STF forma maioria para investigar fake news

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Foto: Carlos Alves Moura / STF

Alvo de críticas de governistas, o inquérito instaurado no Supremo Tribunal Federal (STF) para investigar notícias falsas e ataques a ministros da Corte deve continuar aberto. Na próxima quarta-feira, o plenário do tribunal vai julgar uma ação em que a Rede Sustentabilidade pede o arquivamento do caso, por irregularidades na tramitação. Ministros ouvidos em caráter reservado pelo GLOBO apontam que, por maioria, o inquérito será considerado legítimo e as investigações vão continuar.

Em manifestação ao STF, o procurador-geral da República, Augusto Aras, reconheceu nesta quinta-feira que a Corte tem sofrido ataques ilegais que vão além do conceito constitucional de liberdade de expressão: “O Supremo Tribunal Federal tem sido alvo de uma campanha difamatória. Temos visto manifestações que transbordam dos limites da liberdade de expressão para não só veicular notícias falsas (fake news), mas perpetrar crimes, sobretudo contra a honra da Suprema Corte e de seus integrantes”, escreveu.

Segundo Aras, a investigação sobre políticos com foro privilegiado no inquérito das fake news tem por base participação em “manifestações atentatórias ao STF” e está citada em trechos do inquérito que apuram o funcionamento do chamado “gabinete do ódio”. Aras não cita os políticos sob suspeita. Já foram seis deputados federais que prestaram depoimento sobre a distribuição de notícias falsas e a produção de campanhas difamatórias: Bia Kicis (PSL-DF), Carla Zambelli (PSL-SP), Daniel Silveira (PSL-RJ), Filipe Barros (PSL-PR), Luiz Phillipe Orleans e Bragança (PSL-SP) e Cabo Junio Amaral (PSL-MG).

A manifestação de Aras foi entregue em resposta à ação da Rede Sustentabilidade que contesta o inquérito. Aras cita o ministro da Educação, Abraham Weintraub, e o gabinete do ódio, como é conhecido o grupo que articula campanhas difamatórias nas redes sociais supostamente ligado ao Palácio do Planalto.

“Os primeiros investigados com prerrogativa de foro vieram a aportar nos autos, a partir de indícios de participações em manifestações atentatórias ao STF, apenas nos recentes apensos de número 70 e 74, os quais investigam, respectivamente, o chamado ‘Gabinete do Ódio’ e as manifestações do Ministro Abraham Weintraub reveladas em trechos da reunião Ministerial ocorrida em 22 de abril de 2020”, escreveu Aras, que ainda defendeu que o processo fosse fatiado para separar a análise de indícios referentes a políticos com foro especial.

A tendência de maioria do STF para validar o inquérito das fake news é fruto de uma unidade dos integrantes da Corte em torno do fortalecimento do STF como instituição. A decisão seria também uma forma de apoiar o ministro Alexandre de Moraes, alvo de ataques de aliados do presidente Jair Bolsonaro. Na semana passada, ele determinou buscas e apreensões em endereços de bolsonaristas suspeitos de disseminarem discurso de ódio e notícias falsas contras o Supremo.

No tribunal, ministros têm dito, publicamente e em caráter reservado, que o momento é de defesa da instituição. O presidente Bolsonaro tem sido presença frequente em manifestações que pedem o fechamento do STF, bem como do Congresso Nacional. Para os ministros, ao agirem com espírito de corpo, estão se defendendo de ataques de manifestantes e das investidas do presidente.

A ação da Rede chegou ao STF em março do ano passado, assim que o inquérito foi instaurado. O partido questionou o fato de a Procuradoria-Geral da República (PGR) não ter sido consultada sobre as investigações. Outro ponto foi Toffoli escolher Moraes para conduzir o caso, em vez de sortear um relator, como é a praxe.

Depois da operação contra bolsonaristas, o partido informou ao Supremo que não tem mais interesse no julgamento. De acordo com a Rede, se na origem o inquérito das fake news apresentava “indícios antidemocráticos”, agora ele teria se transformado em “um dos principais instrumentos de defesa da Democracia e da lisura do processo eleitoral”. No entanto, não existe a possibilidade de desistência nesse tipo de processo, como ressaltou o relator da ação, ministro Edson Fachin.

Toffoli decidiu pautar a ação para julgamento logo após a operação. O momento escolhido foi justamente para legitimar a medida determinada por Moraes, diante da tendência do plenário em apoiar o relator.

Também deve ser analisado na quarta-feira pedido de Augusto Aras para suspender o inquérito. O procurador-geral da República está incomodado com o fato de não participar das investigações e quer saber o papel do Ministério Público no caso. O plenário deverá declarar que a PGR tem o direito de se manifestar ao fim das investigações, para opinar se será apresentada denúncia ou se o caso deve ser arquivado.

Na operação da semana passada, foram feitas buscas e apreensões em endereços de 17 pessoas suspeitas de integrar uma rede de ataques a integrantes da Corte. O governo considerou a medida abusiva, o que deixou ainda mais delicada a relação do Supremo com o Planalto. Após as críticas sucessivas, Bolsonaro abaixou o tom, e emissários têm procurado integrantes do Supremo, como Moraes.

Toffoli também pautou para começar no dia 12 o julgamento de um habeas corpus ajuizado em nome do ministro da Educação, Abraham Weintraub, para que ele seja excluído do inquérito das fake news. O titular da Educação é alvo de apuração porque, na reunião ocorrida em 22 de abril no Palácio do Planalto, defendeu a prisão de ministros do Supremo, a quem chamou de “vagabundos”.

O julgamento do habeas corpus será feito no plenário virtual, sistema eletrônico no qual os ministros postam seus votos ao longo de uma semana, sem a necessidade de debate. Já a ação da Rede será julgada por videoconferência, com debate entre os ministros.

O Globo