Lula preso sem provas, Bolsonaro eleito e R$ 2,5 bi para uma fundação bilionária

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A Lava Jato completa cinco anos hoje. Veio para mudar o Brasil. Mudou. Jair Bolsonaro é presidente da República: Sérgio Moro é ministro da Justiça; Vélez Rodriguez é ministro da Educação; Damares Alves é ministra dos que vestem azul e das que vestem rosa, e o chefe do Executivo atravessou o umbral da nova era ao divulgar um filminho pornô. Há mais.

A Força Tarefa, ainda a maior pauteira da imprensa, tem na sua história alguns feitos notáveis: conseguiu mandar para a cadeia um ex-presidente da República sem apresentar as provas de seu crime e tentou criar uma fundação bilionária que renderia em juros o que empresas que empregam milhares não rendem em lucros. Parte dos 12,7 milhões de desempregados se deve à sua eficiência. Deveria ser um esforço organizado de combate à corrupção. Tornou-se um projeto de captura do Estado. Com R$ 2,5 bilhões em caixa, poderia tentar interferir na escolha do próximo papa.

Ali pelo terceiro ou quarto mês da operação, já em 2014, os meus sensores democráticos deram os primeiros sinais de que algo poderia dar errado. Incomodava-me o que me parecia, então, sujeição da imprensa a métodos que agrediam fundamentos do Estado de Direito.

Destaco em posts abaixo duas colunas escritas na Folha em junho e julho de 2015. O PT ainda era o alvo principal da operação, e eu, o que não é surpresa para ninguém, era um dos mais duros críticos do partido. E seria ainda hoje estivesse ele no poder e recorresse aos mesmos métodos. Poderia ter me calado diante das arbitrariedades do então juiz Sérgio Moro e dos procuradores. Afinal, é claro que eles estiveram entre os protagonistas da queda de Dilma Rousseff. Ocorre que eu escrevo sobre política, penso a política, mas não faço política.

Assim, não precisei esperar que a operação chegasse a outros partidos, como sustentam alguns idiotas e mentirosos, para acusar os métodos ilegais a que ela recorria. Antevi os efeitos deletérios, que estão aí aos olhos de todos, da ação coordenada de frações da Justiça e do Ministério Público Federal contra garantias fundamentais.

Não! Eu não me tornei um crítico da operação porque pilantras tentaram, sem sucesso, me envolver na sujeira. Eu só virei alvo de canalhas porque vinha apontando, desde 2014, as práticas autoritárias e autocráticas da operação, de que a tal “fundação de direito privado” com grana da Petrobras, por ora frustrada, se tornou um emblema.

É preciso, sim, combater a corrupção. Essa é uma das atribuições do Ministério Público, entre outros entes do Estado. A existência de uma força tarefa de caráter permanente com essa função, no entanto, é só um delírio de burocratas que se refestelam em gastos milionários com “diárias” pagas a procuradores e que têm a ousadia de se comportar como se fosse um Quarto Poder. É preciso ser tolinho para não perceber que o objetivo é conquistar a Presidência da República. Bolsonaro é visto apenas como um ritual de passagem.

Nos dois posts abaixo deste, relembro as colunas de 2015 — há quase quatro anos, portanto.

Sim, claro! Eu era, então, alvo do ódio devotado dos petistas. Juntaram-se a eles, no achincalhe, os lava-jatistas, parte considerável já unida ao bolsonarismo. Fazer o quê? A função de um jornalista não é servir de esbirro de partidos, de juízes ou de procuradores.

Leio o que escrevi há quatro anos e olho para a Lava Jato: Sérgio Moro é ministro da Justiça de Bolsonaro, e Deltan Dallagnol tentou criar a tal fundação bilionária. Fico até um tantinho orgulhoso. Eles estavam errados sobre mim. Mas eu estava certo sobre eles.

No dia 17 de julho de 2015, escrevi um post intitulado “Os filhos do PT comem seus pais”. O link está aí. Eu me orgulho dele. Apontava as arbitrariedades, em curso ainda hoje, da Lava Jato e afirmava que a turma que compõe a força tarefa foi formada intelectualmente pelas heterodoxias do petismo no campo do direito.

Sim, trata-se de um texto crítico ao partido. Mas ali se evidencia meu inconformismo com a lambança legal que a Lava Jato promovia. O PT, ora vejam, não entendia o que estava em curso — e não sei se entendeu até hoje — e julgava tratar-se apenas de uma manobra para depor Dilma, como evidencia a fala de Rui Falcão, que reproduzo no texto.

O partido custou a perceber que se estava diante de uma ação mais ampla, que pegava carona no ódio à política, que ganhou as ruas em 2013 — O ESTOPIM FOI ACESO PELA ESQUERDA, COM O APOIO INICIAL DO PT, DIGA-SE; ISSO ESTÁ DOCUMENTADO E AINDA VOLTAREI AO TEMA NESTE BLOG EM OUTRA OPORTUNIDADE.

No texto, critico as prisões preventivas arbitrárias, mandados de busca e apreensão espalhafatosos, o uso que se passou a fazer das delações premiadas… Bem, meus caros, também isto é preciso dizer: a Lava Jato e seus métodos autoritários só prosperaram porque Dilma, pressionada pelas ruas e pela incapacidade do PT de entender o que estava em curso, patrocinou e sancionou a Lei 12.850, que é justamente a das delações. Ela transforma o delator — que, por definição, cometeu crimes — em “Sua Excelência”. Como não conhecemos os métodos e os critérios de negociação, cabe a ele decidir quem vive e quem morre na política.

Notem: o país fica à mercê daqueles que caem nas malhas da operação e daquilo que estiverem dispostos a contar, ou a inventar, para minorar as penas que lhes serão impostas. Os Três Poderes da República e, a rigor, a sociedade se tornam reféns da história que a Força Tarefa decidir que tem de ser contada. Tomem como exemplo o caso do banqueiro André Esteves, preso em novembro de 2015, quatro meses depois da coluna que segue abaixo. A PGR o acusava de ser o financiador de uma suposta operação para impedir a delação de Nestor Cerveró. Era uma história tresloucada, insana, sem pé nem cabeça. Esteves foi tratado como culpado por parte considerável da imprensa — culpado do que, ficou provado, nunca existiu. Ocorre que prender ricos ou famosos fazia parte da ração diária de ódio que a Lava Jato tinha e tem de fornecer a seus entusiastas.

Ah, claro! Que se investigue o que tem de ser investigado. Mas que se atue dentro dos marcos legais. Eis o ponto. E não! Não vou desistir de apontar as arbitrariedades de servidores públicos cuja tarefa é servir à sociedade. Seus delírios totalitários têm de ser contidos. E punidos.

Segue a coluna de 17 de julho de 2015.
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Que a Petrobras tenha se transformado num antro de bandidos, eis uma evidência. Pedro Barusco, o gerente de Serviços, peixe médio, aceitou devolver US$ 97 milhões. Isso a que chamamos “petrolão” reúne, sem dúvida, uma penca de ações criminosas. Mas será mesmo necessário violar a legalidade para cassar corruptos? A resposta é “não!”.

Polícia Federal, Ministério Público e Justiça Federal, cada um por seu turno e, às vezes, em ações conjugadas, têm ignorado princípios básicos do Estado de Direito. Não é difícil evidenciar que prisões preventivas têm servido como antecipação de pena. Basta ler as petições dos procuradores e os despachos do juiz Sergio Moro para constatá-lo. Mandados de busca e apreensão, como os executados contra senadores, um ano e quatro meses depois de iniciada a investigação, são só uma exibição desnecessária de musculatura hipertrofiada do poder punitivo do Estado. O desfile dos carrões de Collor –que nem ouvido foi– excita desejos justiceiros, não de Justiça. Estão tentando transformar Dora Cavalcanti, defensora de Marcelo Odebrecht, em ré.

Delações premiadas exibem contradições inelutáveis entre os autores e versões antagônicas de um mesmo delator. Parece estar em curso uma espécie de “narrativa de chegada”. A cada depoimento, ao sabor de sua conveniência, as personagens vão ajustando a sua história. Acumulam-se riscos de anulação de todo o processo, o que seria péssimo para o país.

Infelizmente, procuradores, policiais e juiz parecem não se contentar em fazer a parte que lhes cabe na ordem legal. Mostram-se imbuídos de um sentido missionário e doutrinador que vai muito além de suas sandálias, daí as operações e fases receberem nomes esdrúxulos e impróprios como “Erga Omnes” e “Politeia”. Politeia? Quem quer viver na Coreia do Norte de Platão? Eu não quero!

Um dos doutores do MP disse em entrevista ser necessário refundar a República. Moro aventou a hipótese de soltar um empreiteiro em prisão preventiva desde que sua empresa rompesse todos os contratos com o poder público, uma exigência que acrescentou por conta própria ao Artigo 312 do Código de Processo Penal. Em petições e despachos, há reptos contra o… lucro!

Os filhos do PT comem seus pais. Chegou a hora de a companheirada se tornar vítima de seus religiosos fanáticos, formados nas escolas de direito contaminadas por doutrinadores do partido e esquerdistas ainda mais obtusos. É uma pena que não só os petistas paguem o pato. Esses vetustos jovens senhores são crias de exotismos como “direito achado na rua”, “combate ao legalismo”, “neoconstitucionalismo” e afins, correntes militantes que consideram a letra da lei o lixo dos “catedraúlicos”, pecha que um desses teóricos amalucados pespegava em juízes que insistiam em se ater aos códigos.

O PT de 2015 está experimentando a fúria dos “savonarolas” que criou. Eles se sentem fazendo um trabalho de depuração. E podem, com o seu ativismo, pôr tudo a perder. Os corruptos vão aplaudir a sua fúria

Rui Falcão se traiu e, num ato em defesa do mandato de Dilma, afirmou: “É isso que eles pretendem fazer agora: expelir a Dilma dentro de um processo democrático”. Huuummm… Troco o verbo “expelir” por um sinônimo mais afeito à política: “depor” fica bem. No mais, Falcão está certo. Boa parte do país quer mesmo “depor Dilma dentro de um processo democrático”.

No dia 25 de novembro de 2016, escrevi outra coluna na Folha que gerou barulho. O título: “Não darei a demiurgos da Lava Jato os seus dez meses de Terror Salvacionista”. E, mais uma vez, retomo os fundamentos do Estado democrático e de direito. Mais de dois anos já se passaram. Ora vejam… A Lava Jato ainda não tinha vazado nenhuma conversa minha. E estava tomando as pancadas que merecia. A pergunta estúpida que se fazia: “Como é que você, um liberal, um cara de direita, critica a Lava Jato?” Porque um liberal que não defende direitos fundamentais e que endossa arroubos autoritários de funcionários do Estado é só um vigarista, não um liberal. Segue o texto.

Acho estranho que achem estranho que eu tenha críticas a fazer à Lava Jato. E não são novas. Como isso é possível? Justo o cara que criou os termos “petralha” e “esquerdopata”? Justo aquele que bate no PT desde Santo André, quando Celso Daniel ainda vivia? Alguns chegam a ver nisso uma regressão trotskista… Então não enxergo em Sergio Moro e em Deltan Dallagnol, respectivamente, os inimigos nº 1 e nº 2 de Lula, do PT, da “corja toda”, como dizem por aí?

Pois é…

O PT é pequeno e tem uma importância só episódica no conjunto de elementos que formam minhas convicções e minhas prefigurações. Não me opus ativamente ao partido –recorrendo apenas à escrita, nunca à militância política– porque o PT se chama PT. Com as mesmas características, a legenda teria igual perfume caso se chamasse “Rosa”.

Tampouco me incomoda a figura de Lula, que tanto rancor desperta na extrema-direita boçal: porque operário na origem, porque supostamente ignorante, porque nordestino, porque padece de idiopatia gramatical, porque é eneadáctilo… A propósito: Geddel Vieira Lima tem dez dedos.

Lula ainda é uma das maiores inteligências políticas do Brasil. Sua trajetória prova isso. De resto, nunca foi esquerdista. Tampouco fez um governo de esquerda. O que matou o PT foi o misto de populismo e roubalheira. O primeiro levou a economia para o buraco. A outra minou-lhe a reputação. E, sim, era Lula o chefe inconteste da equação.

Ao longo do tempo, opus-me à incompetência do PT; aos malfeitos; ao autoritarismo; ao uso descarado do Estado em benefício do partido e de seus asseclas; ao capitalismo de compadrio; à tutela crescente do Estado sobre a sociedade; às agressões às liberdades individuais praticadas por milícias disfarçadas de movimentos sociais; aos ataques à imprensa e aos jornalistas independentes, financiados com verba estatal –uma arquitetura originalmente concebida por Franklin Martins– e ao uso do dinheiro público para eleger os “campeões” do empresariado nacional.

Causavam-me ainda repúdio a contaminação ideológica de organismos de Estado como Ministério Público, Defensorias e Judiciário; a transformação das universidades públicas em aparelhos do partido; a permanente crispação que buscou dividir o país entre “nós” (eles) e eles (nós); a determinação de eliminar os adversários, não apenas de vencê-los; as ações concretas e objetivas que buscavam instaurar, na prática, um regime de partido único no país, ainda que as siglas fossem se multiplicando.

Jamais advoguei a criação de instrumentos de exceção para combater essa legenda. Nem quando a sua hegemonia chegou a ameaçar conquistas democráticas. Sempre apostei na luta política.

Eu me opus àquele concerto de pessoas e forças porque sou um liberal. Logo, sendo quem sou, não teria como condescender, por exemplo, com ao menos quatro das dez medidas com que o MP pretendia combater a corrupção (eram fascistoides). Defendo ainda sem reservas o projeto que muda a lei que pune abuso de autoridade e demonstro meu inconformismo sempre que a força-tarefa vai além do que lhe faculta o Estado de Direito.

Não darei a demiurgos os seus dez meses de Terror Salvacionista. Já tiveram a chance de dizer a que vieram, durante a Revolução Francesa, entre setembro de 1793 e julho de 1794. Não foi bacana. Meu apoio à Lava Jato, nos limites da lei e da Constituição, é incondicional.

Meu liberalismo não admite um período de autoritarismo profilático. Liberalismo assim é coisa de abestado.

Do UOL