Estudo do Banco Mundial recentemente divulgado revela que voltamos ao velho pesadelo

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Depois do sonho rooselvetiano, em que imaginamos virar um país de classe média, voltamos ao velho pesadelo da pobreza. É o que mostra o estudo do Banco Mundial recentemente divulgado (Mercado, 5/4).

De acordo com o relatório, depois de cair sistematicamente entre 1999 e 2014, o número de pobres aumentou, com 7,4 milhões de brasileiros tendo retornado à condição de carência em 2017.

Analisando o conjunto da América Latina, o organismo multilateral identifica no que chama de a “década de ouro” (2003-2013), marcada pela elevação do preço das commodities, um avanço nas condições de vida das camadas de baixa renda.

Em seguida, a situação piorou. Lembre-se, por exemplo, o relato recente de Sylvia Colombo sobre a Argentina, onde 2,7 milhões caíram abaixo da linha que demarca a pobreza nos últimos seis meses.

Na realidade, há elementos para pensar que o quadro é ainda pior do que o medido pelo organismo multilateral. No caso brasileiro, a pesquisa considera pobre aquele que recebia até R$ 637 ao mês. Isto é, menos do que um salário mínimo, abrangendo 21% da população dois anos atrás.

Conforme argumentei em “O Lulismo em Crise (Companhia das Letras, 2018, p. 82), com base em cálculos do economista Waldir Quadros, deveria se considerar em 33% o número de pobres já em 2015.

Não vem ao caso debater aqui questões metodológicas, pois o importante é constatar o acordo geral em torno do crescimento da pobreza. Mas o tamanho relativo da camada em pauta tem consequências políticas.

É o que explica o fato de a única medida propriamente social concedida pelo governo Jair Bolsonaro em seus primeiros cem dias ter sido a criação do 13º da Bolsa Família. Tal decisão pretende ajudar a reverter a crescente impopularidade do presidente entre os mais pobres, segmento que tende a ser de novo o eixo decisivo do eleitorado nacional.

Sem prejuízo de merecer apoio qualquer iniciativa que vise proteger aqueles cuja vulnerabilidade é maior, só a retomada do crescimento, com redistribuição da renda, poderá inverter o viés de precarização.

Desde 2015 os ortodoxos prometem a ativação da economia para depois da austeridade. Vivemos nela há quatro anos e o ritmo do PIB não sai do 1%.

Como o ultraliberal Paulo Guedes dobra a aposta na austeridade, prevê-se nada além de 1,5% de elevação em 2019. Assim, a pobreza vai se agravar, firmando-se outra vez no centro do embate político. Será ainda em torno de como gerir a economia de modo a realizar a tarefa histórica da integração que as correntes adversárias irão se digladiar no próximo decênio.

André Singer
Professor de ciência política da USP, ex-secretário de Imprensa da Presidência (2003-2007). É autor de “O Lulismo em Crise”.

Da FSP