Estatísticas ajudam a combater a pandemia

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Foto: Prefeitura de São João de Meriti

A contagem diária, crescente e acumulativa de mortos e contaminados é a estatística que domina o noticiário durante a pandemia no Brasil. Isso poderia ser diferente se a atenção tivesse sido dada a outras contabilidades que foram formuladas para ajudar a combater a Covid-19. Esses levantamentos numéricos continuam úteis mesmo agora que o vírus se espalha pelo interior do país e as metrópoles se arriscam a reabrir suas atividades.

Dois estudos se destacam pela abrangência nacional. O Índice de Vulnerabilidade dos Municípios foi elaborado pelo Instituto Votorantim para nortear as ações e doações do grupo industrial, mas depois foi divulgado publicamente e consultado por empresas e governos para tomada de decisões. Já o Índice de Vulnerabilidade ao Alastramento do Coronavírus foi organizado pela Fundação Perseu Abramo, entidade criada dentro do PT (Partido dos Trabalhadores), e está mais voltado a gestores públicos e sociedade civil para pressionar por medidas que diminuam o impacto da crise.

“Nosso levantamento já apontava o perigo da densidade populacional nas grandes cidades, mas também mostrava como a distância dos serviços de saúde e das informações poderiam afetar quem mora nos municípios menores, rurais. É só lembrar que muitas pessoas no sertão nordestino não tem acesso a água nem a saneamento básico. Então, como elas podem lavar as mãos, que é a forma básica de prevenção ao vírus?”, argumenta Rafael Gioielli, diretor geral do Instituto Votorantim.

Ronnie Silva, geógrafo responsável pelo IVC, também aponta a atualidade do índice divulgado em abril nesse momento em que a pandemia se expande, enquanto pressões políticas e econômicas querem a retomada das atividades.

“Nosso estudo tem informações separadas por município e por vulnerabilidade para os governos pensarem em ações específicas para diminuir o risco de pessoas que precisam sair às ruas. Nos bolsões de informalidade, por exemplo, pode haver uma renda cidadã local, complementar ao dinheiro enviado pelo governo federal, para que pessoa não vá trabalhar nesses dias. Ou fazer testes de contágio em bairros mais vulneráveis para que essa testagem seja mais eficiente”, afirma Silva.

Os dois índices levam em conta dados sociais, econômicos e de saúde, atualizados e oficiais. Mas algumas fontes de informação são diferentes, e os pesos de cada item também. Resultado: o ranqueamento dos 5.570 municípios do país é bem diverso de um para o outro.

As cinco cidades mais vulneráveis do país, segundo o IVM, são pequenas e interioranas: Mojuí dos Campos (PA), Wanderley (BA), Ibirataia (BA), Sítio do Quinto (BA) e Jussiape (BA). Isso aconteceu porque o peso maior desse índice caiu sobre a estrutura e organização da saúde na região.

Já o IVC apontou cinco municípios de regiões metropolitanas como os mais ameaçados pela pandemia: São João de Meriti (RJ), Taboão da Serra (SP), Carapicuíba (SP), Nilópolis (RJ) e Diadema (SP). Nesse levantamento, a densidade demográfica e a presença de favelas foram preponderantes para a seleção dessas localidades.

“Soube que o pessoal da Baixada Fluminense usou o estudo para reclamar das autoridades, gravaram vídeos no YouTube com os dados e dei entrevista para a mídia local. Ali, ele cumpriu sua função de ajudar a pressionar por medidas efetivas”, conta Silva.

O IVM foi citado pelo prefeito de São Bernardo do Campo quando o governador de São Paulo, João Doria, excluiu a cidade do ABC da retomada das atividades, no final de maio. Orlando Morando usou a informação que a cidade era o 2º lugar menos vulnerável do país, segundo o IVM, como um dos argumentos.

A Unesp (Universidade Estadual de São Paulo) também fez estudos para ajudar a combater a disseminação do novo coronavírus. O levantamento, limitado ao território paulista, mostra a probabilidade da doença chegar a determinada cidade pelas ligações rodoviárias e o trânsito de pessoas que ela tem com outras localidades.

O Instituto Votorantim já está planejando novos rankings nacionais para ajudar no cenário pós-pandemia. “Vamos fazer uma mapa para ajudar a educação na retomada das aulas. E estamos elaborando outro índice para inclusão produtiva, afinal, muitas cadeias de produção foram impactadas, muitos empregos perdidos, como, por exemplo, no turismo”, relata Gioielli.

Por seu lado, Silva já tinha trabalhado no Índice de Exclusão Social e usou essa experiência para formatar o IVC. Esses tipos de ranking têm como parâmetro o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), divulgado pelas Nações Unidas, que inaugurou os levantamentos numéricos que misturam dados sociais e econômicos para sintetizar o padrão de vida de determinada área – pode ser país, estado, município ou bairro.

Outro exemplo de levantamento com diversos indicadores utilizados é o Atlas da Vulnerabilidade Social, produzido pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), órgão vinculado ao Ministério da Economia.

“São assuntos complexos e múltiplas dimensões que não cabem em um só número. Nesses indicadores sintéticos há sempre o risco de simplificação. Mas se houver inteligência na montagem do índice, ele ajuda muito para a análise, o planejamento e a ação”, diz Gioielli.

O IVM foi feito para orientar as ações do Grupo Votorantim durante a pandemia, e um dos locais ajudados foi a região da Chapada do Araripe, na tríplice fronteira entre Pernambuco, Ceará e Piauí. “Ter uma visão regional é muito relevante. Ajudamos o sistema de saúde de Araripina, em Pernambuco, porque tem um polo hospitalar. Já em Curral Novo, no Piauí, optamos por distribuir cestas básicas, porque o problema lá era assistencial. Assim, a ação foi mais eficiente”, explica Gioilli. Depois, o índice foi usado por outras empresas, como a mineradora Vale, e prefeitos.

Já Silva, elaborador do IVC, foi consultado por vários municípios de Minas Gerais. “O índice pode dar um norte, uma ideia de onde atuar para minimizar o problema. Os municípios podem se basear nele para pensar e criar rapidamente suas políticas públicas”, afirma Silva.

O IVC dividiu seus subíndices em densidade demográfica, faixa etária, saúde (dados de internações com problemas respiratórios e comorbidades dos últimos cinco anos), saneamento básico e mercado de trabalho. Já o IVM calculou a população vulnerável, a economia local, a estrutura e organização do sistema de saúde (com ênfase nos leitos, equipamentos e população coberta pelo SUS) e capacidade fiscal da administração municipal.

“O indicador sintético é uma ferramenta a mais para decidir, priorizar, agir e depois avaliar. Nessa hora em que todo mundo está precisando, dá ideia do que é mais necessário fazer”, opina Gioielli.

Quais são as cidades mais vulneráveis?
Segundo o levantamento do Instituto Votorantim, os dez municípios são:

Mojuí dos Campos (PA)
Wanderley (BA)
Ibirataia (BA)
Sítio do Quinto (BA)
Jussiape (BA)
Delmiro Gouveia (AL)
Ubaitaba (BA)
São Francisco (MG)
São Raimundo Nonato (PI)
Faro (PA)
Já o índice da Fundação Perseu Abramo aponta:

São João de Meriti (RJ)
Taboão da Serra (SP)
Carapicuíba (SP)
Nilópolis (RJ)
Diadema (SP)
Olinda (PE)
Osasco (SP)
Barreirinha (AM)
Belford Roxo (RJ)
Cametá (PA)

Uol