Ataque de Eduardo Bolsonaro à China preocupa governo

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Foto: ADRIANO MACHADO / REUTERS

Em meio a uma crise sem precedentes no país, causada pela pandemia do coronavírus, integrantes do governo, incluindo pessoas próximas ao presidente Jair Bolsonaro, reagiram com perplexidade e preocupação ao embate envolvendo o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e o embaixador chinês no Brasil, Yang Wanming. Uma das avaliações é que, ao abrir fogo contra a China, o filho do presidente da República poderá atrapalhar um intenso esforço diplomático desenvolvido pelo ministro da Saúde, Luiz Mandetta, para que o país asiático forneça equipamentos hospitalares, como respiradores artificiais e máscaras, usados para a prevenção da doença e no tratamento de pessoas internadas em estado grave.

Na quarta-feira, Eduardo Bolsonaro usou uma rede social para acusar a China de ser responsável pela pandemia. Comparou a crise ao acidente nuclear em Chernobyl, na antiga União Soviética. O embaixador repudiou a publicação, exigiu um pedido de desculpas e, em um tom raramente visto no meio diplomático, retuitou uma postagem em que a Embaixada da China disse que o deputado contraiu um “vírus mental” em sua última viagem aos Estados Unidos.

A China é um dos poucos países — talvez o único — que se ofereceu para ajudar o Brasil nessa questão do coronavírus. Essa posição de Pequim é mais do que bem-vinda pelo seguinte motivo: embora o governo brasileiro tenha reduzido a zero as tarifas de importação de luvas, máscaras, termômetros, respiradores artificiais, entre outros itens, 48 nações produtoras proibiram a saída desses equipamentos, preocupadas em proteger seus povos.

De acordo como uma fonte ligada ao Palácio do Planalto, essa atitude do deputado tem a ver com sua aproximação com a extrema direita americana, que também vem acusando agressivamente a China pela pandemia e falando em “vírus chinês”. Isto porque, do ponto de vista das relações entre o Brasil e a China, tal comportamento “não faz qualquer sentido”.

Essa fonte lembrou que o embaixador chinês fez gestões junto a Pequim para que o Brasil furasse a fila de países que estavam por repatriar os seus cidadãos. No mês passado, quando Jair Bolsonaro disse que não teria como retirar os cidadãos brasileiros de Wuhan — cidade completamente isolada em regime de quarentena — e passou por uma saia justa por causa da divulgação de vídeos de brasileiros pedindo socorro, coube ao diplomata convencer as autoridades de seu país para que deixassem que um avião da FAB chegasse antes das aeronaves de outros países para a evacuação.

Presidente da Frente Parlamentar Brasil-China na Câmara, o deputado federal Fausto Pinato (PP-SP) cobra do presidente Jair Bolsonaro uma retratação sobre a declaração de Eduardo Bolsonaro que abriu uma crise diplomática.

— Se o presidente não falar nada e ficar quieto, é porque concorda com o que o o filho dele falou e então deve arcar com as consequências. Mas brigar com o principal parceiro comercial do Brasil num momento desse é loucura. Bolsonaro precisa mostrar se vai agir como um estadista, pensando no interesse do país ou com ideologia extrema e agravar ainda mais a crise do país.

Outra fonte de preocupação parte dos ministérios da Agricultura e da Economia. Logo cedo, a ministra da Agricultura, Teresa Cristina, conversou com outros ministros do governo para uma avaliação do cenário. Na quarta-feira, a ministra havia iniciado um diálogo com a China, que estava interessada em retomar compras de produtos brasileiros excedentes. Essa retomada é importante para ajudar a aquecer a economia do Brasil.

— Estamos aguardando uma resposta do Itamaraty. Tudo vai depender de como a área diplomática vai agir para apagar esse incêndio — disse uma fonte da Agricultura.

Essa fonte lembrou que, em meados do ano passado, quando o Brasil era duramente criticado em todo o mundo pelos incêndios na floresta amazônica, a China foi o primeiro país a defender o governo brasileiro, antes mesmo dos EUA e de Israel. Na época, o número 2 da embaixada chinesa em Brasília, Qu Yuhui, disse que o Brasil é um dos países mais rigorosos em questões ambientais.

A postagem de Eduardo Bolsonaro deixou apreensivo também o núcleo de ministros do Palácio do Planalto. A avaliação interna do momento é que é preciso tomar cautela com os comentários em redes sociais, devido às proporções que essas declarações tomam.

Procurado, o embaixador da China informou que não dará entrevistas. Eduardo Bolsonaro também não se manifestou. O Itamaraty informou que o assunto está sendo examinado. Já o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), pediu desculpas pela publicação do deputado.

O Globo