Portugal regulariza imigrantes para oferecer acesso à Saúde

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Foto: Rafael Marchante/Reuters

O governo de Portugal publicou decreto no Diário da República que regulariza a situação de permanência no país de todos os imigrantes que estão com pedidos de regularização pendentes no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF).

Enquanto aguardam as suas regularizações, adiadas devido à pandemia, os imigrantes em situação pendente passam a ter acesso aos programas sociais de apoio durante a pandemia do novo coronavírus, além da garantia de atendimento no Serviço Nacional de Saúde (SNS). Também poderão assinar contratos de aluguel de imóveis e de trabalho, abrir contas bancárias e contratar de serviços públicos essenciais.

Um documento que reserve agendamento futuro no SEF, órgão encerrado a partir de agora, ou o recibo com o pedido já realizado e em fase de processamento, ganham status de comprovante oficial perante órgãos públicos.

As organizações de apoio aos imigrantes em Portugal estimam que milhares de pessoas (o SEF não informou número oficial), incluindo brasileiros, estejam à espera de regularização de vistos e fora do alcance do SNS e dos subsídios de emergência implementados devido à pandemia, como o pagamento de €438,81 (R$ 2,4 mil) mensais durante seis meses.

— É grave. As demissões generalizadas já afetam milhares de imigrantes. Aqueles sem visto de residência não podem pedir seguro-desemprego. E quem não está coberto pela Segurança Social só seria protegido quando já não tiver o que comer — disse Flora Silva, presidente da ONG Olho Vivo, de defesa dos direitos humanos.

Em conjunto com mais de uma dezena de associações, a Olho Vivo havia cobrado do governo medidas de proteção para imigrantes em fase de regularização, caso fossem despedidos, contaminados ou tivessem que ficar de quarentena ou em casa com os filhos.

Ao anunciar linha de crédito de € 3 bilhões durante a pandemia, empréstimo que será pago com juros pelas empresas, o governo determinou que o dinheiro seja liberado para aquelas que não demitirem.

O primeiro-ministro António Costa informou que há em curso 28 processos de demissão coletiva que atingem 304 trabalhadores. Sindicatos denunciaram que as empresas fazem pressão para os trabalhadores aceitarem férias forçadas, licenças não-remuneradas e acordos rescisórios lesivos.

Foi o que aconteceu a dezenas de brasileiros em um bar com filiais em Lisboa e no Porto. Em uma videoconferência com o chefe, os brasileiros foram informados que os contratos cessariam imediatamente. A empresa ofereceu um valor de rescisão que foi considerado pelo grupo como inferior ao que teriam direito. Caso não aceitassem, ficariam sem indenização e, pior, sem contrato de trabalho.

A maneira mais usual de um imigrante requisitar visto de residência é tendo um contrato de trabalho ou manifestação de interesse em contratá-lo por parte da empresa, além de contribuir para a Segurança Social. Mas a resposta do SEF pode demorar meses.

— Sem o contrato, eu não poderia pegar subsídio do governo. Teria que apresentá-lo também em uma entrevista com o SEF já marcada para o visto de residência. Eles poderiam alegar que não tenho trabalho e recusar — disse um brasileiro que era funcionário do bar e pediu anonimato.

Mesmo com o decreto, o futuro ainda é incerto e imigrantes começam a procurar ajuda para deixar Portugal. Na última semana, o Programa de Apoio ao Retorno Voluntário e à Reintegração (Árvore), da Organização Internacional para as Migrações (OIM), que viabiliza passagens áreas e ajuda de custo, recebeu 47 chamadas de consulta. Ao todo, foram 190 pedidos efetivos de retorno ao país de origem até meados de março, quase os mesmos 200 de todo o primeiro trimestre de 2019. A maioria é de brasileiros.

— Tem sido uma loucura. Muitos ligam pedindo ajuda, porque o trabalho fechou as portas, o patrão não pagou — explicou Luís Carrasquinho, gestor do programa da OIM, que está parado no momento devido às restrições de voos desde Lisboa.

Michelle do Carmo não descarta voltar ao Brasil, mas não imediatamente. Mineira de Contagem, era garçonete no Porto e o contrato de trabalho seria requisito para solicitar o visto de residência. Com as restrições de circulação, o bar fechou e ela perdeu o trabalho.

— Estou desesperada. Sem contrato de trabalho, sou apenas turista, que foi como cheguei em janeiro. Não tenho visto de residência, nem inscrição nos serviços de saúde. Em último caso, eu e meu marido, que está na mesma situação, voltamos para o Brasil. Mas por agora estamos presos por 12 meses ao contrato de aluguel e sem poder mandar dinheiro para os meus filhos de 13 e 6 anos no Brasil — garantiu Michelle.

O Globo