Adriano Machado/Reuters

Pré-sal vira moeda de troca de político corrupto

Todos os posts, Últimas notícias
Adriano Machado/Reuters
Adriano Machado/Reuters

Política é justamente o instrumento pensado para (tentar) conciliar interesses. Não adianta brigar com os fatos: mesmo quando o interesse comum se pronuncia, os interesses particulares gritam. E, então, é necessário saber articular um ao outro; estabelecer uma ordem de prioridades e fluxos de tempo para que cada interesse possa se estabelecer.

Enfim, buscar acordos e ou consensos. É a arte da política.

Outra possibilidade é a persuasão por intermédio da opinião pública. Mobilizar as pessoas, faze-las compreender e agir em razão da importância do que está em jogo. Agitar o debate e vencê-lo. Atropelar interesses e constranger adversários por meio da imposição de uma liderança política capaz de sintonizar o país com legítimos interesses.

Membros do governo têm se equivocado com a aprovação, pelo Congresso, de medidas de interesse do Poder Executivo. A rápida e até surpreende tetramitação da reforma da Previdência na Câmara foi exemplo disto. Na narrativa do governo, ela se deu em virtude de sua força e fascínio; vestem-se com o manto do autoengano, quando, na verdade, o que se aprovou foi apesar e a despeito do Governo.

A reforma andou entre os deputados porque uma nova elite tem conseguido impor a sua direção, se estabelecer como liderança.

Seu principal nome, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, em que pese os ataques sofridos nas redes sociais do bolsonarismo, mirou a reforma como um objetivo seu, de seu grupo e dos setores econômicos com que mantém interlocução e foi bem sucedido. Articulou com seus pares, construiu um bloco de poder, persuadiu e entregou o que foi possível de uma reforma cujo processo será sempre incremental, feito aos poucos.

O fato é que, até o momento, o poder Executivo não dispõe de nenhum dos recursos da política democrática: a articulação e a persuasão. Há clara incapacidade de coordenar e dirigir os diversos e naturais interesses políticos. Isto se manifesta em impasses cotidianos nas negociações entre o governo e o Legislativo e, normalmente, tem se dado com vitória do Parlamento, que tem ganho autonomia inédita na história recente do país.

Desta vez, também no Senado, interesses contraditórios se chocam: o governo pretende aprovar a reforma como veio da Câmara. Mas, interesses paralelos se impõem. Em véspera de ano eleitoral, municípios pleiteiam um quinhão maior dos recursos excedentes do pré-sal. E, por meio de um grupo de senadores, buscam estabelecer uma barganha: esses recursos em troca da aprovação da reforma da Previdência, em segundo turno.

Em qualquer lugar do mundo, a barganha –em maior ou menor grau– faz parte do processo de negociação. Aliás, a própria ideia de negociação pressupõe a barganha. O problema não está aí, mas na reduzida capacidade de articulação e construção de consensos, de se antecipar fatos –de resto previsíveis–  e estabelecer processos capazes de conciliar interesses ou, por outro, lado, constrange-los.

Nisto, o governo do presidente Jair Bolsonaro tem sido um vazio.

Seu eleitorado e setores do mercado –na maioria das vezes, despolitizados– tendem a tratar o conflito como imoral. Claro que o cuidado com a qualidade e o destino dos gastos públicos tem que ser discutido e, por precaução, definido em lei. E pode-se, sim, considerar que diante das circunstâncias fiscais este não seria o momento mais oportuno para partilhar recursos.

Mas, o problema não está aqui.

A maior dificuldade reside na exiguidade de lideranças políticas com capacidade de articulação e persuasão, com habilidade até para constranger interesses, fazendo sua vontade. Isto, naturalmente, não pode depender de um único líder –seja o presidente da Casa Legislativa ou de uma liderança (abalada) do governo.

Em momentos assim, sente-se falta de uma elite política ativa e, naturalmente, da liderança –na direção correta e na forma sensata– de um presidente da República talhado para isto.

De FSP