Acordo Lava Jato-Rodonorte fere Constituição e Lei de Improbidade

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Leia o artigo de Reinaldo Azevedo, jornalista político brasileiro.

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Pornográfico?

Absurdo?

Escandaloso?

Ilegal?

Imoral?

Indecente?

Escolham aí. Acrescentem palavras. Se alguém tinha alguma dúvida de que a Lava Jato se transformou num projeto de poder — se é que chegou a ser alguma outra coisa —, basta que analise os termos do acordo de leniência que celebrou com a Rodonorte, no Paraná, conforme noticiou nesta terça o site Consultor Jurídico. Reproduzo:

Os procuradores da operação “lava jato” transformaram o acordo de leniência com a Rodonorte, concessionária de rodovias, numa ação de marketing. Parte do acordo é que a empresa dará desconto de 30% no pedágio das estradas do Paraná. Outra parte exige que a empresa diga que o desconto está sendo dado por causa dos bons préstimos da operação “Lava Jato” ao povo paranaense.

“O valor do pedágio foi reduzido em 30% [ou percentual aplicado no momento] porque recursos provenientes de corrupção foram recuperados pela Operação Lava Jato e aplicados em benefício do usuário”, terá que dizer o texto. É o que manda o parágrafo 21 da Cláusula 6ª do acordo, conforme mostra a imagem acima. O mesmo texto deverá ser fixado em placas, de 8 metros quadrados, em todas as praças de pedágio.


Onde está escrito que o Ministério Público Federal pode celebrar esse tipo de acordo? Em lugar nenhum. É escandalosamente ilegal. Como se nota, os bravos cavaleiros se transformaram também numa máquina de autopropaganda. E notem: isso é o que se esconde num acordo que nem está entre os 10 mais famosos celebrados pela operação.

O que se tem aí um é um grupo de pessoas que integram um ente do Estado a empregar suas prerrogativas para fazer propaganda de si mesmos. Claro, claro… Eles poderiam dizer que atuam em benefício do ente a que pertencem e da sociedade. Observem que não se fala em promover o Ministério Público, o que já seria errado e ilegal, mas em cantar as glórias da Lava Jato.

Imaginem agora o que se esconde em sei lá quantos acordos de leniência. Parece que começa a fazer sentido aquela iniciativa da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República), que entrou com um habeas corpus preventivo e coletivo para que seus integrantes fiquem imunes a qualquer investigação.

Agora a Lava Jato virou distribuidora de benesses. E com marca registrada. Mais um pouco, alguém acaba sugerindo que bom mesmo seria erguer edifícios na Muzema, no Rio.

Essa turma queria dar o destino final de uma multa de R$ 2,5 bilhões paga pela Petrobras. Também se deu o direito de gerir mais de R$ 8 bilhões do acordo celebrado com a Odebrecht. A propósito: onde estão os bilhões todos os outros acordos de leniência? São usados para quê? Com que finalidade? Para atender a quais interesses? Como o dinheiro é gerido?

O acordo com a Rodonorte fere o Artigo 37 da Constituição, a saber:
“A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”

E agride o Artigo 11 da Lei 8.429, a da Improbidade Administrativa:
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:
I – praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;
VIII – descumprir as normas relativas à celebração, fiscalização e aprovação de contas de parcerias firmadas pela administração pública com entidades privadas.

A lei prevê a pena no Artigo 12:
III – na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.

Esses são os patriotas que gritam “querem acabar com a Lava Jato” a cada vez que alguém fala em cumprir a lei ou em punir abuso de autoridade.

Infelizmente, boa parte a imprensa é reverente ao que constitui óbvia agressão ao Estado de Direito, à legalidade e à moralidade. Tudo em troca de alguns vazamentos industriados…

Mais um pouco, a Lava Jato estará vendendo ligação de TV a cabo, distribuindo gás, oferecendo serviço de vans e, claro, garantindo a segurança da comunidade…

Dá para entender por que os valentes ficam arrepiados quando o Supremo abre de ofício um inquérito para apurar a indústria de “fake news” que busca desmoralizar o Supremo.

O nome disso é medo.

Do UOL