Maior jornal da Espanha explica parceria com Intercept

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foto: reprodução

A partir desta terça, o EL PAÍS publica uma série de reportagens sobre a Operação Lava Jato. Tudo tem como base as mensagens privadas trocadas entre os procuradores e também com o então juiz Sergio Moro que chegaram ao The Intercept. A publicação do material em parceria com o site é de evidente interesse público. À luz dos diálogos, o agora ministro da Justiça e o procurador Deltan Dallagnol se tornam protagonistas de uma trama que revela também as zonas cinzentas do funcionamento do Judiciário, onde as linhas que separam o que é ilegal, imoral e legítimo sob os olhos da Justiça e da opinião pública se confundem. Discutir esses limites e o papel das instituições de controle, como os conselhos da magistratura e do Ministério Público, é crucial para a sociedade. É certo que a maior parte do país está orgulhosa dos passos dados pela Lava Jato, mas também é certo que estamos mergulhados em uma feroz polarização política que só será superada se o combate à corrupção for escorado em uma Justiça equânime e respeitosa do devido processo legal, que assim seja reconhecida.

Na primeira reportagem, analisamos uma faceta crucial do debate: a complexa centralidade do Supremo nacruzada dos procuradores da Lava Jato em Curitiba. As mensagens demonstram como eles elegeram o ministro Gilmar Mendes como alvo a ser, se possível, tirado de cena. Os procuradores se mobilizam para provar a suposta suspeição de Gilmar —algo dentro de suas funções—, mas os diálogos também sugerem algo grave: eles, no mínimo, planejaram usar uma investigação em seu poder para buscar provas contra Gilmar até na Suíça.

Desde logo, a transmutação de Gilmar de aliado tático da Lava Jato (quando das decisões contra o ex-presidente Lula no passado) em inimigo não o franqueia como alvo legítimo dos procuradores de primeira instância de Curitiba. Tampouco o desconforto, inclusive entre respeitados acadêmicos, com a desenvoltura de ministros do Supremo ao manipular prazos processuais e tomar outros passos heterodoxos fornece carta branca. Dois erros não fazem um acerto e só abraçando essa máxima o Brasil pode se livrar de um danoso vale-tudo institucional.

Quanto à discussão sobre a origem das mensagens —analisadas pelo The Intercept, pela Folha, pela Veja e agora pelo EL PAÍS—, o jornal reitera que não paga para conseguir informações sigilosas nem estimula atos criminosos para tal. Não se furta, porém, de apresentar a seus leitores um cabedal de notório interesse jornalístico, independentemente da forma que tenha chegado à imprensa protegido pelo sigilo de fonte.

Desde que o The Intercept passou a publicar as mensagens em 9 de junho, os implicados nelas vêm tentando refutar sua autenticidade e argumentam que são frutos de um roubo criminoso de seus dados. Em primeiro lugar, o EL PAÍS, assim como outros veículos, verificou trechos significativos do material que apontam para sua integralidade. Em segundo lugar, está em curso um inquérito para investigar o roubo de dados das autoridades. À Polícia Federal, Walter Delgatti Neto, detido sob acusação de ser um hacker, disse ter sido a fonte do material que tem sido publicado pelo The Intercept. Disse ainda que não cobrou nada por ele e que o repassou de maneira anônima —o site não comenta suas fontes. Acompanhar os desdobramentos desta investigação é tão importante quanto o olhar pela janela oferecida pelas mensagens do The Intercept.

Como o EL PAÍS disse a seus leitores globais quando decidiu publicar os vazamentos diplomáticos  do Wikileaks, em 2010, os jornais têm muitas obrigações em uma sociedade democrática: responsabilidade, confiabilidade, equilíbrio e compromisso ante os cidadãos. Não estava e não está entre elas proteger os agentes públicos e os poderosos em geral de revelações embaraçosas.

Do El País