Conselheiro denuncia aparelhamento da Comissão de Ética do governo

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Foto: Ailton de Freitas / Agência O Globo

O conselheiro Erick Vidigal, integrante da Comissão de Ética Pública da Presidência, divulgou nesta sexta-feira uma carta em que faz uma série de críticas ao presidente do colegiado, Paulo Lucon. Em texto direcionado aos outros integrantes do órgão, Vidigal acusou o colega de não ver “nada de imoral” em integrantes do primeiro escalão do governo federal contratarem empresas com as quais têm relações fora do cargo e usarem aviões da Força Aérea Brasileira (FAB) para transportarem parentes.

O conselheiro também afirmou que vai acionar o Ministério Público e a Justiça para questionar a nomeação do atual presidente do colegiado e para restabelecer “as prerrogativas mínimas necessárias para que um conselheiro possa exercer, com independência, o seu mandato”. Segundo ele, há uma “agenda oculta” interna que “merece preocupação. Vidigal reclamou ainda do comportamento de Lucon em uma sessão recente, em que se negou a julgar em bloco todos os processos referentes ao ministro da Educação, Abraham Weintraub.

“O presidente interino da CEP (Comissão de Ética Pública) não vê nada de imoral em autoridades realizarem despesas públicas que favorecem pessoas contratadas ao mesmo tempo pela administração pública e pela empresa da qual a autoridade é sócia. Não vê nada de imoral na falta de transparência na distribuição dos processos da CEP/PR. Não vê nada de imoral na utilização de jatos para transportar parentes. Aliás, não vê nada de errado em relatar – para arquivar – um processo envolvendo autoridade que viajou para a Europa por convite dele próprio. Tenho curiosidade de saber quantas vidas poderiam ser salvas se o dinheiro gasto com tais viagens pudesse ser usado agora para comprar respiradores para UTIs do SUS”, escreveu Vidigal.

No trecho, sem citar nomes, o conselheiro faz possíveis referências ao chefe da Secretaria de Comunicação da Presidência, Fábio Wanjgarten, cuja empresa mantém contratos com emissoras de televisão que passaram a receber mais verbas publicitárias da Secom em sua gestão; e à ex-advogada-geral da União Grace Mendonça, que foi alvo do colegiado por ter ido com o marido em avião da FAB à Europa, em uma viagem a trabalho. Em ambos os casos, os procedimentos foram arquivados, com o apoio de Lucon, e não chegaram a ser investigados pela Comissão.

No texto, Vidigal também se queixa da diminuição do orçamento do conselho desde o início do governo Jair Bolsonaro e sugere que a situação pela qual o colegiado passa seja levada ao conhecimento da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O conselheiro também ressalta que pediu ao presidente da Comissão que solicitasse para a Polícia Federal uma investigação sobre o vazamento de um voto em um processo envolvendo Weintraub.

“Já fiz proposta de resolução para abrir o sigilo das sessões de julgamento, sigilo obviamente inconstitucional; já pedi que fosse oficiada a Polícia Federal para apurar eventuais interceptações ilegais em meu computador no Palácio do Planalto; já propus a instauração de processos para apurar diversos deslizes éticos cometidos por ministros de Estado. Algumas vezes, a presidência ignorou. Algumas vezes, sugeriu pedidos de vista. Algumas vezes, ponderou para que eu retirasse o pedido. E assim o fiz, na certeza de que, com conversa e foco no bem maior, coisas boas poderiam acontecer. Não aconteceram”.

Vidigal também reclama no documento de não ter sido conduzido à presidência do órgão, o que, para ele, rompe uma tradição do colegiado. De acordo com a carta, o motivo alegado foi a “falta de serenidade” para exercer o comando da comissão.

O Globo