Alcolumbre manobra para ficar no cargo

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Foto: Pedro França/Agência Senado

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), inaugura em julho a reta final de seu mandato no comando da Casa dedicado a solucionar uma complexa matemática na tentativa de se reeleger ao posto. Além de conseguir o voto dos colegas, ele precisa transpor um trecho da Constituição que tem sido seguido à risca pelo Congresso: a proibição de reeleição para presidências do Senado e da Câmara. Desgastado nos últimos meses, Alcolumbre tenta reorganizar uma “base eleitoral” se fiando na proximidade ao governo e em ligações com o Supremo Tribunal Federal.

É nessa relação com o Supremo que Alcolumbre traça sua principal estratégia para conseguir alterar as regras para permitir a reeleição. A Constituição diz que é “vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente” nos casos do comando da Câmara e do Senado. Superar esse trecho é sonho antigo de presidentes que já passaram pelas duas Casas. Propostas de emenda à Constituição (PEC) nesse sentido, porém, nunca avançaram.

Para derrubar esse empecilho, Alcolumbre precisaria articular a aprovação de uma PEC no Senado e na Câmara, que necessitam de pelo menos três quintos dos votos de senadores e deputados, ou de uma decisão do Supremo.

A carta na manga está em obter uma resposta positiva do STF a uma consulta que deve ser lançada por outro partido. A ideia é uma sigla aliada questionar a Corte se presidentes do Senado que terminam o mandato no fim da legislatura de quatro anos podem disputar a reeleição. Este é o caso de Alcolumbre: eleito em 2014, seu atual mandato de senador termina em 2022, junto com sua possível recondução ao cargo.

Integrantes da cúpula do DEM dizem já ter mapeado um cenário favorável a Alcolumbre no Supremo. Reservadamente, ministros do STF admitem “analisar com atenção” qualquer consulta nesse sentido, contrariando haver indicativos de que o questionamento será rejeitado de imediato. Segundo aliados, o presidente do Senado é muito bem relacionado com a maioria dos magistrados.

Se vencer essa barreira, Alcolumbre tem o desafio de ganhar o apoio dos colegas à recondução. Nesta tentativa, ele tem se equilibrado para manter a boa relação com o presidente Jair Bolsonaro e se fortalecer como o candidato do governo. Senadores veem movimentos discretos favoráveis a Alcolumbre vindos do ministro da articulação política do governo, Luiz Eduardo Ramos, da pasta de Governo.

Segundo interlocutores do Palácio do Planalto, a avaliação é de que o democrata desponta como melhor alternativa para continuar no comando do Senado. Para o governo, no último um ano e meio, Alcolumbre mais ajudou do que atrapalhou. Por outro lado, grupos no Senado se articulam para fazer frente a ele. Derrotado pelo democrata e pela pregação de uma “nova política” no início do ano passado, o MDB quer voltar ao comando da Casa.

Internamente, senadores do partido sustentam que são a maior bancada da Casa, com 13 parlamentares, o que vinha sendo critério nas eleições para a presidência, antes da vitória do DEM em 2019. Depois do fim do mandato de Eunício Oliveira (MDB-CE), os emedebistas perderam a dianteira do Senado para Alcolumbre. Renan Calheiros (MDB-AL) foi derrotado em meio a discursos de que ele representava a “velha política”.

No MDB, a dificuldade será encontrar um candidato que agrade a todas as alas do partido. O líder Eduardo Braga (AM), o líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (TO), a presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Casa, Simone Tebet (MS), e o próprio Renan são apontados como nomes que flertam com uma candidatura. Mais experientes, porém, eles preferem observar o cenário político antes de qualquer movimento. Isso porque, avaliam aliados, investigações envolvendo Bolsonaro podem ainda mudar os rumos da eleição.

Além do MDB, outras legendas, como o PSD, em ascensão na Casa, com 12 senadores, também sonham com a cadeira da presidência. Por fora, há ainda um grupo que reúne parlamentares de diferentes partidos, o Muda Senado, que deseja ocupar o espaço. Na semana passada, um representante deles, o senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO), expressou em sessão remota a vontade do grupo:

— Se o Alvaro Dias não for candidato à presidência, eu serei, para disputar com o senhor respeitosamente.

Alcolumbre vive altos e baixos entre senadores que o elegeram, em especial o grupo que chegou à Casa com o discurso de novas práticas na política. Foi cobrado por engavetar a CPI dos Tribunais Superiores, pelo silêncio em relação a pautas e declarações controversas do governo e por segurar projetos como o que prevê prisão imediata de condenados em segunda instância.

Além do desgosto dos mais radicais, perdeu força entre os considerados mais moderados que o ajudaram a chegar à presidência, como Simone Tebet, Tasso Jereissati (PSDB-CE) e Antonio Anastasia (PSD-MG), depois de se aproximar de velhos caciques da Casa.

Na tentativa de contornar essas dificuldades, Alcolumbre tenta ganhar apoio entre os colegas, que relatam gestos dele, como uma distribuição “mais democrática” de relatorias, o prestígio a projetos de parlamentares na pauta do plenário e espaços na Casa. A inclusão na pauta do projeto de lei de combate às fake news foi interpretada como uma sinalização de que Alcolumbre deseja agradar aos colegas mesmo que isso traga incômodo ao governo. No dia seguinte à aprovação da proposta, Bolsonaro avisou que poderá vetar a medida caso ela seja aprovada pela Câmara.

Em outra frente, Alcolumbre tem se colocado como uma ponte com o governo federal, para facilitar encontros e demandas dos senadores nos ministérios e no Planalto. Como o diálogo com a gestão Bolsonaro é considerado difícil, essa posição de Alcolumbre é elogiada entre colegas. Apesar dos sinais claros, as conversas sobre a sucessão à presidência ocorrido de forma discreta.

O Globo