Governo e Congresso brigam por verbas

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Foto: Pedro Ladeira/Folhapress

A crise do coronavírus deve retomar uma disputa do Congresso pelo controle de recursos, semelhante à que marcou a tensão do Legislativo com governo Jair Bolsonaro (sem partido) nos últimos meses.

A proposta de emenda à Constituição que estabelece um regime extraordinário fiscal de contratações exclusivamente para a crise da Covid-19, a PEC do Orçamento de guerra, amplia, na prática, o parlamentarismo branco ao dar ao Congresso a palavra final nas decisões.

A versão do texto ao qual a Folha teve acesso pode sofrer alterações porque o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ainda tem apresentado a PEC aos deputados.

Como se trata de uma emenda à Constituição, precisa dos votos favoráveis de 308, entre os 513 deputados, e de 49, entre os 81 senadores, em dois turnos de votação na Câmara e no Senado.

As sessões nas duas Casas estão sendo realizadas remotamente, pela internet, para evitar que os parlamentares saiam de seus estados durante a pandemia.

A PEC cria o comitê de gestão de crise para, entre outras atribuições, fixar a orientação geral e aprovar as ações que integrarão o escopo do regime emergencial, solicitar informações sobre quaisquer atos e contratos celebrados ou em via de celebração pela União com poder para anulá-los ou ratificá-los.

O colegiado será presidido pelo ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e tem como integrantes com direito a voto os ministros da Economia, Paulo Guedes; da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas; da Agricultura, Tereza Cristina; da Justiça, Sergio Moro; da Controladoria-Geral da União (CGU), Wagner Rosário; e o chefe da AGU (Advocacia-Geral da União), André Mendonça.

Os demais integrantes —secretários estaduais e municipais de Saúde e de Fazenda e membros do Congresso, do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) e do TCU (Tribunal de Contas da União)— não têm poder de voto.

A PEC prevê que o Congresso Nacional poderá sustar qualquer decisão do comitê gestor da crise em caso de “ofensa ao interesse público ou de extrapolação aos limites” da proposta. O Legislativo também se manifestará sobre a pertinência temática dos créditos extraordinários, que não poderão tratar de despesas permanentes.

Eventuais conflitos federativos decorrentes da aplicação da proposta serão resolvidos exclusivamente pelo Poder Judiciário, o que pode atingir questões como, por exemplo, a disputa entre estados e União sobre fechamento de rodovias.

Além disso, durante a vigência da calamidade pública, o Orçamento de guerra está livre da regra de ouro​, que tem como objetivo impedir endividamento para pagar despesas correntes.

Câmara e Senado vinham disputando até o início de março o controle sobre parte do Orçamento 2020 em uma escalada de ataques e acordos. Diante do agravamento da pandemia de coronavírus, as negociações foram suspensas.

Na segunda-feira (23), Maia falou pela primeira vez na proposta de um Orçamento de guerra para conter a crise provocada pelo vírus. O objetivo, argumentou, é aumentar a segurança para que o servidor público possa executar as despesas de ações de controle da pandemia. A ideia é separar o Orçamento fiscal do Orçamento da crise.

Ao dar a palavra final ao Legislativo, a PEC do Orçamento de guerra se encaixa em um contexto em que, cada vez mais, o Congresso reforça seu papel de freio do Executivo.

Nos últimos dias, Bolsonaro foi alvo de críticas de integrantes de diversos partidos por causa de sua atuação diante da crise da Covid-19. Ao minimizar a doença, o presidente da República ficou ainda mais isolado e cresceu entre parlamentares a ideia de deixá-lo de lado, falando sozinho, e tomar para o Parlamento a tomada de decisões.

A atuação independente ultrapassa os salões do Congresso e chega a outras frentes.

Nesta quinta-feira (26), por exemplo, o DEM, partido de três ministros de Bolsonaro —inclusive o da Saúde— e dos presidentes da Câmara e do Senado lançou um protocolo de atuação em comunidades carentes para prefeitos e governadores.

O documento com 19 pontos foi elaborado pelo Instituto Liberdade e Cidadania, braço de formação política do Democratas, e prevê o isolamento de idosos que estiverem em pior situação em hotéis e pousadas, apoio às famílias carentes com cestas básicas e a criação de uma renda informal por 90 dias para famílias que perderam a renda informal.

O material será distribuído aos 27 governadores e, através da CNM (Confederação Nacional de Municípios), aos prefeitos do país.

“Acho que, no momento de crise da magnitude que estamos vivendo, de dimensões apocalípticas, tem que ter uma mobilização de todos”, diz o ex-ministro da Educação do governo Michel Temer, Mendonça Filho, presidente do instituto do DEM.

Folha