Bolsonaro prepara novo ataque a direitos trabalhistas

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Foto: Carolina Antunes | PR

A comissão mista da MP (Medida Provisória) da Liberdade Econômica aprovou o parecer do deputado federal Jerônimo Goergen (PP-RS) com mudanças em 36 artigos da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).

Ao todo, foram alterados, reescritos ou inseridos cerca de 90 pontos, entre artigos, incisos e parágrafos. O novo texto recebeu o aval de deputados e senadores da comissão nesta quinta-feira (11).

A MP editada pelo presidente Jair Bolsonaro em 30 de abril institui a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica. A intenção, segundo o governo, é desburocratizar processos para empresas. Não havia citação à CLT.

O texto agora libera o trabalho aos domingos para todas as categorias, afrouxa regras para a composição de Cipa (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes) e aplica regras do direito civil a trabalhadores com altos salários.

Para especialistas em direito do trabalho, está em curso uma minirreforma da CLT.

A tramitação da MP, segundo Noemia Porto, presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), repete os procedimentos da reforma trabalhista do governo Michel Temer(MDB), de 2017.

“Foi o mesmo modus operandi: eram poucos dispositivos, e o número [de mudanças] cresceu”, afirma Porto. Segundo ela, a medida deveria abordar apenas matéria urgente e relevante.

O texto enviado por Bolsonaro tinha 19 artigos. Ao todo, foram apresentadas 301 emendas. Goergen acatou 81 sugestões dos colegas. O texto final ficou com 53 artigos.

As alterações remetem a diversas leis, como a CLT e o Código Civil. Houve acordo para a aprovação do parecer, e apenas três congressistas rejeitaram a matéria.

Otavio Pinto e Silva, professor de direito do trabalho da USP (Universidade de São Paulo) e sócio do escritório Siqueira Castro, destaca o volume de novas regras na CLT.

“É uma minirreforma pela quantidade de dispositivos legais alterados e revogados, até mesmo mexendo em normas que tinham sido alteradas em 2017”, afirma Silva.

O professor de direito do trabalho da FMU Ricardo Calcini aponta para a relevância dos assuntos alterados.

“É praticamente outra reforma trabalhista, claro que não na magnitude da lei 13.467 [reforma trabalhista de Temer]. Mas acaba tratando de pontos muito importantes”, afirma.

À Folha o relator da matéria diz rejeitar as críticas e comemora o resultado dos debates.

“Não concordo que seja uma minirreforma trabalhista. Não mexemos nos direitos trabalhistas. O que estamos tirando é aquilo que ficou faltando na reforma trabalhista [de 2017] e tem de melhorar”, diz.

“Se a Justiça acha que é minirreforma, que bom. Estamos avançando. Estamos dando mais segurança jurídica, e isso tira poder. Gostaria de ter avançado em mais pontos”, afirma o relator.

Entre as mudanças está a que diz que “fica autorizado o trabalho aos domingos e feriados”. Ao menos, um domingo de descanso é assegurado ao trabalhador.

A CLT já prevê exceções para o trabalho aos domingos. Há a possibilidade de autorização em negociação coletiva.

O governo pretendia ampliar essa liberação para 78 setores. “[Agora] Vai valer para todo mundo. Não tem mais essa frescura, como diz o gaúcho”, afirma Goergen.

O deputado participou de live de Bolsonaro no Facebook nesta quinta-feira. Na transmissão ao vivo, ele destaca o potencial de geração de empregos da medida.

Em relação à comissão de prevenção de acidentes, o texto mantém a regra atual, que exige a formação do grupo onde há mais de 20 trabalhadores. Porém, micro e pequenas empresas ficam dispensadas de organizar uma Cipa.

“Há abrandamento das regras com a exclusão de micro e pequenas empresas”, diz Calcini, professor da FMU.

Segundo Silva, da USP, empresas com poucos funcionários também podem ser obrigadas hoje a instituir uma comissão em razão do grau de risco da atividade econômica.

À Folha Goergen diz que atende a uma demanda: “Os setores se queixavam muito porque tinha a estabilidade [de um ano para quem integra Cipa], isso é um absurdo”.

O relator afirma que o texto resulta de negociação com congressistas, setores produtivos, oposição e governo. “Foi uma construção feita a várias mãos”, diz.

Entre as mudanças feitas a pedido da equipe econômica, segundo Goergen, está a criação da carteira de trabalho digital.

CARTEIRA VERDE E AMARELA

O parecer do deputado Jerônimo Goergen (PP-RS) para a MP (Medida Provisória) da Liberdade Econômica diz que trabalhadores que ganham mais de 30 salários mínimos (R$ 29.940) terão o contrato regido pelo direito civil.

São assegurados direitos previstos na Constituição, como férias e 13º salário.

“Me parece a carteira verde e amarela [proposta de campanha de Jair Bolsonaro]. O legislador dá a possibilidade de se negociar diretamente com o empregador cláusulas que vão reger o contrato de trabalho”, diz Ricardo Calcini, professor da FMU.

Otavio Pinto e Silva, professor da USP e sócio do escritório Siqueira Castro, concorda.

“É uma maneira de criar a ideia da verde e amarela, para a qual não há direito do trabalho. As pessoas combinam o que bem entender porque o salario é mais elevado.”

Goergen vê avanço. “Vai valer a regra do contrato.”

Para virar lei, o texto precisa ser aprovado no plenário da Câmara e do Senado até o dia 10 de setembro. Uma MP vale por até 120 dias.

Da FSP