JOAQUIN SARMIENTO / AFP

América Latina: Brasil e Venezuela ‘puxam’ pobreza

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A Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe ( Cepal ) alertou nesta quinta-feira para retrocessos nos esforços para a redução da pobreza e da desigualdade na região, com riscos para o desenvolvimento social e político. A previsão é de que o número de pobres e miseráveis chegue a 191 milhões ao final de 2019, 6 milhões a mais do que em 2018, especialmente por causa da situação da Venezuela e do Brasil .

No relatório “Panorama Social da América Latina 2019”, lançado nesta terça-feira em Santiago, a Cepal aponta que a tendência de queda no ritmo de redução da desigualdade começou em 2015, após um longo período de avanços consideráveis, notadamente entre 2002 e 2014, intervalo que coincidiu com a alta no mercado internacional dos preços das commodities que a região exporta..

— Por quase uma década, a Comissão Econômica para a América Latina e Caribe pôs a igualdade como fundamento de desenvolvimento. Hoje constatamos novamente a urgência de avançar na construção de um Estado de bem-estar social, baseado em direitos e igualdade, que deem a seus cidadãos acesso a sistemas integrais e universais de proteção social e a bens públicos essenciais, como saúde e educação de qualidade, saúde e transporte. O chamado é para construir pactos sociais para a igualdade — disse a secretária executiva da organização, Alicia Bárcena.

Em suas páginas, o relatório voltou a destacar a América Latina como a região mais desigual do planeta, um cenário que foi mantido mesmo na época de maior crescimento e piorou com a deterioração das condições econômicas. Um exemplo disso é o próprio Brasil, onde, em 2002, o índice de Gini, que mede a desigualdade social, era de 0,579 (quanto mais perto de 1, mais desigual a nação), passando a 0,514 em 2014, mas registrando nova alta e chegando a 0,540 em 2018. Hoje, o Brasil é o país mais desigual da região e um dos poucos, ao lado de Argentina e Equador , onde o índice de Gini teve alta. Por outro lado, a Bolívia, que em 2002 era a nação mais desigual da América Latina , com índice de Gini de 0,612, viu o índice despencar para 0,438 em 2018.

Contudo, a própria Cepal alerta que a desigualdade é bem maior se forem levados em consideração outros indicadores além da renda declarada nas pesquisas domiciliares, como as informações das declarações de imposto de renda, que leva em conta, por exemplo, investimentos financeiros.

Usando essa fórmula ampliada, o índice de desigualdade no Brasil em 2014, que foi nominalmente de 0,514, passaria a 0,607, o que põe país em uma faixa de desigualdade extrema. Um outro exemplo diz respeito à participação do 1% mais rico: pela pesquisa que leva em conta apenas a renda declarada, essa faixa fica com 9,1% da riqueza nacional no Brasil. Se forem levados em consideração os dados tributários, o número passaria para 27,5% No Chile , a riqueza detida pelo 1% passa de 7,5% para 26,5% se incluídos ativos financeiros.

Para Alicia Bárcenas, a redução da desigualdade é crucial para cumprir as metas da Agenda 2030, que prevê a eliminação da fome e da pobreza.

— É necessário crescer para igualar e igualar para crescer. A superação da pobreza na região não exige apenas crescimento econômico, ela deve estar acompanhada por políticas fiscais ativas e de distribuição de renda — afirmou. — O chamado é para construir pactos sociais rumo à igualdade.

Aumento da pobreza

Outro ponto destacado pelo relatório é a pobreza. Os números retratam uma queda sensível ocorrida entre 2002 e 2017, quando o percentual de pobres passou de 70,9% para 55,9% da população regional, com crescimento das pessoas com renda considerada média (26,9% para 41,1%).

Porém, desde 2015 o ritmo de redução da pobreza vem caindo de forma constante. Segundo a Cepal, naquele ano 30,1% da América Latina viviam abaixo da linha da pobreza, ou 174 milhões de pessoas, e 10,7% delas em situação de extrema pobreza (52 milhões de pessoas). Para este ano, a previsão é sombria: 191 milhões de pessoas abaixo da linha da pobreza, das quais 72 milhões delas em situação extrema, comparadas a 185 milhões de pessoas nessas condições em 2018.

O relatório mostra que esse aumento pode ser creditado em especial a dois países: Venezuela e Brasil, com os demais registrando queda no número de pessoas em situação de pobreza, muito embora a redução venha sendo menor do que no início da década. Os mais atingidos são as crianças, adolescentes, mulheres, indígenas e afrodescendentes, além dos moradores em áreas rurais e os desempregados. No caso brasileiro, o aumento da pobreza se deu especialmente pela queda na renda das famílias nos últimos anos. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), 6,5% da população são considerados miseráveis, com renda diária inferior a US$ 1,9, o que corresponde a 13,5 milhões de pessoas.

A Cepal pede, ainda, políticas para a imigração que incidam sobre as causas que levam as pessoas a saírem de seus países em busca de melhores condições de vida. Entre 2010 e 2019, o número de imigrantes na região passou de 30 milhões para 40,5 milhões , 15% do total mundial, em grande parte por causa do colapso econômico e social venezuelano, mas também por causa da emigração de centro-americanos. A maior parte dos imigrantes (70%) se movimentou dentro da América Latina. Eles também causam impacto financeiro em seus países de origem, através dos envios regulares de dinheiro, ajudando a reduzir de forma substancial os índices de pobreza.

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