilidade de policiais realizarem operações disfarçados. “Isso aumenta os mecanismos hábeis para investigação, assim como as operações encobertas”, disse Moro.

Segundo o ministro, com a operação encoberta, um policial vai poder ir à rua comprar droga ou arma para descobrir os crimes de maneira eficiente. Ele também rebateu eventuais críticas. “Vão ouvir que isso afronta uma súmula antiga do STF sobre flagrante preparado, mas não viola, pois é baseada em lei ordinária antiga”, disse.

Outros pontos do projeto são uma melhor regulamentação da escuta ambiental e a inserção do “informante do bem”, fonte potencial de informações de crimes contra a administração pública. Segundo Moro, o pacote anticrime é “o carro-chefe inicial” do ministério, mas isso não significa que ele não vá apresentar outras propostas “no momento oportuno”.

Do Valor