Socialista pode virar presidente dos EUA

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Foto: TIMOTHY A. CLARY / AFP

O senador social-democrata Bernie Sanders, de Vermont, venceu a primária democrata de New Hampshire na noite de terça-feira, consolidando sua liderança e o apoio da ala esquerda dos eleitores democratas após seu segundo bom resultado nas duas prévias eleitorais que ocorreram nas últimas duas semanas.

Sanders ficou à frente de dois rivais centristas, o ex-prefeito de South Bend, Indiana, Pete Buttigieg, e a senadora Amy Klobuchar, de Minnesota. A também senadora Elizabeth Warren, de Massachusetts, e o ex-vice-presidente Joe Biden ocuparam, respectivamente, o quarto e o quinto lugar.

Até agora, apenas uma pequena fração do total de delegados que participarão da Convenção Nacional Democrata, em julho, foi alocada. Mesmo longe da definição de quem será o adversário do presidente Donald Trump em 3 de novembro, o que os resultados da noite de terça-feira significam para a corrida daqui para frente? Entenda.

Sanders conquistou o maior número de votos em Iowa, mesmo que tenha perdido por pouco a batalha dos delegados no estado. Ele venceu a primária de New Hampshire. Seu apoio entre as minoriais étnicas aumentou nas pesquisas, enquanto seu principal concorrente nesses setores do eleitorado, Biden, vem encolhendo. Ele ascendeu à liderança em algumas pesquisas nacionais. E ele está levantando mais dinheiro — e tem mais dinheiro — do que qualquer um de seus rivais que não são bilionários. Assim, conheça o novo líder das primárias democratas de 2020.

Após duas primárias, Sanders está em uma posição indiscutivelmente invejável. Ainda assim, há ressalvas: sua vitória em New Hampshire e quase vitória em Iowa vieram com uma parcela historicamente baixa do voto geral. Ele levou New Hampshire com menos de 27% dos votos, o que seria o menor percentual de todos os tempos para um vencedor. Em Iowa, sua taxa de votos foi de tamanho semelhante.

Mas vencer é vencer, e a ala centrista das primárias democratas está mais dividida do que nunca — para a grande vantagem de Sanders.

Buttigieg terminou entre os dois primeiros em Iowa e New Hampshire. Klobuchar surpreendeu com o terceiro lugar em New Hampshire. Nenhum desses candidatos, contudo, demonstrou ter qualquer apelo entre os eleitores negros e latinos até agora. E um candidato que o fez, Biden, ocupou os pouco invejáveis quarto e quinto lugares em Iowa e New Hampshire, respectivamente.

Sanders tem outro ponto a seu favor: duas bases eleitorais, uma demográfica e uma ideológica. As pesquisas em New Hampshire mostram que ele tem o apoio de cerca de metade dos eleitores com menos de 30 anos — uma parcela que nenhum outro candidato pode reivindicar em qualquer fatia demográfica — e quase metade dos eleitores mais progressistas.

O próximo passo no calendário é Nevada, um estado cujo caucus pode recompensar candidatos com bases energizadas e com grandes organizações políticas — o que combina particularmente com Sanders.

Este não era o começo que a campanha de Biden havia previsto. Ele ingressou na corrida eleitoral, no ano passado, como o benquisto vice-presidente de dois mandatos de um dos democratas mais populares de todos os tempos, Barack Obama. Biden se beneficiou de pesquisas que o mostravam como o pré-candidato democrata mais forte nas eleições gerais — em um partido singularmente obcecado em derrotar o presidente Trump.

No entanto, nas duas primárias inaugurais, Biden terminou em quarto e quinto. Em New Hampshire, ele não recebeu nem sequer um delegado.

Se vencer é contagioso, perder pode ser uma doença de campanha ainda mais infecciosa. Tira apoio, dinheiro e confiança em uma súbita onda de pânico dos eleitores e doadores. E Biden agora enfrenta mais de duas semanas — um período interminavelmente longo — até a primária que seus consultores dizem há muito tempo ser seu teste de fogo político: a da Carolina do Sul, no dia 29. Diz muito que, quando ele saiu de New Hampshire antes mesmo do encerramento das urnas, ele foi para lá, em vez de Nevada, estado que sediará a próxima primária, no dia 22.

Considerando que as estruturas do establishment democrata devem se mobilizar contra Sanders por medo de seu socialismo democrático, não está mais claro se Biden seria o beneficiado por isso. Buttigieg terminou na sua frente duas vezes, a marca moderada de Klobuchar pegou tração em New Hampshire, e o bilionário Michael Bloomberg, que autofinancia sua campanha, está focado na Superterça, em 3 de março, quando haverá primárias em 14 estados, com uma grande operação publicitária, sendo um refúgio para os democratas mais tradicionais.

Dito isso, a fluidez da corrida não deve ser subestimada. Há poucas semanas, Klobuchar era mais um asterisco do que qualquer outra coisa. Uma única boa performance em um debate a trouxe até aqui, e Biden ainda tem chances de causar uma nova impressão.

O ex-prefeito de South Bend teve outra exibição impressionante em um estado em que quase todo mundo se parece com ele.

O segundo lugar de Buttigieg em New Hampshire e a vitória em Iowa por um delegado darão um grande impulso à sua campanha. A questão agora é o que exatamente acontecerá com essa energia conforme as primárias adentram uma arena mais diversificada.

A campanha de Buttigieg passou meses tentando conquistar minoriais raciais, destacando suas políticas públicas e um punhado de endossos de parlamentares negros. No entanto, nas pesquisas, Buttigieg não demonstra força entre os negros e latinos que compõem uma parcela significativa do eleitorado do Partido Democrata em Nevada e Carolina do Sul, onde as duas primárias seguintes acontecerão. Depois disso, vem a Superterça, uma mistura de grandes e diversos estados, como Califórnia e Texas, além do Sul do país, onde se espera que os negros constituam a maioria dos eleitores democratas.

A equipe de Buttigieg espera que o bom desempenho traga mais vitórias, citando a experiência de Barack Obama na corrida primária de 2008. As próximas semanas testarão se um homem branco pode replicar o sucesso eleitoral do primeiro presidente negro.

Depois de seu terceiro lugar relativamente forte no caucus de Iowa, a campanha de Warren chegou a New Hampshire e fez ajustes mínimos, esperando que a mesma mensagem de união adotada na primária anterior a impulsionasse, já que seus rivais começaram a atirar uns contra os outros. Isso não aconteceu.

O apoio a ela caiu, e ela não ganhou delegados. Agora, Warren enfrenta um calendário potencialmente mais complicado, depois de duas perdas nos dois estados em que mais apostou em fevereiro. Se Biden ainda espera mudar sua sorte na Carolina do Sul, a campanha de Warren não tem um estado semelhante como porto seguro.

Em um longo memorando enviado antes da divulgação dos resultados de terça-feira, a campanha de Warren argumentou que, no campo “fraturado” de 2020, apenas três candidatos estavam em condições de competir seriamente nos estados ricos em delegados que votarão na Superterça: Warren, Sanders e Biden. Poucas horas depois, dois desses candidatos receberam menos de 10% de apoio em New Hampshire (ela e Biden).

As boas notícias: a campanha de Warren já deu largada nas disputas da Superterça, construindo uma equipe de mil pessoas, com a realocação de pessoas que a auxiliaram em Iowa e New Hampshire. As más notícias: sua aposta na organização em nível local e na campanha em comunidades nos dois primeiros estados não rendeu.

As piores notícias: os custos das campanhas apenas aumentam a partir daqui, e os registros mostram que a base online de Warren de pequenos doadores doou muito mais em tempos bons do que nos difíceis.

Klomento? Klobmento?

Amy Klobuchar não se importa particularmente com o que você escreve, desde que os eleitores sintam isso. Ela subiu nas pesquisas de opinião em New Hampshire no momento exato, aproveitando o caos de Iowa e uma forte atuação no debate de sexta-feira à noite para chegar ao terceiro lugar.

Embora a quinta colocação no ranking da semana passada em Iowa não tenha a posto no topo da corrida, sua equipe viu espaço para expandir seu apoio no eleitorado democrata de inclinação independente e economicamente conservador em New Hampshire. Sua campanha orquestrou um energético sprint de seis dias pelo estado, parcialmente financiado por um influxo de US $ 5 milhões em doações recebidas após o debate.

Nos próximos dias, ela planeja transferir funcionários para os estados de Nevada, Carolina do Sul e para os que irão às urnas na Superterça, além de expandir sua equipe. Nesta quarta-feira, ela dará o pontapé inicial em uma campanha publicitária de sete dígitos em Nevada.

Ainda assim, Klobuchar enfrenta uma batalha imediata e difícil. Como Buttigieg, ela mostrou pouca força entre os eleitores negros e latinos nas pesquisas, e os próximos dois estados no calendário das prévias, Nevada e Carolina do Sul, são muito mais diversos, assim como muitos dos que votarão na Superterça.

O Globo