Fachin e PGR se desentendem sobre delação de Cabral

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Foto: Reprodução

O relator da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Edson Fachin, homologou ontem a delação premiada firmada entre o ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral e a Polícia Federal (PF).

A medida desagradou o procurador-geral da República, Augusto Aras – ele havia se manifestado contra o acordo anteriormente e, agora, deve recorrer à Corte para anular a sua validação.

Preso desde 2016, Cabral tentou inicialmente negociar a delação com o Ministério Público Federal, mas as tratativas não prosperaram. Na visão dos procuradores, o líder de uma organização criminosa – como consideram que o emedebista seja – não tem direito a acordo. Além disso, o entendimento é o de que ele teria pouco a acrescentar às apurações já realizadas pelos investigadores de forma independente.

Com a PF, legitimada pelo próprio Supremo a firmar acordos de colaboração, as negociações acabaram dando certo – mas as cláusulas sequer preveem pena mínima para o ex-governador, conforme costuma ocorrer com o Ministério Público.

Cabral foi condenado 13 vezes pela Justiça Federal do Rio. Somadas, as penas estabelecidas ultrapassam 282 anos de detenção. Ele ainda responde a quase 30 ações penais por esquemas envolvendo propina de empresários, caixa dois, repasses a aliados e acordos espúrios com políticos e autoridades.

Os registros dos depoimentos do ex-governador permanecem em sigilo e devem ser encaminhados à PGR, a quem cabe decidir sobre as linhas de investigação mais apropriadas.

O problema é que Aras, segundo apurou o Valor, considera que o material entregue pela PF ao Supremo não justifica a concessão de qualquer benefício a Cabral. Um dos argumentos do procurador-geral é o de que os R$ 380 milhões que o ex-governador promete devolver ao Estado estão inclusive bloqueados.

A delação foi homologada no Supremo porque os relatos de Cabral envolvem pessoas com prerrogativa de foro, como parlamentares do Congresso Nacional e ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

A validação por Fachin dá fôlego aos planos do ex-governador de tentar obter liberdade, a partir da compreensão de que, na condição de colaborador da Justiça, ele não agiria para atrapalhar as investigações, nem cometeria novos crimes. Essa, no entanto, não é a visão dos procuradores, para quem Cabral ainda representa risco, já que era o chefe da organização criminosa. Questionada, sua defesa preferiu não se manifestar.

Cabral vem “cavando” a sua delação premiada pelo menos desde 2018, quando mudou de postura e passou a reconhecer sua participação nos ilícitos. Admitiu “promiscuidade” com empresários nas arrecadações de campanha e disse ter sido tomado pela “soberba” do poder.

Apesar da homologação de Fachin, delações fechadas com a PF não são unanimidade no Supremo. Em dezembro, ao Valor, o ministro Gilmar Mendes criticou a fragilidade desses acordos – “muita coisa de ‘ouvi dizer’” – e defendeu que a Corte eventualmente reavalie a legitimidade da corporação para firmá-los.

Valor Econômico