Pandemia paralisa análise de embaixadores no Senado

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Foto: Pedro França/Agência Senado

A pandemia do novo coronavírus mudou a rotina do Senado, que desde o fim de março tem se dedicado quase que de maneira exclusiva à análise de projetos de enfrentamento à crise sanitária. Como consequência da situação excepcional para os parlamentares, o trabalho das comissões permanentes da Casa teve de ser interrompido por tempo indeterminado. Isso impactou em cheio a política internacional do governo federal, que vê uma série de indicações para novos embaixadores travadas na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE).

Por enquanto, ao menos 11 pessoas que já tiveram o aval do presidente Jair Bolsonaro para representar a diplomacia brasileira mundo afora não foram efetivadas (veja quadro). Isso acontece porque, de acordo com a legislação que trata do regime jurídico dos servidores do serviço exterior brasileiro, é necessário que os nomes escolhidos pelo chefe do Executivo sejam sabatinados pelo colegiado de senadores e submetidos à votação no plenário do Senado. Caso recebam mais da metade dos votos favoráveis à indicação, eles podem ter a nomeação confirmada no Diário Oficial da União.

O principal caso envolve Nestor José Forster Junior, escolhido por Bolsonaro em novembro de 2019 para ser o embaixador do Brasil nos Estados Unidos. Ele foi sabatinado na CRE no início de fevereiro deste ano, quando foi aprovado por unanimidade pelos senadores que integram a comissão; o colegiado chegou a pedir urgência para a votação no plenário. Contudo, o tema não foi pautado antes do carnaval e acabou por sair do foco depois do feriado, visto, que àquela altura, o país começava a registrar os primeiros casos de covid-19 e a doença passou a ser prioridade no Senado.

De todo modo, Forster ocupa interinamente o cargo em Washington, como encarregado de negócios, e já acompanhou Bolsonaro em compromissos oficiais nos EUA, como no encontro do presidente com Donald Trump, na Flórida, em março. Em uma situação parecida à do diplomata está Hermano Telles Ribeiro, indicado em julho do ano passado para a embaixada brasileira no Líbano. Ele também foi aprovado por todos os 12 senadores da CRE, mas aguarda o aval da maioria do plenário do Senado para assumir a representação do país em Beirute.

Apesar de o Senado ter implementado um sistema de deliberação remota para seguir trabalhando em meio à pandemia, a tecnologia só serve para encontros no âmbito do plenário da Casa e não foi adequado para garantir o funcionamento das comissões. Isso impede a sabatina de Paulo Roberto Caminha de Castilhos França. Em fevereiro, Bolsonaro o indicou para ser embaixador do Brasil nos Países Baixos.

Outro problema que atrapalha a apreciação dos nomes para as embaixadas é que, tanto na CRE quanto no plenário, a votação é secreta, e, por enquanto, o sistema de deliberação remota do Senado não oferece a possibilidade de sigilo do voto. Devido às limitações e, sobretudo, ao alto risco de contágio da covid-19, o presidente da CRE, Nelsinho Trad (PSD-MS), pediu paciência diante da situação.

“Se a gente insiste e volta a funcionar (presencialmente) e um desses funcionários acaba contraindo essa doença e acaba falecendo, como nós vamos nos sentir diante disso? Então, não dá para brincar, vamos esperar baixar essa onda e, a partir daí, com mais segurança, a gente poder retomar os trabalhos. Infelizmente, nós estamos num momento atípico, as pessoas têm que entender isso e nós estamos tendo que aprender a conviver com essa história”, comentou o senador, em entrevista à Agência Senado.

Por meio da sua assessoria de imprensa, o Ministério das Relações Exteriores informou que “o Itamaraty compreende os motivos que levaram as mesas diretoras do Senado Federal e da Câmara dos Deputados a adotarem, temporariamente, medidas de restrição do funcionamento de suas comissões”.

A pasta disse, também, esperar que ambas Casas Legislativas “possam retomar seus trabalhos assim que possível, especialmente no que toca à realização de sabatinas de novos chefes de missão diplomática no exterior e à sua apreciação em plenário”.

O consultor de análise política da BMJ, Lucas Fernandes, diz que por mais que as representações do Brasil no exterior não estejam abandonadas pela falta de um embaixador, a presença de um representante pode melhorar a política externa do governo brasileiro com os respectivos países.

“As embaixadas funcionam e não estão abandonadas. Mas a presença de alguém que recebeu um aceite traz muito mais força para articulação. Mesmo que as relações sejam conduzidas por quem está lá, essas pessoas não possuem tanta autoridade no cargo porque não foram investidas pelo Senado. Isso significa muito”, destaca.

Para Fernandes, como a imagem internacional do Brasil está prejudicada devido à atitude adotada por Bolsonaro no tratamento à pandemia, a figura do embaixador poderia amenizar os impactos. “Um embaixador pelo Senado poderia trazer melhores frutos. Um exemplo é em relação a Bolsonaro indo na contramão da OMS (Organização Mundial da Saúde) e não levando em conta as orientações dela. Há uma dificuldade adicional por não ter um embaixador permanente nos Estados Unidos. A relação, nesse caso, poderia ser melhor conduzida”, avalia.

Diretor da área internacional da consultoria Prospectiva, Ricardo Mendes pontua que, por mais que não haja perspectiva de o assunto entrar na agenda do Senado, deveria ser considerado. Segundo ele, “as atividades na embaixada continuam ocorrendo, mas o problema é não conseguir executar pautas positivas e novas entre os países”.

“Já deveriam estar sendo feitas costuras nos Estados Unidos com representantes. Na Argentina, há temas bilaterais de processo de abertura. As indicações para embaixadas deveriam entrar na agenda muito rápido e podem prejudicar se não houver uma mudança no prazo de um mês e meio”, alerta.

Diplomatas à espera*

Nome Embaixada Data da indicação Situação no Senado
Hermano Telles Ribeiro Beirute (Líbano) 31/7/2019 Aprovado pela CRE, aguardando votação em plenário
Nestor José Forster Junior Washington (Estados Unidos) 25/11/2019 Aprovado pela CRE, aguardando votação em plenário
Paulo Roberto Caminha de Castilhos França Haia (Países Baixos) 20/2/2020 Aguardando sabatina na CRE
Gerson Menandro Garcia de Freitas Tel Aviv (Israel) 13/3/2020 Mensagem da indicação ainda não chegou à CRE
Reinaldo José de Almeida Salgado Buenos Aires (Argentina) 21/5/2020 Mensagem da indicação ainda não chegou à CRE
Paulo Roberto Soares Pacheco Santiago (Chile) 21/5/2020 Mensagem da indicação ainda não chegou à CRE
Antônio Carlos de Salles Menezes Conacri (Guiné) 16/6/2020 Mensagem da indicação ainda não chegou à CRE
Colbert Soares Pinto Junior Praia (Cabo Verde) 16/6/2020 Mensagem da indicação ainda não chegou à CRE
Arthur Henrique Villanova Nogueira Lusaca (Zâmbia) 16/6/2020 Mensagem da indicação ainda não chegou à CRE
Oswaldo Biato Júnior Tbilisi (Geórgia) 16/6/2020 Mensagem da indicação ainda não chegou à CRE
José Antonio Gomes Piras Talin (Estônia) 16/6/2020 Mensagem da indicação ainda não chegou à CRE

O secretário especial de Desestatização e Desinvestimento do Ministério da Economia, Salim Mattar, usou o Twitter para dizer que um projeto do deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP) que autoriza o Poder Executivo Federal a adquirir o controle da Embraer “viola o artigo 173 da Constituição e tenta aumentar ainda mais o tamanho do Estado”.

O artigo citado por Mattar diz que “ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.”

“A Embraer, antes da privatização, tinha 9 mil funcionários. Atualmente, conta com mais de 28 mil entre empregados próprios e terceirizados. Dados como esse demonstram como as privatizações ajudam a ampliar o número de empregos”, escreveu o secretário no Twitter. “Propostas como essas trazem insegurança jurídica e podem afastar investimentos privados”, concluiu.

Mais cedo, Mattar havia postado no microblog pontos de suas apresentações no Ibef 2020, na qual ressaltou que “as privatizações são estratégicas em períodos de crise, atraem investimentos, melhoram o ambiente de negócios e a competitividade, aumentam o emprego e contribuem para a recuperação fiscal”.

Correio Braziliense