Pautas de educação vão impactar pilares econômico e ‘cultural’ do governo

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As pautas relacionadas à educação com potencial para mobilizar o Congresso Nacional no primeiro ano da gestão Jair Bolsonaro (PSL) têm relação com dois pilares do governo: a linha de austeridade com as contas públicas e a reafirmação do posicionamento conservador no âmbito da chamada guerra cultural.

De um lado, as discussões sobre o financiamento à educação e ampliação de investimentos federais na área diante dos planos do ministro da Economia, Paulo Guedes.

Do outro, as discussões do projeto Escola sem Partido, ensino domiciliar (histórica demanda religiosa abraçada pelo governo) e até uma possível “CPI da doutrinação” —tudo relacionado a uma agenda cara de comportamento do presidente e de seus aliados.

O governo deve encaminhar ainda este mês uma medida provisória para regulamentar o ensino domiciliar. A elaboração do texto está a cargo do Ministério da Família, Mulher e Direitos Humanos, o que já gerou conflitos com a pasta da Educação. Tanto pelo conteúdo quanto pela própria pertinência de o tema estar fora da MEC.

A oposição já prepara questionamentos ao argumento da urgência do tema. A medida provisória encurta o trâmite legislativo mas deve ser utilizada apenas em caráter de urgência e relevância —já há projetos em discussão na Câmara sobre isso.

Ao mesmo tempo em que a reforma da Previdência se impõe como prioridade pela urgência das contas públicas, o Congresso deve discutir a revisão do Fundeb, cujo modelo atual vence no ano que vem. O tema é complexo e deve pressionar a área econômica.

O Fundeb reúne impostos de estados e municípios e uma complementação da União, hoje na ordem de 10% da arrecadação total desse fundo. Já há um movimento no Congresso para, além de melhorar a distribuição dos recursos, aumentar essa complementação. Isso implicaria na ampliação do papel da União do financiamento da Educação.

Principal mecanismo de financiamento da educação básica, o Fundeb significa R$ 4 a cada R$ 10 gastos na área. Os recursos do fundo representam ao menos 70% do orçamento da educação para quatro de cada dez municípios brasileiros.

Assim, a pauta é de grande interesse de prefeitos e governadores. Quase 80% do gasto do ensino básico sai dos cofres de municípios e estados.

“A necessidade de ampliar o papel da União no financiamento da educação tem um conflito direto com a agenda do Paulo Guedes, que é de redução dos investimentos sociais”, diz Daniel Cara, coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação. No programa de governo, Bolsonaro destaca que os recursos da educação já são suficientes.

“Como as pautas econômicas vão desgastar o governo e gerar conflitos, podem usar das pautas da guerra cultural para fazer sinais para o núcleo duro de apoio ao governo”, completa Cara.

Bolsonaro é entusiasta do Escola sem Partido, projeto que busca limitar o que o professor pode falar dentro da sala de aula. O combate a uma suposta “sexualização precoce” e à “ideologia de gênero” (termo nunca usado por educadores) catapultou a carreira política do presidente.

No projeto de lei que acabou arquivado na Câmara no ano passado, a abordagem de gênero chegava a ser vetada. Segundo estudiosos, a abordagem educacional sobre questões de gênero pode colaborar com o combate a problemas como gravidez na adolescência, violência contra mulher e homofobia.

Defensores do Escola sem Partido entendem que o projeto busca a neutralidade na sala de aula contra uma suposta doutrinação de esquerda que dominaria as escolas brasileiras. Para os críticos ao projeto, a ideia da lei é autoritária, vai limitar a pluralidade de ideias nas escolas e constranger professores. Não há evidências que indiquem que doutrinação seja um problema amplo.

O plano da base aliada no Congresso é desengavetar o projeto de Escola sem Partido. Segundo a deputada Bia Kicis (PSL-DF), essa retomada pode ficar para o segundo semestre ou até mesmo para o ano que vem. Isso para dar prioridade à agenda econômica.

“Havendo uma comissão especial de Escola sem Partido gostaria de fazer parte, mas pode ser mais pra frente, quando acabar a votação das pautas econômicas”, disse. Kicis busca a indicação do partido para presidir a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, mas espera ser suplente da comissão de Educação.

Ainda há uma questão estratégica. Os defensores do Escola sem Partido eram maioria na comissão especial que analisava o projeto no ano passado mas foram derrotados pela oposição e o projeto acabou arquivado sem votação. Dessa vez, o grupo conservador e religioso quer evitar nova derrota.

Kicis é cunhada de Miguel Nagib, fundador do movimento Escola sem Partido. Também tem proximidade com o ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez. No discurso de posse, Vélez exaltou a família, Igreja e valores tradicionais e disse que a pasta vai “combater com denodo o marxismo cultural” na educação.

A deputada e aliados pretendem tirar do papel uma “CPI da doutrinação”, com o objetivo de reunir casos de doutrinação nas escolas pelo país. São necessários dois terços da Casa para criar uma comissão. “A criação de uma CPI da Doutrinação poderia começar já, porque demora tempos uma CPI dessas”, disse.

Para o deputado Danilo Cabral (PSB-PE), que presidiu a comissão de Educação no último ano, o Fundeb é um símbolo das discussões de financiamento da educação e a relação com as metas não alcançadas do PNE (Plano Nacional de Educação).

“Precisamos discutir o pacto federativo, que hoje é às avessas. Sem a desconcentração de recursos. Se olhar política [federal] de transporte escolar, há 11 anos não tem reajuste”, diz.

Uma das metas do PNE já vencidas tem a ver com melhorias no pacto federativo e depende de aprovação no Congresso. Trata-se do Sistema Nacional de Educação, que estabelece um regime de cooperação e colaboração entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios na área de educação. Já há projeto na Câmara, mas não há informações sobre a postura do governo com relação a isso.

Cabral ressalta que os discursos ideológicos nos costumes e de redução de investimentos públicos podem prejudicar o debate sobre desafios reais da educação. “As pessoas não querem escola sem partido, querem escola com professor, com merenda, com metas, com gestão.”

Ainda há a expectativa de o governo levar ao Congresso pautas relacionais à educação básica, com relação à política de alfabetização. O tema foi colocado como prioridade pela gestão.

O Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) vence em 2020. A União complementa em 10% do valor do fundo arrecadado por estados e municípios. Projeto em trâmite no ano passado na Câmara defende mínimo de 30% na complementação do fundo, enquanto proposta do Senado quer no mínimo 50% de complementação.

Regulamentar a educação domiciliar é uma das metas dos 100 dias do governo. O Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos prepara uma medida provisória com o objetivo de garantir “o direito ao ensino domiciliar”. “O objetivo é construir uma proposta sólida, que garanta segurança jurídica às famílias que optarem por essa modalidade de ensino.” A medida provisória encurta o trâmite legislativo mas deve ser utilizada apenas em caráter de urgência e relevância. Oposição irá questionar a urgência.

O projeto busca a neutralidade do professor na sala de aula como forma de combate a uma suposta doutrinação política. No texto que está no Congresso, veta-se abordagens de gênero na educação e também prevê a afixação de um cartaz nas salas de aula com deveres dos professores.

Para os críticos, a ideia da lei é autoritária, vai limitar a pluralidade de ideias nas escolas e constranger professores. No ano passado, os defensores eram maioria na comissão especial que analisava o projeto mas foram derrotados pela oposição e o projeto acabou arquivado sem votação.

Ideia de deputados da base aliada do presidente Jair Bolsonaro de membros do movimento Escola sem Partido. O objetivo é reunir casos de doutrinação nas escolas pelo país. São necessários dois terços da Casa para criar uma comissão.

Estabelece um regime de cooperação e colaboração entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os municípios na área de educação. O sistema é previsto no PNE (Plano Nacional de Educação) e tem fundamentação na Constituição. Já há projeto na Câmara, mas não há informações sobre a postura do governo com relação a isso.

Da FSP