Ex-chefe do Iphan acusa Flavio Bolsonaro

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Foto: Reprodução

A ex-presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) Kátia Bogéa diz ter sido demitida da chefia da instituição após pressões geradas pelo dono das lojas Havan, Luciano Hang, e pelo filho do presidente Jair Bolsonaro, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ). Em reunião ministerial do dia 22 de abril, cujo vídeo foi divulgado após autorização do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello, Bolsonaro fala sobre o Iphan e o empresário.

“Eu fiz a cagada em escolher… não escolher uma pessoa que tivesse também outro perfil. É uma excelente pessoa que tá lá, tá? Mas tinha que ter um outro perfil também. O Iphan para qualquer obra do Brasil, como para a do Luciano Hang. Encontra lá um cocô petrificado de índio, para a obra, pô! Para a obra. O que que tem que fazer? Alguém do Iphan que resolva o assunto, né? E assim nós temos que proceder”, disse.

Em agosto do ano passado, Hang gravou e divulgou um vídeo nas redes sociais reclamando que a obra de uma loja Havan no Rio Grande do Sul estava paralisada porque o Iphan encontrou “fragmentos de pratos”. No local, segundo Kátia, foram encontradas cerâmicas, vestígios arqueológicos de civilizações passadas. Na época, o próprio Iphan divulgou nota dizendo que a paralisação foi recomendada pela empresa de consultoria em arqueologia contratada pela própria Havan.

“Quem paralisou a obra foi o próprio arqueólogo da empresa de arqueologia que ele contratou para acompanhar a obra. O vídeo foi mentiroso, ele vendeu essa mentira para o presidente e o presidente comprou essa mentira dele. Aí, a imagem que o presidente formou na cabeça dele do que seria o Iphan seria de um órgão que estava ali para paralisar obras, impedir o desenvolvimento”, disse Kátia.

Depois disso, outro fato se somou e finalmente resultou em sua demissão, segundo Kátia. Em dezembro, o senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente, participou de um encontro na Bahia com representantes do setor imobiliário. Na época, Katia diz ter sido informada que empresário reclamaram de sua atuação ao senador, falando especificamente de uma portaria publicada dias antes. E menos de uma semana depois do encontro, a ex-presidente do Iphan foi exonerada.

A portaria em questão trazia diretrizes e critérios para intervenção na área do entorno dos conjuntos e bens tombados na região da Barra, em Salvador, após a polêmica envolvendo o edifício La Vue, que envolveram o ex-ministro da Secretaria de Governo Geddel Vieira, no governo de Michel Temer. Na época, o ex-ministro da Cultura e deputado federal Marcelo Calero (Cidadania-RJ) pediu demissão dizendo que havia sofrido pressão de Geddel para que o empreendimento fosse liberado pelo Iphan. Geddel nega.

Katia afirma que ficou sabendo de sua exoneração pelo Diário Oficial da União (DOU), não tendo sido avisada antes ou chamada para auxiliar no processo de transição. A presidência estava sendo ocupada interinamente pelo técnico Robson de Almeida, que ficou no cargo até maio deste ano. No dia 11 deste mês, 19 dias depois da reunião ministerial cujo conteúdo foi divulgado na última sexta-feira, o governo federal nomeou como nova presidente do Iphan a servidora do Ministério do Turismo, Larissa Rodrigues Peixoto Dutra. A nomeação é amplamente questionada por servidores do Iphan e pessoas ligadas a preservação do patrimônio histórico e cultural, pela ausência de experiência por parte da nova presidente.

Para ela, o vídeo da reunião deixa claro o que o governo quer, em especial na fala do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. Ele disse que deveriam aproveitar que a imprensa está com o foco em cima da cobertura da pandemia do novo coronavírus para “passar qualquer mudança infralegal”.

“Enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, porque só fala de covid, e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas. De Iphan, de Ministério da Agricultura, de Ministério do Meio Ambiente”, disse. Sobre isso, Kátia disse: “Eu jamais me submeteria a uma coisa dessas”.

Correio Braziliense