No RJ, policiais são investigados por atuar como agentes duplos para milícias

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Levantamento do UOL revela que nos últimos 15 meses houve suspeita de vazamentos de informações sigilosas em ao menos cinco operações de enfrentamento a grupos paramilitares no Rio.

Uma destas operações envolve o principal suspeito de ter executado a tiros a vereadora Marielle Franco (PSOL) e seu motorista, Anderson Gomes, na noite de 14 de março passado: o ex-capitão do Bope (Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar) Adriano da Nóbrega, que segue foragido da Justiça há cerca de um mês.

Um dos alvos da operação “Os Intocáveis”, o ex-oficial caveira – como são chamados os policiais que passam pelo curso do Bope – contaria com uma rede de proteção formada por agentes da lei infiltrados em batalhões e delegacias do Rio para se manter longe da prisão.

O episódio mais recente de infiltração aconteceu no último dia 14, quando dois policiais militares foram presos por suspeita de terem antecipado à milícia chefiada por Wellington da Silva Braga, o Ecko, informações sobre uma operação “Volante” desencadeada pela Polícia Civil na Zona Oeste do Rio.

As equipes foram às ruas para tentar cumprir 20 mandados de prisão, sendo que dez deles em nome de suspeitos que já estavam presos. Apesar disso, apenas um homem foi detido na ação policial.

Interceptações telefônicas mostraram que o trabalho acabou prejudicado pelo PM Marcelo Tinoco Petuquio, que teve uma conversa telefônica captada pelas escutas autorizadas pela Justiça. No diálogo, ele dava detalhes sobre a operação a um interlocutor ligado ao grupo paramilitar.

Além dele, também foi detido o sargento Marcelo Costa Brito, lotado no Batalhão de Policiamento em Vias Expressas (BPVE), apontado como chefe da milícia de Rio da Prata, em Campo Grande. O grupo do PM tem ligação com a “Liga da Justiça”, milícia chefiada por Ecko.

Em 22 de janeiro, durante a operação “Os Intocáveis”, apenas cinco dos 13 mandados de prisão foram cumpridos pelos policiais civis envolvidos na ação, sendo que dois dos presos são oficiais da PM, o major Ronald Paulo Alves Pereira e o tenente aposentado Maurício Silva da Costa.

Caso permanecessem foragidos, ambos perderiam prerrogativas, dentre elas, salário e aposentadoria. No dia seguinte, dois outros suspeitos foram detidos, elevando para sete o número de mandados cumpridos.

Além do ex-capitão Adriano, outro que conseguiu escapar da operação foi o presidente da Associação de Moradores de Rio das Pedras, Jorge Alberto Moreth, o Beto Bomba.

Em um trecho da denúncia encaminhada pelo Ministério Público à Justiça consta a informação de que Beto Bomba tinha acesso a dados privilegiados sobre operações policiais realizadas nas localidades sob influência de milicianos e, com isso, alertava seus aliados com antecedência.

A presença de infiltrados das milícias nas polícias não surpreende o deputado federal Marcelo Freixo (PSOL). O político que presidiu a CPI das Milícias na Assembleia Legislativa do Rio, em 2008, já havia relacionado no relatório final da comissão informações sobre o envolvimento de agentes da lei e políticos com os grupos paramilitares.

A divulgação do relatório final da CPI completou dez anos em dezembro passado. Nele, estão listados os nomes de 78 policiais militares suspeitos de envolvimento com grupos paramilitares.

O envolvimento de agentes públicos em vazamentos de informações privilegiadas às milícias também foi abordado pelos generais que participaram da intervenção federal na área de Segurança Pública.

Em 20 de dezembro passado, após a frustrada megaoperação do Exército, o general Richard Nunes, então à frente da Secretaria de Segurança, levantou suspeitas sobre o vazamento de informações. Na ocasião, os militares tinham em mãos 97 mandados de prisão, mas cumpriram menos de uma dezena deles.

O vazamento, segundo investigações, teria partido de um PM do Regimento de Polícia Montada (RPMonte), de Campo Grande, na zona oeste da cidade – uma das áreas dominadas pela organização criminosa alvo da operação. O objetivo da ação, que mobilizou mais de 1.700 militares, era enfraquecer a organização criminosa conhecida como “Liga da Justiça”.

Um delegado ligado a cúpula da Secretaria de Polícia Civil confirma que os vazamentos recorrentes levaram o secretário Marcus Vinícius Braga a determinar a adoção de medidas de contra-inteligência para identificar, prender e levar à Justiça os agentes da lei que se valem da função para privilegiar grupos criminosos.

O UOL procurou a Polícia Civil para comentar a investigação de possíveis infiltrados atrapalhando as investigações, mas a entidade não quis se pronunciar.

A reportagem não conseguiu contato com as defesas de Adriano da Nóbrega; Wellington da Silva Braga, o Ecko; Marcelo Tinoco Petuquio; Marcelo Costa Brito; Ronald Paulo Alves Pereira; Maurício Silva da Costa; e Jorge Alberto Moreth, o Beto Bomba. Quando elas se manifestarem, as respostas serão incluídas nesta reportagem.

Do UOL