PGR endurece contra bolsonaristas

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Foto: Pedro Ladeira/Folhapress

Isolado internamente e alvo de críticas no Supremo Tribunal Federal, o procurador-geral da República, Augusto Aras, usou o inquérito dos atos antidemocráticos para investigar aliados do presidente Jair Bolsonaro e mandar sinais de isenção à própria categoria e ao STF.

A PGR fechou o cerco aos organizadores dos protestos que pediam fechamento do Congresso e do Supremo e realizou ações contra deputados e apoiadores do governo. Além disso, agiu com celeridade no caso dos fogos de artifícios lançados em direção à sede da corte.

Essa postura de Aras foi bem recebida no Supremo, que também tem interesse em manter boa interlocução com a PGR.

Isso porque a punição de pessoas que atacam o STF e estão sendo investigadas no inquérito das fake news depende diretamente do procurador-geral, responsável por denunciar autoridades com foro ou por encaminhar os casos para terem seguimento em instâncias inferiores.

O alinhamento com o Supremo começou justamente na semana anterior ao julgamento que validou a investigação contra ameaças e disseminação de notícias falsas a integrantes do STF.

A disputa com a força-tarefa da Lava Jato, dizem interlocutores de ministros e do PGR, também ajudou a melhorar a relação com o STF, principalmente com a ala da corte crítica à operação.

A reaproximação com o STF ocorre no momento em que Aras enfrenta uma queda de braço interna com um movimento que tenta limitar seus poderes. Nas últimas semanas, ele sofreu quatro derrotas nas eleições para o Conselho Superior do Ministério Público Federal e perdeu a maioria no colegiado responsável por diversas definições importantes do órgão.

No último dia 8, o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, afirmou que Aras tem agido com “prudência e parcimônia” e que recebe críticas “injustas”.

A declaração ocorreu quando o procurador-geral mais precisava, cinco dias depois de ter se envolvido em uma polêmica sobre a interpretação do artigo 142 da Constituição.

Em entrevista à Globo, ele afirmou que um Poder que invade a competência de outro perde suas garantias constitucionais e isso poderia ensejar uma atuação das Forças Armadas.

No mesmo dia, soltou uma nota para tentar justificar a afirmação, que pegou mal entre integrantes do Ministério Público. A nova posição sobre o tema, porém, não foi suficiente para acalmar os ânimos dentro da PGR.

Os integrantes do órgão mantiveram as críticas sobre a proximidade de Aras com Bolsonaro e, no Congresso, ganhou força uma proposta que visa vincular a indicação do chefe do Executivo para a PGR à lista tríplice eleita pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR).

O atual PGR não estava na lista e sequer participou da disputa.

Neste cenário, Toffoli foi o primeiro a estender a mão e sair em defesa do procurador-geral, que, segundo ele, tem atuado perante o STF com “coragem” e sem “cair em vaidades”. O ministro o cumprimentou por “não querer holofotes”, como disse ter acontecido em um passado recente, em referência indireta ao ex-PGR Rodrigo Janot.

Aras retribuiu a gentileza. Depois de ter se oposto a medidas adotadas pelo ministro Alexandre de Moraes no inquérito das fake news contra aliados do presidente, a PGR endureceu o discurso e fechou o cerco aos defensores do fechamento do Congresso e do STF.

A procuradoria-geral pediu, e Moraes autorizou, 29 mandados de busca e apreensão contra parlamentares, empresários e militantes influentes na base do chefe do Executivo.

Os deputados Bia Kicis (PSL-DF), Guiga Peixoto (PSL-SP), Aline Sleutjes (PSL-PR) e General Girão (PSL-RN) foram alvo da operação e passaram a ser investigados porque teriam usado verba parlamentar para incentivar os atos antidemocráticos.

Além disso, a PGR solicitou, e Moraes também autorizou, a prisão da extremista Sara Winter, que era líder do grupo armado de direito “300 do Brasil” e costumava insultar ministros do STF.

No episódio em que apoiadores de Bolsonaro dispararam fogos de artifício em direção à sede do STF o alinhamento entre Supremo e PGR também foi imediato. O presidente da corte pediu, e Augusto Aras instaurou um procedimento para investigar o caso horas depois.

Na última sessão do STF do semestre, o PGR foi o responsável pelo discurso mais enfático em defesa da corte. Ele citou os ataques ao Supremo e ressaltou a necessidade de distinguir liberdade de expressão do cometimento de crimes previstos nas leis penais e na Lei de Segurança Nacional.

Ainda segundo Aras, a PGR e o STF deram mostras de “vigor institucional e atuaram tanto em prol do direito à vida quando em prol da ordem econômica e dos direitos coletivos, todos ameaçados” na crise do novo coronavírus.

Já o enfrentamento com a Lava Jato ajudou a melhorar a relação com a ala do STF que sempre fez críticas à operação, sempre exaltada pelos antecessores de Aras.

A disputa do comando da procuradoria-geral com os investigadores começou após a subprocuradora Lindora Araújo, uma das principais aliadas do PGR, fazer uma visita à força-tarefa da Lava Jato em Curitiba.

A visita foi mal vista por parte dos integrantes do MPF no Paraná. Eles questionaram a iniciativa de Lindora Araújo e, em ofício enviado à Corregedoria do MPF, acusaram ela de realizar manobra ilegal para copiar bancos de dados sigilosos de investigações de maneira informal e sem apresentar documentos ou justificativas para a tomada dessa providência.

A Lava Jato disse não saber se a ida da subprocuradora foi de natureza “administrativa, correicional ou finalística” e ressaltou nunca ter sido informada sobre a pauta da reunião. A corregedora-geral do MPF, Elizeta Ramos, abriu uma sindicância para apurar o caso.

A reação da força-tarefa irritou Aras, que respondeu as insinuações em uma nota dura, em que disse que o grupo não é um “órgão autônomo” do Ministério Público.

“Fora disso, a atuação passa para a ilegalidade, porque clandestina, torna-se perigoso instrumento de aparelhamento, com riscos ao dever de impessoalidade, e, assim, alheia aos controles e fiscalizações inerentes ao Estado de Direito e à República, com seus sistemas de freios e contrapesos”, disse Aras.

MORDE:
1. A PGR abriu procedimento preliminar para verificar se o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente, pode ser enquadrado na Lei de Segurança Nacional por ter afirmado que não é questão de “se, mas de quando” irá ocorrer uma ruptura institucional. Aras disse que, “caso surjam indícios mais robustos”, pedirá ao STF a instauração de inquérito.

2. A procuradoria-geral pediu, e Moraes autorizou, 26 mandados de busca e apreensão no inquérito dos atos antidemocráticos contra deputados e apoiadores influentes da base bolsonarista.

3. A PGR foi a responsável por acabar com o acampamento do grupo de extrema-direita “300 do Brasil”, que insultava ministros do STF. A líder do grupo, Sara Winter, e outras cinco pessoas que participavam do acampamento também foram detidas.

4. A PGR instaurou procedimento para investigar o disparo de fogos de artifício em direção ao prédio do STF

ASSOPRA:
1. Aras sustentou que o chefe do Executivo tem o direito de escolher data e horário do depoimento à PF ou se prefere prestar esclarecimentos por escrito. O PGR ressaltou, ainda, que Bolsonaro tem direito de permanecer em silêncio.

2. Na primeira operação que mirou aliados de Bolsonaro por ameaças e propagação de notícias falsas sobre o STF, Aras deu parecer contra os 29 mandados de busca e apreensão. Aras defendeu a “liberdade de expressão dos investigados” e se opôs a medidas contra deputados e contra apoiadores como Roberto Jefferson e Allan dos Santos.

3. Aras também se alinhou ao governo em relação ao sigilo do vídeo da reunião ministerial de 22 de abril citada pelo ex-ministro Sergio Moro em depoimento à Polícia Federal. O procurador-geral defendeu que fossem divulgados apenas trechos da reunião que tivesse conexão com o inquérito que apura se Bolsonaro interferiu na PF.

4. Aras se posicionou contra a apreensão do celular de Bolsonaro solicitada por parlamentares no inquérito que apura se o presidente violou a autonomia da PF.

Folha De S. Paulo