Carta aberta à sociedade sobre riscos de despejo do assentamento Luiz Beltrame, em Gália-SP

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Nós, as 77 famílias assentadas no Assentamento Luiz Beltrame, no município de Gália,SP, viemos a público através deste documento, denunciar perante a sociedade o grave risco de despejo de parte do assentamento.

Histórico:

O assentamento se originou a partir da luta pela terra na região com o acampamento Luiz Beltrame em 2009, onde o mesmo protagonizou diversas lutas pela conquista da terra durante 04 anos embaixo de lona, para que as famílias Sem Terra pudessem ser assentadas e produzir alimentos saudáveis com fartura e dignidade.

Em 2010 duas fazendas foram desapropriadas por improdutividade no município de Gália: a fazenda Santa Fé (Recreio Gleba 3) e Portal do Paraíso. Ambas foram emitidas na posse em 2012. Com isso, as famílias passaram por processo de homologação em 2013 e regularização legal por parte do INCRA. Desde então o assentamento foi se consolidando, desenvolvendo intensamente a produção agrícola e laços comunitários efetivamente sólidos.

No entanto, o ex-proprietário da fazenda Santa Fé (Recreio Gleba 3) desde o inicio não aceitou o ato desapropriatório e a emissão de posse, recorreu na Justiça para conseguir a fazenda de volta e retirar as 18 famílias assentadas nesta área. Durante a tramitação do processo em algumas instancias houve o ganho de causa por parte do INCRA, bem como, a continuidade da permanência das famílias na área. Este processo jurídico permaneceu por cinco anos tramitando no Judiciário na Vara Federal de Marília, até que foi transferida para a Vara Federal de Bauru.

Devido o atual momento político, de retrocessos e percas de direito, assim como, de conservadorismo e parcialidade do judiciário, houve manobra política por parte do ex-proprietário em que o mesmo obteve vitória na Justiça, em ultima instancia, no STF contra o INCRA e a decisão judicial, por parte da Juíza Federal Substituta Maria Catarina de Souza Martins Fazzio, foi a de despejar as 18 famílias da Fazenda Santa Fé, inclusive com uso da força policial, e repassar a posse em favor do ex-proprietário Ivan Cassaro, um dos maiores empresários de fabricação de embalagens de plástico da América Latina e proprietário de diversos latifúndios na região.

Podemos comprovar em números que nestes cinco anos houve total reversão de uma área completamente improdutiva em alta produtividade, por parte das famílias, mesmo sem ter tido o apoio em financiamentos por parte do Estado.

Produtividade do Assentamento sobre o latifúndio improdutivo:

Mesmo num assentamento precarizado e sem investimentos em infra estrutura e créditos, segundo estimativas da safra de 2018, conforme levantamento interno, o assentamento produziu dez mil e quinhentas (10.500) toneladas de mandioca; cerca de 100 cabeças de gado bovino foram vendidos; 300 toneladas de mandioca pré cozida; 5.000 caixas de maracujá foram comercializados; em torno de 200 sacas de feijão orgânico; 50 mil dúzias de milho verde; 2.000 caixas de quiabo; 8.000 toneladas de manga; entre outros produtos hortifrutigranjeiros que não foram contabilizados.

Há também alta produção de bovinos, caprinos, suínos, abelhas e aves fornecendo de forma autônoma a produção de carne, leite, ovos, mel para consumo interno das famílias.

Sem contar ainda a grande diversidade produtiva de alimentos nos quintais próximos às moradias de frutas diversas, verduras, legumes, tubérculos, etc.

Além disso, há reconhecimento da sociedade em torno das experiências agroecológicas bastante valorizadas e consolidadas de produção em sistema agroflorestal. Tivemos nossas experiências divulgadas em meios de comunicação convencionais como a TV Record e a TV UNESP, além de outros meios alternativos de comunicação como Jornal Metrópole de Brasília DF e através do Youtube.

Reconhecimento da Sociedade:

O assentamento desenvolve parcerias com importantes entidades da sociedade civil visando melhorias nas condições de vida visando o pleno desenvolvimento de áreas como saúde, educação, produção agrícola, formação técnica, etc.

Possui parcerias com entidades como a UNESP Marília, APEOESP Bauru, FAMEMA Marília, Secretaria de Saúde do Município de Gália, apoio da prefeitura do município, (onde há a instalação de um Centro de Saúde no assentamento com atendimento médico pelo SUS, bem como o acompanhamento do programa da Saúde da Família juntamente com o importante trabalho do Diretório Acadêmico da Faculdade de Medicina de Marília – FAMEMA – o Grupo “Severinos” o qual atua na prevenção da saúde no seu conjunto).

O assentamento recebe visitas de estudantes universitários de diversas universidades da região e de diversas áreas do conhecimento técnico científico que contribuem para o desenvolvimento interno.

Há variados cursos de capacitação técnica empreendedorismo como o SENAR em aprendizagem de técnicas agroindustriais de produção, manuseio, preservação de alimentos, administração rural, receitas orgânicas de controle de pragas, etc.

As famílias participam de associação comunitária como é o caso da Associação Arco-íris,onde foram beneficiadas por um Projeto de Comercialização via o projeto denominado Microbacias cujos recursos do governo estadual, federal e Banco Mundial, foram aplicados em poços artesianos, estradas, caminhão, trator, carreta, visando a infraestrutura de comercialização da produção agrícola e transporte para os grandes centros comerciais da região, etc.

A comunidade também tem levado a cabo a luta contra os agrotóxicos e a pulverização aérea em torno do assentamento, tendo em vista que isso trás enormes consequências para a saúde dos seres vivos, seja seres humanos, animais ou vegetais. Um artigo com essa temática sobre o assentamento foi publicado no site da UNESP (ver:.), vídeo documentário publicado no canal youtube e uma ampla mobilização de entidades ambientalistas.

Diversas ações são realizadas em conjunto com a sociedade como feiras de alimentos orgânicos como no Bairro Cavallari em Marília, no centro urbano de Galia, Garça, Ubirajarara, Bauru. Entrega de cestas agroflorestais/agroecológicos em Bauru e também o desenvolvimento econômico, comercial de pequenos municípios como Gália, Ubirajara, Duartina, Garça, Alvinlândia e Lucianópolis, através da comercialização de pequena escala de diversos produtos.

Toda essa produção é garantida sem o mínimo de financiamento e de recursos, tendo em vista que em cinco anos, as famílias não receberam nenhum tipo de credito de apoio a produção, como o Pronaf por exemplo. Nem mesmo o fomento inicial foi liberado. Créditos estes que são fundamentais e de direito das famílias, previstos nos programas nacionais de desenvolvimento dos assentamentos.

Responsabilidade do INCRA:

Denunciamos também a negligencia e inoperância do INCRA com o acompanhamento jurídico do processo, uma vez que é parte principal do mesmo e demonstrou desinteresse em recorrer quando do julgamento no STF. Há falta de responsabilidade do Órgão no tocante as condições de estrutura, apoio, créditos, assistência técnica, em que as famílias tanto juridicamente, tecnicamente, financeiramente, entre outros aspectos estão desassistidas.

Parcialidade do Judiciário:

Diante de todo o exposto, concluímos que há uma Justiça cega, parcial, INJUSTA, que julga a favor do latifúndio reafirmando o histórico de desigualdade social e violência do latifúndio contra os pobres do campo. Mais uma vez impera a lei em favor da oligarquia agrária, parasita do Estado e improdutiva.

Portanto, nossa indignação com esta decisão judicial INJUSTA, a favor do latifúndio que gera fome, miséria, desigualdade social, violência, exclusão.

Reafirmamos nosso compromisso de lutar pela defesa e manutenção da conquista do nosso território. Seguiremos em batalha entrincheirando-se para que haja Justiça Social com aqueles que realmente pertencem à Terra, que nela trabalham e nela produzem.

Veja o vídeo do Assentamento em:

Do Jornalistas Livres