Aglomerações nas periferias começam a cobrar preço

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Foto: Rubens Cavallari/Folhapress

Os bairros da periferia de São Paulo lideram o número de mortes confirmadas ou suspeitas de contaminação pelo novo coronavírus. Segundo dados divulgados pela prefeitura da capital paulista, 1.207 óbitos relacionados à Covid-19 foram registrados entre os dias 23 de fevereiro e a última segunda-feira (13) no município.

Do total de mortos, a maioria residia em bairros situados em regiões carentes da cidade. O distrito que teve a maior quantidade de vítimas fatais foi a Brasilândia, na zona norte, com 33 casos. Em seguida estão: Sapopemba (28), Itaquera (27), São Lucas (24), Grajaú, Jaraguá, Freguesia do Ó, Cangaíba e Cidade Tiradentes, com 22 casos em cada um desses locais.

O aumento das mortes na periferia representa uma mudança no mapa do coronavírus na cidade. No início da pandemia, em março, os casos da doença em São Paulo eram concentrados em bairros nobres, como Pinheiros, Jardim Paulista, Itaim Bibi e Perdizes, na zona oeste.

A Secretaria Municipal da Saúde avalia que houve uma migração do vírus para a periferia. Segundo a pasta, no início da pandemia, os casos eram importados. Ou seja, os infectados pegaram a doença no exterior e trouxeram para a cidade. No segundo momento, com a transmissão comunitária, a doença passou a se espalhar dentro do município, chegando até os extremos da capital.

Para a pasta, dois fatores podem explicar a alta de casos na periferia: o descumprimento da quarentena e a dificuldade de manter o isolamento social em moradias geralmente com muitas pessoas. Segundo o prefeito Bruno Covas (PSDB), o aumento dos casos na periferia é resultado da “defasagem habitacional” em São Paulo.

Muito populosas, essas regiões têm moradores de renda mais baixa que, na avaliação da gestão Bruno Covas (PSDB), acabam indo às ruas para conseguir o sustento. Nos últimos dias, foram comuns as filas em frente às agências da Caixa Econômica, com pessoas em busca do auxílio emergencial do governo federal, de R$ 600, ou de informações.

Dados divulgados nesta semana pelo governo estadual gestão João Doria (PSDB) mostram que na capital a taxa de isolamento social está em torno de 50%, quando a meta é de 70% da população em casa.

Para a Secretaria Municipal de Saúde, o avanço da Covid-19 na periferia é preocupante, já que os moradores de bairros mais pobres têm uma dependência maior do sistema público de saúde. Por esse motivo, a pasta afirma ter aumentado o número de leitos destinados a portadores da doença. Dois hospitais de campanha já estão em funcionamento, no estádio do Pacaembu (zona oeste) e no Anhembi (zona norte), e um terceiro deve entrar em operação no início de maio no complexo esportivo do Ibirapuera.

Outra medida foi anunciada nesta quinta-feira (16) pelo secretário estadual da Saúde, José Henrique Germann. O estado irá transformar o AME (Ambulatório Médico de Especialidades) Heliópolis (zona sul) em hospital de campanha para a Covid-19. O local terá 170 leitos, sendo 30 de UTI (Unidade de Terapia Intensiva), e deverá começar a funcionar em 15 dias.

Covas admite que uma das alternativas estudadas é adaptar os CEUs (Centros Educacionais Unificado) para que funcionem como centro de acolhimento de contaminados, para evitar que transmitam a doença para outras pessoas. “O que verificamos é, se for o caso, adaptar os CEUs que estão próximos à periferia para isolamento de pessoas infectadas”, afirmou. Entretanto, o tucano ressaltou que, por enquanto, a prefeitura insistirá no “convencimento” de que as pessoas devem manter o isolamento social.

Médicos especialistas em pandemias confirmam a tendência de migração do novo coronavírus das áreas nobres para a periferia e citam que é mais difícil conter a proliferação da doença em bairros pobres.

O epidemiologista André Ribas de Freitas, professor da faculdade São Leopoldo Mandic, afirma que nas periferias há maior concentração de pessoas nas casas, o que dificulta o isolamento social.

Ele acrescenta que, mesmo fora das moradias, as condições são favoráveis para a transmissão do vírus. “As favelas têm muitas vielas estreitas, por onde as pessoas passam para entrar ou sair de suas casas. É impossível manter dois metros de isolamento nesses locais”, complementa.

Outro ponto mencionado pelo epidemiologista é o fato de que, nas áreas pobres, muitos moradores são trabalhadores informais, cuja renda diminuiu drasticamente ou foi cortada após a quarentena. Segundo ele, muitas dessas pessoas acabaram tendo de voltar para as ruas para tentar garantir algum sustento.

O infectologista Leonardo Weissmann, consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia, aponta um outro motivo que explica o aumento da doença na periferia: a falta de condições sanitárias adequadas. “Nessas regiões, nem sempre se consegue um ambiente adequadamente ventilado. Verifica-se, inclusive, falta de água e sabão para higiene das mãos.”

Na tarde desta quinta, o prefeito Bruno Covas afirmou que, por meio de uma parceria com a Sabesp, estão sendo instaladas pias comunitárias em bairros carentes da cidade, para que a população possa se higienizar corretamente.

Uol