Moradores do Rio deixam capital para fugir da quarentena

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Foto: Fabio Motta/Agência O Globo

Em tempos de pandemia, era de se imaginar que cidades de destino turístico do Rio ficassem vazias. Entretanto, muitos municípios da Serra e Região dos Lagos vêm recebendo famílias que tiveram a condição de realizar o isolamento social em casas mais espaçosas. Nesses casos, as pessoas recorreram não só ao conforto mas também à segurança, se distanciando da capital, epicentro da disseminação do Coronavírus dentro do estado.

Por outro lado, há cidades, como Petrópolis, que, em função do aumento abrupto da população, passou a realizar um controle sanitário na chegada dos distritos, que impedem a entrada de pessoas que não moram ou possuem imóveis no local.

A psicóloga aposentada Mônica Miranda, de 63 anos possui uma casa, com o marido José Carlos Miranda, em Teresópolis. Desde o início, o casal adotou as necessárias medidas preventivas, mas, com a confirmação de que a crise se prolongaria por mais tempo, chegaram a uma conclusão não muito difícil:

— Entre ficar em quarentena no apartamento no Rio e ficar aqui em Teresópolis, com espaço maior, área externa, achamos melhor nos mudar — explicou Mônica, que ainda levou sua mãe, de 86 anos, para a pequena viagem iniciada há uma semana, e só precisou sair do condomínio duas vezes para fazer compras e se vacinar no posto de saúde. — Achei as ruas vazias, a maioria está respeitando a quarentena.

Na serra, eles se sentem mais seguros, já que a extrema maioria dos casos de contaminação está na capital e Região Metropolitana. Além disso, na casa, que fica num condomínio fora da própria zona urbana de Teresópolis, eles têm condição de fazer pequenas caminhadas e ocupar melhor o tempo.

— Minha vida no Rio é bastante movimentada. Apesar de aposentada, faço trabalhos voluntários, aulas de yoga e pilates e participo de grupo de estudos. Também estou fazendo curso de contação de história para atuar nos hospitais. Mesmo podendo caminhar pelo condomínio diariamente, não é fácil ficar isolada. Mas sei que estou num grupo privilegiado, então não posso reclamar. Tem gente vivendo esse momento de forma muito mais difícil em todos os sentidos — explica Mônica, que não tem data para voltar ao Rio.

A plataforma de aluguel de casas Airbnb confirmou o aumento de demanda de hóspedes por estadias em cidades e estados, com “o objetivo de preservar a saúde das pessoas que fazem parte do grupo de maior risco”, mas respondeu que não pode informar número.

E não são só pessoas fora do grupo de risco que estão buscando refúgio fora da capital. O engenheiro Bernardo Spindola, de 27 anos, foi com sua família para a casa que têm em Búzios. A ideia foi dos pais, na semana passada, mas os mais jovens – o irmão mais velho de Spindola e sua esposa estão na casa, junto com o filho recém nascido – também concordaram com a mudança.

— Como a casa fica num condomínio na estrada, no caminho para Búzios, é mais tranquilo, fora da zona urbana. No Rio, o contágio está aumentando rápido e sabíamos que a tendência era aumentar mais, então era o mais seguro sair. Meus pais já são praticamente do grupo de risco. Aqui quase não precisamos sair, é espaçoso, com área externa e tem uma praia que fica dentro do condomínio. Às vezes saio para correr — explica Spíndola, que costuma encontrar a praia vazia.

O distrito mais próximo do condomínio é o chamado Florestinha, onde ainda há pequenos mercados abertos. O engenheiro diz que por lá o entendimento da necessidade de isolamento social ainda não foi totalmente absorvido.

— Uma vez, na fila do mercado, eu mantive uma distância da pessoa ao meu lado, e deu para perceber que ele não entendeu. Às vezes, essas comunidades ainda não incorporaram tanto esses novos hábitos, já que estão distantes do epicentro de contágio — diz Spindola, que também aguarda a evolução do crise para saber quando volta.

Em Búzios, as principais praias foram fechadas pela prefeitura e a cidade adotou medidas de isolamento social e fechamento do comércio.

Em Angra, a família de Maria Lourenço encontrou a possibilidade de manter o hábito de atividades físicas. A segurança e a perspectiva de alongamento da crise nortearam a jovem a levar seus pais para a casa de veraneio na Costa Verde.

— Meus pais têm 65 e 71 anos e são muito ativos, caminham todos os dias. Vi que a OMS recomenda que os mais velhos continuem fazendo exercício se essa já era uma prática. Então, era melhor vir para cá, onde eles têm oportunidade de aproveitar a área externa. Estamos podendo fazer exercícios ao ar livre, tomar sol, caminhar — explica Maria, que não sentiu o condomínio muito cheio nessa crise. — Tem mais gente que o normal nesse período do ano, mas não chega a estar cheio. E as praias estão todos evitando.

Araras, moradores da região incomodados com aumento da população na região
Se ficar em quarentena fora da capital é uma opção positiva para algumas famílias, o efeito nem sempre é bem recebido por moradores locais. Em Araras, distrito de Petrópolis, a polícia chegou a ser chamada, no último dia 20, para fechar um bar que estava com grande aglomeração. Segundo Cristiano Monteiro, que mora no Rio, mas é filho de uma moradora de Araras, há descontentamento na cidade.

— Tem moradores lá revoltados com o excesso de gente, principalmente porque houve uma morte em Petrópolis depois que um casal voltou de viagem do exterior. Inicialmente, os comerciantes estavam respeitando o decreto para fechar, mas quando viu o aumento do público, decidiu reabrir. Araras e Itaipava estão lotadas — explica Monteiro, que diz que desistiu de sair do Rio para não correr o risco de incomodar moradores locais. — Até pensei em ir para a fazenda da minha família em Minas, mas é um lugar muito ermo, sem atendimento médico próximo, então não quis acabar contribuindo com possível risco de contágio.

Por causa do aumento de população, a prefeitura de Petrópolis passou a fazer checagens nas entradas dos distritos, o chamado “controle sanitário”. Quando um veículo com uma placa de fora chega, uma equipe aborda o motorista e realiza um questionário, com perguntas sobre viagens e possíveis contatos com infectados. Se a pessoa não for proprietária de um imóvel na cidade, ela é impedida de entrar, mesmo se tiver alugado uma casa.

Em Araras, a assessoria da prefeitura respondeu que recebeu muitos relatos de problemas, principalmente há duas semanas, no início da quarentena, e que medidas mais efetivas foram tomadas na fiscalização do comércio. Procurada, a Polícia Militar informou que os batalhões estão realizando operações para alertar a população sobre as normas estaduais de combate ao avanço do Coronavírus.

O Globo