Bolsonaro teme derrota no código de trânsito

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Foto: Jorge William/Agência O Globo

Depois de o relator na Câmara apresentar parecer com alterações nos principais pontos do projeto do governo que flexibiliza regras do Código de Trânsito Brasileiro , o presidente Jair Bolsonaro passou a atuar para tentar evitar uma derrota no Congresso. Ele disse ao GLOBO que pediu ao deputado federal Juscelino Filho (DEM-MA) que retome a proposta inicial, que ganhou 101 emendas, pelo menos na “alma do projeto”. A matéria tramita em uma comissão especial.

— Falei rapidamente com o relator, se fosse possível, para ele voltar à proposta original. Não sei qual vai ser a proposta dele — afirmou Bolsonaro, em áudio enviado à reportagem na noite de quarta-feira.

O relator confirmou a conversa com o presidente e disse estar finalizando agora uma nova versão do texto. Após apresentar seu parecer, no último dia 29, ele recebeu quase 90 sugestões de emendas. Segundo Juscelino Filho, Bolsonaro expôs “o que era prioritário para ele”.

— A gente está vendo o que é possível construir — comentou, na noite de quarta. A previsão é que ele finalize o novo parecer nesta quinta.

No seu primeiro relatório, o aumento de 20 para 40 no limite de pontos necessários para que ocorra a suspensão do direito de dirigir do condutor foi substituído por uma escala com três limites de pontuação: com 20 pontos, se houver duas ou mais infrações gravíssimas; 30, com apenas uma infração gravíssima; ou 40, sem nenhuma infração gravíssima. A justificativa foi manter o objetivo do texto original de tornar o sistema mais operacional, sem descuidar da segurança.

A proposta de ampliação de cinco para 10 anos no prazo para renovação da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) para condutores com até 65 anos, e de três para seis anos para quem estiver acima dessa idade, também sofreu modificação. O parecer estabelece um escalonamento, iniciado com 10 anos para renovação de quem tiver até 40 anos de idade, com exceção dos motoristas profissionais das categorias C, D e E. Para estes o prazo será de cinco anos, assim como os condutores de 40 a 70 anos. A partir desta marca, a validade será de três anos.

As propostas alteradas foram justamente os itens considerados como a “alma do projeto” por Bolsonaro.

– O que eu vi no projeto [no novo parecer]? A questão da data de validade da carteira, o relator botou até 45 anos. A partir de 45, cinco anos de validade. A partir de 65, três anos. Isso aí não atende. Primeira coisa: um cara com 46 anos de idade está velho, pode ter problemas graves de saúde? Não justifica – comentou o presidente.

Ele reclamou ainda da proposta do número de pontos necessários para a suspensão da CNH.

– Ele botou também lá que não pode ter duas infrações graves ou gravíssimas. Algo parecido, né? Olha, você já deve ser motorista e deve ter sido multado grave ou gravíssimo e sabe que não houve uma má fé da tua vontade, avançar o sinal. Muitas vezes está desregulado ali — lógico, maldosamente — o pardal e multa você – afirmou Bolsonaro.

O presidente citou como exemplo, para justificar, um condutor que dirige a 40 km/h na rodovia Rio-Santos e, se passa a 50 km/h, recebe multa gravíssima. Para ele, “quem vive no volante”, como motoristas de táxi, Uber, caminhão, ônibus ou van, sabe que corre o risco seríssimo de completar o ano com mais de 20 pontos na carteira.

— E não quer dizer que com isso daí nós estamos estimulando ou desestimulando o cara a ter mais zelo em dirigir — defendeu.

Ele reclamou também do número de emendas incorporadas pelo relator e disse ter pedido ao ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Jorge Oliveira, que analisasse o texto, que praticamente triplicou em tamanho.

— Cento e uma emendas. Fizeram um novo Código de Trânsito — reclamou.

Ainda de acordo com Bolsonaro, havia um acerto com presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para votar o projeto nesta semana ou na próxima, mas diante do parecer, sinalizou que pode haver atraso.

— Agora como está o projeto, sem conversar, para enxugar, esse novo código nacional de trânsito, fica difícil a gente dar essa boa notícia à população dos 10 anos na carteira e dos 40 pontos — declarou.

Procurado pelo GLOBO, Maia disse não acreditar que há acordo para votar o projeto na semana que vem.

Já o presidente da comissão especial que analisa o projeto, Luiz Carlos Motta (PL-SP), disse deverá convocar nesta quinta, para a semana que vem, a reunião para votar o parecer.

O colegiado conta com 34 integrantes e analisa a proposta de forma conclusiva. Se o projeto for aprovado, portanto, poderá seguirá diretamente para o Senado. A não ser que haja recurso para levar o texto à votação no plenário da Câmara.

No polêmico caso das cadeirinhas, por exemplo, o relator apontou que o projeto do governo “claramente retroage ao estabelecer que o descumprimento dessa obrigatoriedade seja punido apenas com advertência por escrito”.

O parecer propôs então que os dispositivos de retenção sejam obrigatórios para crianças de até 10 anos de idade ou que atinjam 1 metro e 45 centímetros de altura e mantém a penalidade hoje prevista no CTB para o descumprimento dessa obrigatoriedade: multa correspondente a infração gravíssima.

Alvo de críticas nas reuniões da comissão e rechaçada por parlamentares, a proposta de acabar com a exigência do exame toxicológica que hoje é aplicada a motoristas profissionais saiu do texto. O substitutivo diz que condutores das categorias C, D e E que exercem atividade remunerada em veículo “deverão comprovar resultado negativo em exame toxicológico para a obtenção e renovação” da CNH. E garante o direito de contraprova e de recurso administrativo, sem efeito suspensivo, no caso de resultado positivo para o exame.

Na justificativa para manter a obrigatoriedade, o deputado apontou que, a partir da medida, observou-se redução do número de acidentes envolvendo ônibus e caminhões em rodovias federais. “Por fim, enquanto não se regulamenta outro tipo de instrumento ou equipamento para fiscalizar o uso de substâncias psicoativas por condutores, não se pode prescindir dos exames em vigor”, complementou.

Dentre as medidas que não estavam previstas no texto de junho e foram incluídas no substitutivo está a criação do Registro Nacional Positivo de Condutores (RNPC), em que deverão constar os dados dos condutores que não cometeram infração de trânsito sujeita a pontuação, nos últimos doze meses. Com previsão de atualização mensal, a abertura do cadastro requer autorização prévia e expressa do potencial cadastrado.

“Com esse cadastro, esperamos estimular a condução responsável, premiando os bons condutores. Para isso estamos propondo sorteio anual do valor correspondente a 1% do montante arrecadado pelo Fundo Nacional de Segurança e Educação de Trânsito (Funset) aos condutores cadastrados. Também estamos possibilitando aos entes federados a utilização do cadastro positivo para conceder benefícios fiscais e tarifários. Espera-se, ainda, que as seguradoras de veículos possam utilizar o referido banco de dados para conceder desconto aos cadastrados na contratação dos seguros”, explica o relatório.

O Globo