Reação aos efeitos do coronavírus pauta eleição

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Foto: Reprodução

O isolamento forçado pela pandemia de coronavírus obrigou os pré-candidatos a prefeito em São Paulo a cancelarem eventos e reuniões que, a menos de sete meses da votação de outubro, servem para formar chapa de vereadores, organizar a base eleitoral e discutir projetos de governo.

Para alguns, o assunto eleição saiu da pauta completamente —as ações estão voltadas para o combate ao vírus. A possibilidade de adiamento do pleito, contudo, é vista como remota e difícil de prever hoje.

O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) sinalizou nesta quinta (19) que não deve, por enquanto, mudar o calendário eleitoral. O Ministério da Saúde aponta para aumento dos casos entre abril e junho. A situação só se estabilizaria a partir de julho, mês em que começam as convenções —grandes eventos para oficializar a candidatura.

O PT e o PSOL, que teriam prévias nos próximos dias para escolha de candidatos, suspenderam as votações internas para evitar aglomeração. A medida acaba prorrogando a indefinição no campo de oposição ao atual prefeito Bruno Covas (PSDB), que já anunciou concorrer à reeleição enquanto enfrenta o tratamento de um câncer.

Os petistas estabeleceram o final de abril como limite para definir o candidato, mas o processo de escolha não está determinado. As opções envolvem eleição em um colegiado restrito ou uma decisão da cúpula do partido.

Disputam o ex-deputado Jilmar Tatto, os deputados Alexandre Padilha, Carlos Zarattini e Paulo Teixeira, o vereador Eduardo Suplicy, o ex-vereador Nabil Bonduki, e a militante do movimento negro Kika da Silva.

O PSOL tampouco decidiu como e quando fará a escolha entre a deputada federal Sâmia Bomfim, o deputado estadual Carlos Giannazi e o coordenador do movimento sem-teto Guilherme Boulos.

“O PSOL não está com disposição e não vê sentido em debater opções às prévias porque temos um cenário imprevisível, não sabemos quanto tempo as recomendações de quarentena estarão em vigor”, afirma Sâmia.

A deputada diz que não há clima para fazer disputa política “enquanto a crise tem consumido 100% das nossas preocupações”. Segundo Sâmia, sua atuação virtual tem sido voltada para atender demandas relacionadas à população vulnerável.

Para Boulos, o PSOL vai ter que fazer a discussão eleitoral em algum momento, mas não agora. Ele também diz ter largado a pré-campanha para cobrar soluções contra o vírus na periferia.

“Quem estiver com cabeça em campanha é muito mesquinho. Seria não compreender a gravidade do que está acontecendo”, diz.

A pandemia também atropelou a pré-campanha de Padilha, que é médico e voltou suas aparições na rede para dar orientações sobre o vírus. Na opinião do deputado, a pandemia e a disputa eleitoral são conectadas porque “o enfrentamento à crise mostra a diferença entre projetos que estão em disputa na cidade”.

“A prioridade agora é salvar vidas e proteger a renda e os direitos dos que mais precisam. A crise econômica e sanitária nos obriga a mudar o dia a dia e as agendas, mas explicita quem está do lado da saúde pública”, afirma.

Tatto, que é visto como favorito na disputa petista, diz que a crise exige responsabilidade e cancelou suas visitas a bairros, missas e movimentos sociais.

“Quem tem relação com o povão, como eu, sai prejudicado. Na periferia faz diferença o corpo a corpo”, diz Tatto.

Andrea Matarazzo (PSD) também cancelou a agenda e se isolou. “Eu não gosto do virtual, gosto da cidade real, ir nos lugares, falar com as pessoas, mas a prioridade é outra.”

Matarazzo não tem falado de política nas redes, trocou o assunto por temas amenos e dicas sobre o coronavírus. Crítico de Covas, aproveitou para postar a sugestão ao prefeito de suspender o IPTU de estabelecimentos fechados.

O cientista político Felipe Nunes, professor da UFMG e diretor da Quaest, diz que os candidatos podem usar o tema do coronavírus nas redes para gerar audiência.

“Informando as pessoas de como as coisas estão, mostrando ações de prevenção. Pode ser uma oportunidade para quem souber usar o conteúdo informativo, porque durante a quarentena as pessoas estão disponíveis para acessar conteúdos”, afirma.

Além de provocar mudança de pauta entre os pré-candidatos, a epidemia dificultou a burocracia. Candidatos a vereador da chapa de Arthur do Val (Patriota), o Mamãe Falei, encontraram cartórios eleitorais fechados ao tentarem atualizar seus dados para migrar ao partido. O prazo de filiação termina em 4 de abril e foi mantido pelo TSE.

Do Val minimiza os efeitos do coronavírus na pré-campanha não por ter uma base grande de seguidores, mas por ter o que mostrar. “As pessoas querem resultado. Quem trabalha não precisa se preocupar.”

No PSL, que vai lançar Joice Hasselmann na capital, todos os eventos de pré-candidatos foram cancelados no interior. Para o presidente estadual do partido, deputado Junior Bozzella, a falta da pré-campanha favorece siglas que dominam a máquina pública ou que já têm sua base organizada, o que não é o caso do PSL, nanico que cresceu e rachou com Jair Bolsonaro.

Quanto a Joice, poderá se beneficiar da maior parcela do fundo eleitoral. “O maior tempo de TV e a estrutura do partido podem compensar”, diz Bozzella.

Filipe Sabará (Novo) diz que o isolamento não prejudica porque seu partido já tem chapa montada. “Estou aproveitando o tempo para entender melhor a cidade, falar com experts, focar o plano de governo.”

Ele, que é empreendedor social, diz que abriu um crowdfunding para doar álcool em gel para moradores de rua.

Márcio França (PSB) foi outro que conseguiu definir alianças antes no isolamento. Um dia depois de a pandemia ser declarada, na semana passada, lançou sua pré-candidatura com o apoio do PDT.

O PSDB, de Covas, continua a costurar alianças, enquanto o prefeito, que decidiu se mudar para a prefeitura, anuncia medidas contra o coronavírus.

“Estar no cargo atrapalha, porque ele não vai ter tempo para campanha, está preocupado com a cidade”, diz Fernando Alfredo, presidente do PSDB em São Paulo. A questão da saúde, porém, não preocupa —Covas já recuperou sua imunidade e não está em grupo de risco para o coronavírus.

Nunes afirma que a eleição vai ser também espécie de plebiscito sobre como os prefeitos lidaram com a crise e sua capacidade de resposta para controlar a pandemia.

“Não há culpado pelo vírus, mas os prefeitos serão responsabilizados por conseguir ou não dar respostas efetivas. Os adversários vão criticar quem não der conta do recado. Vai ser a forma de medir eficácia”, diz o professor.

Com as atividades presenciais banidas, a tendência é que a disputa se dê nas redes. “Conseguir alcançar mais gente nesse momento vai ser diferencial. Candidatos que se prepararam nos últimos anos para usar as ferramentas digitais têm mais chances.”

O fato de a pré-campanha ter sido sequestrada pelo confinamento e pela pauta monotemática do coronavírus significa que os candidatos terão apenas o tempo de campanha, a partir de 16 de agosto, para falar à população.

“Prejudica quem não fez o dever de casa até agora e não terá a pré-campanha para refazer imagem, se reposicionar, mostrar entregas”, diz Nunes. Quem é desconhecido também sai perdendo —terá menos tempo para se apresentar à sociedade.

Os pré-candidatos ouvidos pela reportagem acreditam que é cedo para falar em possível adiamento da eleição, mas não consideram isso impossível.

No Congresso, parlamentares já iniciaram um movimento em defesa do adiamento e estudam como isso seria feito por meio de mudanças na legislação.

Folha