Rede mundial de jornalistas denunciará mudanças climáticas

Todos os posts, Últimas notícias

O fato mais importante do jornalismo ambiental de 2019 foi a formação de uma rede que inclui 390 órgãos de imprensa, com uma audiência superior a um bilhão de pessoas, para compartilhar e difundir informações sobre a crise climática, a Covering Climate Now. É notável a pluralidade de posições políticas de seus componentes. Fazem parte da rede a Bloomberg, a France Press e a Reuters, mas também The Guardian e Al Jazeera, além da Nature, da Scientific American e de dezenas de podcasts, publicações locais, rádios e TVs. Não só as opiniões editoriais destes órgãos são muito diferentes, mas também seus estilos. The Guardian, por exemplo, informa seus leitores sobre o nível global de concentração de gases de efeito estufa na atmosfera junto com seus boletins meteorológicos.

Mas será que uma rede tão poderosa não corre o risco de se converter em expressão de pensamento único, abafando as diferenças de abordagem nos temas ambientais? A resposta a essa pergunta passa por uma constatação elementar: não há, na comunidade científica global, duas posições quanto à existência da crise climática e de sua origem antrópica. O negacionismo climático não encontra qualquer respaldo científico, ou seja, seus adeptos não publicam nem são citados em nenhuma revista internacional relevante sobre o tema. Dizer que há duas vertentes sobre o tema (os que acreditam e os que não acreditam nas mudanças climáticas) é o mesmo que afirmar existirem duas posições sobre a forma da Terra, plana ou esférica.

É claro que isso não compromete a necessária diversidade dos debates em torno dos temas abordados pelo jornalismo ambiental: existem chances de que a elevação da temperatura global média se mantenha no limite de dois graus, como preconizam as Nações Unidas, ou já são incontornáveis os cenários que anteveem catástrofes cada vez mais frequentes? O sistema financeiro global pode dar uma contribuição construtiva para a emergência de uma infraestrutura verde? Qual a natureza dos movimentos sociais contra a crise climática? Como diferentes setores da sociedade (governos, empresas, academia, ONGs) encaram a crise climática e suas perspectivas de solução? Quais os impactos da crise climática sobre ecossistemas decisivos para a vida na Terra como os Oceanos e os solos? De que maneira nossos modelos de produção e consumo interferem sobre mudanças climáticas?

Cada uma destas perguntas é abordada a partir de pressupostos, de teorias, de hipóteses e de dados que variam enormemente. Isso é um traço salutar não só da ciência, mas também do jornalismo. A dúvida e a crítica são o oxigênio das sociedades democráticas. Mas, para que não sejam a antecâmara do cinismo e da distopia, a dúvida e a crítica devem se apoiar no que de melhor a ciência produz e não nos preconceitos que derivam da brutalidade e da ignorância.

Estadão.