Lava Jato do Rio promete se autoinvestigar

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Foto: Pablo Jacob

O empresário Ricardo Siqueira Rodrigues, colaborador premiado que denunciou o esquema de servidores da Receita Federal acusados de extorquir réus da operação Lava-Jato , disse, em entrevista ao GLOBO, que as autoridades “estão decididas a cortar na própria carne para extirpar a corrupção em todas as esferas”. Vítima do esquema, Rodrigues também vê indícios de que os suspeitos sabiam que estavam sendo monitorados. Na semana passada, 14 pessoas foram presas.

Preso em abril de 2018, durante a operação Rizoma, o empresário foi acusado de lavagem de dinheiro, evasão de divisas e corrupção em fundo de pensão de estatais. Confira a entrevista com o delator:

Quando o senhor foi abordado pela primeira vez pelos servidores da Receita, desconfiou que as intenções eram escusas?

Fui abordado em meados de 2018, antes mesmo da primeira intimação formal da Receita Federal. Não tenho dúvidas que todas as tentativas de me intimar a comparecer pessoalmente a Receita tinham o desejo de ameaçar e constranger, jamais o grupo teve em interesse em esclarecer nada.

Qual o seu maior receio após a deflagração da operação?

O maior receio sempre foi a segurança da minha família, mais ainda quando soube do tamanho e complexidade da organização exposta pela operação. Uma organização desse tamanho, com tanta capilaridade e poder dentro das esferas públicas pode inventar e distorcer fatos até conseguir seu objetivo.

A organização criminosa da Receita é maior do que se imagina?

Durante todo o processo de extorsão que sofri, fui constantemente ameaçado pelo grupo. Eles afirmavam que eram atuantes em várias esferas, e esse sempre foi o meu maior receio de eventuais retaliações.

Sabe se eles atuam sozinhos ou se há outros integrantes de outros órgãos?

Acredito que no decorrer das investigações, isso será esclarecido.

O senhor acha que outros empresários sofreram a mesma abordagem?

Tenho certeza que sim. Desde o início foi deixado claro que o grupo atuava há tempos e através de várias pessoas.

Houve algum tipo de situação que sugeriu vazamento nas investigações?

Sim, mas prefiro não me aprofundar sobre um assunto ainda em investigação pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal.

Como o senhor recebeu o depoimento de Alexandre Ferrari sobre o desaparecimento R$ 3,2 bilhões do sistema da Receita? O senhor alguma vez foi intimado sobre esses valores?

É importante entender que havia uma ameaça constante por parte da organização criminosa em aplicar multas e dados de altíssimos valores. Em 1 e 2 de novembro de 2018, recebi em sequência dois termos de intimação citando possíveis fatos que podiam gerar multas imensas. Um deles uma suposta existência de contratos de câmbio no valor de R$ 3,2 bilhões. Um dos auditores presos já havia feito ameaças entre setembro e outubro de que, se não houvesse acordo, eu sofreria essas autuações. Mesmo com minhas considerações que esses fatos não aconteceram, essas intimações foram emitidas dias antes de uma das reuniões que tive com o analista Marcial, e fui muito pressionado a partir delas. Depois que foi anunciada minha condição de colaborador, esse ano, essa acusação desapareceu, o que reforça a ideia de que sempre foi uma mentira plantada.

Qual foi a sua maior motivação para colaborar com as autoridades da Lava-Jato?

Minha motivação foi de expor uma estrutura de extorsão organizada em um dos órgãos mais importantes para a própria Lava-Jato e me colocar a disposição da PF e do MPF para ajudá-los a fazer justiça.

Tudo o que foi noticiado é integral ao que ocorreu, ou tem algo mais que não foi objeto da operação ou ainda não apareceu?

Tudo que foi narrado até agora foi o que ocorreu. A PF e o MPF tem uma estratégia de investigação própria e não posso me manifestar sobre fatos ou pessoas ainda em sigilo.

O que o senhor pode dizer sobre o seu nome citado na Operação Rizoma?

Minha atuação na Operação Rizoma será plenamente esclarecida pela instrução processual em andamento na 12ª Vara Federal de Brasília, e confio plenamente que ao fim prevalecerá a verdade.

O senhor também é colaborador na Circus Maximus, quando o senhor começou a negociar um acordo de colaboração ?

A proposta foi em data posterior aos fatos dessa operação na RFB e não recebi qualquer beneficio em relação a minha participação nessa ação controlada. Desde o inicio o objetivo de todos — meu, do MPF, PF e corregedoria da RFB — foi de fazer justiça.

O senhor tem alguma consideração a fazer?

Essa operação mostra que as autoridades estão decididas a cortar na própria carne para extirpar a corrupção em todas as esferas, que não só de acordos de colaboração vive a Justiça. Cabe ao cidadão denunciar e combater do isso com o apoio das instituições.

De O Globo