Bolsonaro não admite que errou

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Foto: Marcos Corrêa/PR

Criticado por sua condução da crise provocada pelo coronavírus no país, o presidente Jair Bolsonaro dobrou ontem a aposta. Falando em uma entrevista coletiva ao lado de oito ministros, todos usando máscaras cirúrgicas, o presidente negou ter errado ao participar no domingo de uma manifestação que teve como alvo principal o Congresso, criticou a imprensa por criar uma “histeria” após esses atos e aproveitou para divulgar um panelaço em seu favor, previsto para acontecer na noite de ontem (ver Panelaço contra presidente é ouvido em várias cidades).

A entrevista ocorreu um dia depois de Bolsonaro ter enviado ao Congresso um pedido de autorização para decretar calamidade pública no país por conta da pandemia, que até ontem havia matado ao menos quatro pessoas. E começou com o anúncio, feito por Bolsonaro, de que o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, também havia contraído a doença (ver também Alcolumbre está contaminado pelo coronavírus). Horas antes, um de seus auxiliares mais próximos também havia testado positivo – o ministro Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).

Bolsonaro, que na semana passada em Miami disse que “a questão do coronavírus não é tudo isso o que a grande mídia propaga”, afirmou que o sinal amarelo do governo acendeu quando os primeiros brasileiros ficaram presos na cidade chinesa de Wuhan, em janeiro. Disse que, a partir dali o governo começou a se preparar para a crise, que, também na Flórida, ele classificou como “fantasia”.

O presidente, então, cutucou o governador do Rio, Wilson Witzel (PSC), seu desafeto.

“Alguns achavam que deveríamos suspender o Carnaval”, disse. “Tivemos o exemplo de um governador que queria proibir os brasileiros de ir à praia. Foi um fracasso e mais pessoas foram à praia.”

E, como se justificasse sua atitude de dar a mão a apoiadores no domingo, quando a epidemia já se espalhava pelo país, Bolsonaro citou a festa de inauguração do canal de notícias CNN, no mesmo dia. E afirmou que, assim como muitos jornalistas que cobrem guerra assumem riscos, ele também assumiu o risco de não abandonar os brasileiros que faziam uma manifestação em seu apoio.

Apesar de ter vários auxiliares e pessoas com quem convive infectados, Bolsonaro negou ter colocado em risco seus fãs, uma vez que seu exame para a doença havia apontado a ausência do vírus.

“A partir do momento que não estou infectado, ao ter contato com quem quer que seja não estou colocando em risco a vida ou a saúde daquela pessoa. Não descumpro qualquer orientação sanitária […]. Como chefe do Executivo, líder maior da nação, tenho que esta lá na frente, junto com meu povo”, disse. “Não se surpreenda se você me vir nos próximos dias entrando num metrô lotado em São Paulo, numa barcaça Rio-Niterói em horário de pico, num ônibus em Belo Horizonte. Não é demagogia ou populismo, é uma demonstração de que estou ao lado do povo na alegria e na tristeza.”

Bolsonaro voltou, então, a dizer que há um “sentimento de histeria” em torno da covid-19. E afirmou que isso começou após a sua participação nos protestos.

“Esse sentimento de histeria passou a acontecer depois do dia 15 de março. A minha obrigação como chefe de Estado é me antecipar a problemas, levar a verdade à população brasileira, mas que essa verdade não ultrapasse o limite do pânico”, afirmou. “Como disse o ministro da Saúde agora há pouco, nós passaremos por isso, já tivemos problemas mais graves no passado que não tiveram essa comoção toda ou repercussão toda por parte da mídia brasileira.”

Presente à coletiva, o presidente substituto da Agência Nacional de Vigilância Santiária (Anvisa), Antonio Barra Torres, recebeu elogios de Bolsonaro. Barra Torres acompanhava Bolsonaro no domingo, quando ele tocou apoiadores no Planalto. Ao apresentar executivo, Bolsonaro disse que sua agência “voltou a ser tudo o que sempre queríamos: ativa e atuante”.

Barra Torres falou antes do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que até a mudança de postura de Bolsonaro, ontem, vinha sendo o maior protagonista no combate à epidemia.

Bolsonaro negou relatos publicados em alguns veículos de imprensa que tenha cobrado do ministro uma postura de mais apoio político. “Repito o que diz o nosso ministro da Saúde, com o qual não tenho nenhum problema com ele, diferentemente do que parte da mídia ainda prega”, disse.

Mandetta, por sua vez, disse que Bolsonaro é o “grande timoneiro desse barco”, como era chamado Mao Tsé-tung, líder da China durante a Revolução Cultural.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou ontem que, ao receber imagens da coletiva do presidente Jair Bolsonaro e dos ministros, viu o governo mais organizado para trabalhar no combate ao coronavírus. “Hoje, vi uma foto de um governo tentando organizar o enfrentamento à crise. Acho que, talvez pela primeira vez, a gente tenha visto uma foto onde a sociedade possa falar: agora sim começaram se preocupar com a vida das pessoas”, disse Maia. Ele alegou problemas de agenda para não se reunir com Bolsonaro para falar sobre a crise do coronavírus, conforme chegou a ser divulgado por Bolsonaro.

Maia disse estar à disposição do governo, destacou que foca seu trabalho pelo diálogo e cobrou uma pauta que não seja um encontro que tenha como objetivo fazer “uma fotografia”. “O presidente nos convida para conversar, queremos organizar a pauta, saber qual é e com isso poder avançar no diálogo objetivo que construa soluções para os brasileiros. Não apenas uma pauta para fotografia”. Ele afirmou ainda que o importante é que na primeira reunião que aconteça, “seja amanhã ou depois da amanhã”, ele saia dela com pontos organizados, soluções e articulação.

Valor Econômico