Aras tenta bloquear ações do MPF contra governo

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Foto: Isac Nóbrega/PR

O procurador-geral da República, Augusto Aras, orientou o ministro da Saúde, Luiz Mandetta, a lhe encaminhar, “para exame”, todas as recomendações que tem recebido de outros membros do Ministério Público a respeito de procedimentos a serem adotados pelo órgão durante a crise do novo coronavírus. O gesto de Aras é interpretado como uma desautorização das recomendações, já que Mandetta pode se sentir liberado de cumprir a orientação.

A coluna apurou que o ofício gerou um desconforto entre vários procuradores, que veem um desrespeito de Aras sobre as atribuições dos membros do MPF. Procuradores têm cobrado uma manifestação pública da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República). Para eles, a “revisão” adotada por Aras não é prevista em lei e invade a competência de um procurador.

Desde o início da crise, membros do MPF têm enviado recomendações a órgãos da União e dos Estados sobre políticas públicas no combate à pandemia. O ofício de Aras a Mandetta é datado do dia 8. Dois dias antes, por exemplo, a PFDC (Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão), que funciona no prédio da PGR, havia enviado uma recomendação a Mandetta e ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça) para que tomassem providências a fim de evitar “desaparecidos da pandemia”, ou seja, pessoas que podem morrer pela doença mas a causa da morte e seus túmulos não serem corretamente identificados pelas autoridades sanitárias.

No mesmo dia 8, a PFDC questionou uma medida anunciada no dia anterior pelo Ministério da Saúde, segundo a qual estudava afrouxar a estratégia do isolamento social em determinados municípios a partir do dia 13 de abril. A Procuradoria indagou a Mandetta, por ofício, quais eram os estudos técnicos que apontaram os municípios “onde o número de casos confirmados não tenha impactado em mais de 50% da capacidade instalada existente antes da pandemia”.

Recomendações são enviadas corriqueiramente pelos órgãos do MPF a diversos órgãos públicos, que podem ou não segui-las. Caso as sugestões não sejam observadas, mais adiante o MPF poderá usar esse ponto para reforçar, por exemplo, uma ação de improbidade administrativo contra o gestor público.

No ofício enviado a Mandetta, Aras afirmou ter criado, em 16 de março, um “Gabinete Integrado de Acompanhamento à Epidemia do Coronavírus-19 [sic]”, cuja função é “atuação preventiva, extrajudicial e resolutiva dos ramos do Ministério Público brasileiro no esforço nacional de contenção da epidemia”. O gabinete é presidido por Aras e formado por outros procuradores da sua equipe de trabalho e representantes do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público).

Aras disse ter recebido “a notícia de que recomendações de membros do MPF a respeito do enfrentamento da pandemia vêm sendo dirigidas a diversos órgãos executivos dos Ministérios, cobrando a prática de atos de gestão que se encontram na esfera dos titulares das respectivas pastas”. Assim, disse o procurador-geral, as recomendações deverão ser enviadas ao Gabinete Integrado, “para que proceda ao exame da matéria, preservando-se as atribuições dos órgãos superiores do Ministério Público Federal”.

Aras afirmou ainda que o gabinete se reúne na sede da PGR “e encontra-se disponível para interlocução e auxílio aos órgãos encarregados do enfrentamento à epidemia”.

Procurada pela coluna, a PGR informou nesta terça-feira (14) que o ofício de Aras foi enviado a outros ministros de Estado e que “visa resguardar a competência dos órgãos superiores da PGR e evitar excesso de recomendações, muitas vezes em sentido diferente”. Diz ainda que o CNMP integra o gabinete sobre o novo coronavírus e que “eventual violação irá ao corregedor nacional do CNMP”.

Uol