Empregados em setores intensivos querem parar

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Foto: Reprodução/TV Anhanguera

Entre o risco de contaminação e o medo de perder o emprego, muitos trabalhadores seguem na ativa, esperando a decisão vir de cima. Bancários, trabalhadores da construção civil, atendentes em call centers e metalúrgicos são algumas categorias que tentam negociar férias coletivas, home office ou simplesmente ir para casa por um tempo com a garantia de que não vão perder a proteção trabalhista.

No setor de telemarketing, o sindicato dos trabalhadores relata não ter havido redução nas equipes nem a criação de escalas para reduzir o número de pessoas nos espaços. Assustados com o risco de contaminação, os trabalhadores do setor foram às ruas.

O protesto de um grupo de operadores de telemarketing em Belo Horizonte, nesta sexta-feira (20), ecoou reivindicações vistas em outras cidades. Os gritos pediam para “parar de uma vez pela saúde”. Os cartazes traziam frases como “fechem os call center”; “não podemos morrer na PA (posto de atendimento)”, “cadê a humanização”.

Vídeos gravados por trabalhadores da Mundiale, na capital mineira, mostram que, mesmo em meio à pandemia, o local de trabalho e refeição segue lotado e falta álcool em gel para ser utilizado na higienização, como é recomendado pela OMS (Organização Mundial da Saúde).

Na tarde de quinta-feira (19), a empresa, que não respondeu ao contato da Folha, avisou que seriam liberados para home office —trabalho remoto em casa— funcionários com mais vendas e que o uso de álcool em gel seria livre.

Segundo uma funcionária que pediu anonimato, por medo de ser demitida, mesmo pessoas em grupo de risco —como idosos, pessoas com problemas respiratórios e grávidas— seguem

trabalhando. Belo Horizonte tem 20 casos confirmados.

“Temos um caso confirmado dentro da empresa, de uma supervisora. A equipe dela está toda com suspeita, e mesmo assim não querem nos liberar. O álcool em gel acaba antes da jornada de trabalho e está complicado”, diz ela.

O protesto de operadores se repetiu em outras cidades do país, como Recife, Curitiba, Goiânia e São Paulo. Também nesta sexta (20), cerca de 50 funcionários da Almaviva do Brasil se manifestaram no centro da capital paulista.

Entre os funcionários há pelo menos dois casos confirmados de infecção pelo coronavírus, que foram afastados. A empresa tem fornecido apenas um desinfetante para ser passado nas mesas de trabalho, dizem os relatos.

A Folha fez várias tentativas de contato com a empresa, mas não teve resposta até a publicação desta reportagem. Os operadores têm média de jornada diária de 6 horas e 20 minutos e, em geral, recebem um salário mínimo.

Em Recife, funcionários da Liq reivindicam que seja feito rodízio, mantendo 50% no local de trabalho por turno, para garantir a distância segura. A empresa diz que tomou todas as providências de limpeza, seguindo recomendações, e que liberou pessoas de grupos de risco e 20% do contingente.

Operadores da Atento Brasil se manifestaram em Goiânia reclamando que o álcool disponibilizado é usado para limpeza e que foram proibidos de usar máscaras. Eles pedem a suspensão das atividades, para evitar aglomerações.

“Passamos de 6 a 8 horas por dia em um ambiente fechado, com ar-condicionado e inúmeras pessoas. Sem contar que a grande maioria depende do transporte público, que ainda hoje está lotado e nos obriga a ter contato físico direto com várias pessoas”, diz uma operadora.

O presidente da Atento, Dimitrius Oliveira, gravou um vídeo dizendo aos funcionários que a empresa segue todos os protocolos e que traz melhores ambientes, para que operadores estejam confortáveis.

Por meio de nota, a empresa diz que prioriza atuação em home office e afastamento remunerado de colaboradores com mais de 60 anos e gestantes. Mas, segundo relatos, trabalhadores com problemas respiratórios estão trabalhando normalmente.

Em Curitiba, operadores da BTCC também reclamaram da falta de álcool em gel, ar-condicionado ligado e janelas fechadas e aglomerações em elevadores e locais de refeição, o que vai contra as recomendações de prevenção.

“A gente chega e a gente tem que limpar nossa PA. Usamos álcool em gel da empresa, quando tem, mas temos que pegar com copo descartável para limpar. Eles estão comunicando que está havendo roubo do álcool e por isso falta”, diz uma trabalhadora.

Os trabalhadores querem que a empresa pare as atividades, já que nem todos possuem internet ou computador para trabalhar em casa.

“Não é essencial fazer uma venda em um momento destes. O cliente não depende disso”, afirma ela.

Após o protesto, janelas foram abertas, mas outras medidas não foram implementadas, segundo trabalhadores. Na página oficial da empresa no Facebook, a BTCC respondeu a um comentário dizendo que em breve compartilharia o plano de ação e que a limpeza era feita no turno da noite.

A ABT (Associação Brasileira de Telesserviços), que representa 18 empresas de contact center, diz que é essencial que o setor siga em operação, já que tem serviços de emergências médias, energia e comunicações.

Os trabalhadores e empresas da construção civil avançam no campo da negociação. Nesta sexta, na capital paulista, conseguiram alterar a convenção coletiva prevendo a redução das jornadas de trabalho para evitar horário de pico no transporte público e turnos diferenciados.

Até que a crise gerada pela pandemia se estabilize, as empresas poderão dar férias coletivas e individuais sem a necessidade de comunicação 30 dias antes.

O novo prazo passa a ser de dois dias, e as férias poderão ter início a qualquer dia da semana.

O acordo antecipa a apresentação da medida que vai flexibilizar a redução de salário e jornada e prevê a possibilidade de redução de até 25% dos salários caso as empresas tenham que paralisar obras para garantir a segurança. Se o governo mandar a proposta anunciada na quarta-feira (18), a redução poderá ser 50%. O trabalhador incluído nesse corte terá direito à estabilidade no emprego.

O Sinduscon-SP (Sindicato da Indústria da Construção de São Paulo) encaminhou às empresas uma série de recomendações para reduzir os risco de contaminação, mas isso não inclui suspensão do trabalho.

O Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo e Mogi das Cruzes encaminhou nesta semana às empresas um documento falando da necessidade de preservar a saúde dos trabalhadores.

Miguel Torres, presidente do sindicato e da Força Sindical, diz que o ofício informou também da disposição dos trabalhadores em discutir medidas de garantia de emprego, mas que a prioridade é a saúde e o enfrentamento da pandemia.

Nos bares e restaurantes, por determinação da prefeitura, o atendimento ao público será interrompido, e a recomendação da Abrasel-SP (Associação de Bares e Restaurantes em São Paulo) é para que os empresários reorganizem as operações e aguardem a consolidação das medidas anunciadas pelo governo.

No início da noite desta sexta, o presidente nacional da Abrasel, Paulo Solmucci, enviou uma mensagem aos associados pedindo paciência aos donos de bares e restaurantes. “Peço a todos que não se precipitem com férias coletivas ou demissões”, diz.

Entre os bancários, a briga agora é pela liberação da obrigação de cumprir metas de vendas de produtos (como seguros) durante a crise. Eles brigam também pela ampliação do teletrabalho hoje somente pessoas dos grupos de risco ou que tiveram contato com casos suspeitos estão trabalhando em casa.

Folhatr