Bolsonaro e sua tropa ignoram o que é trabalho infantil
No sábado (6), após a enxurrada de críticas a declarações do presidente Jair Bolsonaro sobre o trabalho infantil, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) pediu a seguidores que contassem experiências de trabalho quando crianças.
Em poucas horas, recebeu, nas palavras de uma seguidora, “mais de 500 estórias emocionantes”. Até de personalidades, como o juiz Marcelo Bretas, que contou ter começado a trabalhar aos 12 em loja da família.
Boa parte dos relatos seguia o padrão de experiências familiares, sinal de confusão sobre o conceito de trabalho infantil.
O termo foi revisto pela OIT (Organização Internacional do Trabalho) em 2018, sendo restrito a casos em que “interfere nos estudos” e de trabalho “mental, física, social ou moralmente perigoso”.
A organização lista ainda “piores formas de trabalho infantil”, que envolvem escravidão ou prostituição, e “formas arriscadas”, que incluem trabalhos por longas horas, com maquinário ou substâncias perigosas.
A resposta do círculo de Bolsonaro às críticas reforça uma ideia distorcida —que não é exclusividade desse grupo, diga-se— de que experiências individuais podem justificar a formulação de políticas públicas.
Cabem nesse caso a famigerada pergunta “e se fosse a sua filha?” usada em defesa da pena de morte ou da liberação das armas, ou a afirmação de que “ninguém é otário” para entrar em alta velocidade numa curva e, por isso, os radares são desnecessários.
Políticas públicas devem ser formuladas com base em pesquisas e estatísticas, que ajudem a traçar um diagnóstico e acompanhem seus resultados ao longo dos anos.
A última pesquisa do IBGE sobre o tema, com dados de 2015, mostrou que, dos 2,7 milhões de menores de idade que trabalhavam no país, 412 mil tinham entre 5 e 13 anos. Embora o número global tenha caído 19,8% em relação ao ano anterior, houve aumento de 12,3% entre aqueles de 5 a 9 anos.
Em 2016, o IBGE soltou outra pesquisa, mas recebeu críticas devido à metodologia e decidiu rever os anos seguintes à luz da nova definição da OIT.
O instituto espera ter mais detalhes sobre o tipo de trabalho praticado por esse contingente, que ajudarão a identificar o tamanho do problema.
Embora tenha dito, no primeiro momento, que não falaria em descriminalizar o trabalho infantil para não ser “massacrado”, o presidente Bolsonaro recuou e disse que defendeu que “nossos filhos sejam educados para desenvolver a cultura do trabalho desde cedo”.
O filho Eduardo, porém, compartilhou depois uma foto com artistas que iniciaram a carreira quando crianças, reforçando em sua base a confusão sobre o que é exemplo pessoal e o que deve ser considerado no debate sobre políticas públicas.
Da FSP