Maior jornal inglês chama Bolsonaro de irresponsável

Todos os posts, Últimas notícias

Foto: Pedro Ladeira/Folhapress

Aumentam os riscos ao programa de reforma econômica do Brasil – um dos maiores entre os mercados emergentes. Mas as mudanças importantes estão sendo ameaçadas não pelo coronavírus ou uma falta de apetite político: o principal culpado é o presidente Jair Bolsonaro.

Bolsonaro jogou uma granada no febril mundo político brasileiro ao convocar seus apoiadores para as ruas para uma manifestação nacional no domingo, para apoiá-lo contra os “inimigos do Brasil” – código bolsonarista para políticos. A epidemia de coronavírus o forçou a adiar as grandes manifestações nacionais, mas mesmo assim pequenas demonstrações ocorreram no domingo, com o presidente aparecendo do lado de fora de seu palácio em Brasília para saudar apoiadores.

Um vídeo incendiário convocando a manifestação mostrou Bolsonaro escrevendo com dificuldade após ter sido esfaqueado durante sua campanha eleitoral em 2018, com os dizeres “ele quase morreu por nós”. Mas a tentativa de Bolsonaro de se apresentar como o Cristo Salvador dos últimos dias contra os políticos fariseus, enfureceu o poderoso Congresso brasileiro num momento crucial.

No ano passado os parlamentares concordaram em reduzir pensões insustentáveis para servidores públicos federais, uma mudança muito necessária que frustrou presidentes por duas décadas. Aumentaram as esperanças de que um ímpeto suficiente havia sido criado para a aprovação de outras reformas igualmente importantes, mas amargas.

Estas incluem uma simplificação do labirinto tributário brasileiro – um dos mais complexos do mundo -, assim como leis impondo uma maior disciplina fiscal a Estados e municípios perdulários, a concessão de independência ao Banco Central e o fim de empregos vitalícios no serviço público.

Se totalmente aprovadas, essas medidas seriam a mais ampla reforma estrutural realizada no Brasil desde o retorno à democracia em 1985. A janela para a aprovação dessas medidas sempre foi estreita, uma vez que as atenções dos parlamentares em breve se voltarão para as eleições municipais de outubro. Mas as atitudes de Bolsonaro reduziram ainda mais o tamanho dessa janela.

Os custos financeiros e políticos dos ataques do presidente ao Congresso estão aumentando. Na semana passada, os políticos bloquearam um veto presidencial a um aumento dos benefícios previdenciários que têm um custo potencial de US$ 4 bilhões por ano. Uma briga por outros US$ 6 bilhões em gastos discricionários continua. O pacote de reforma está paralisado. O destino político de Paulo Guedes, o ministro da Economia, está em jogo: sua declaração recente de que “temos apenas 15 semanas para salvar o Brasil” pode ser lida como uma insinuação de sua própria mortalidade política.

Há muito os brasileiros suspeitam que o próprio empenho de Bolsonaro com as reformas propostas pelo seu ministro da Economia é pequeno. O histórico de votos do presidente como congressista sugere um político que atuou dentro das regras clientelistas da política brasileira, e não como um reformista radical. Em seu mais recente confronto, ele parece ter calculado que irritar políticos impopulares é um preço que vale a pena pagar para energizar sua base de apoio.

Mas com o Brasil lutando para sair de uma recessão profunda em meio a graves turbulências no mercado geradas pela epidemia do coronavírus, Bolsonaro dificilmente poderia ter escolhido um momento pior para uma briga. As finanças públicas continuam frágeis mesmo depois da reforma da Previdência: o déficit fiscal geral foi de 5,9% do PIB no ano passado e a dívida do governo estava perto de 76% do PIB.

O presidente do Brasil ainda tem uma chance de conseguir o apoio para reformas amplas que restabeleceriam as finanças públicas, estimulariam os investimentos privados e ofereceriam ao debilitado gigante latino-americano sua melhor esperança de recuperação. Isso é uma tarefa ainda mais urgente com o início da pandemia. Ele deveria aproveitá-la antes que seja tarde.

Valor Econômico