Briga entre Lava Jato e PGR atrasa suspeição de Moro

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Foto: Reprodução

O racha entre a Procuradoria-Geral da República (PGR) e a força-tarefa de Curitiba pode atrasar ainda mais a análise do habeas corpus (HC) em que os advogados pedem a suspeição do então magistrado Sergio Moro, ex-ministro da Justiça, nas causas que envolvem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu ilegal conduta de Moro em ação penal contra Lula, a defesa do petista renovou a estratégia jurídica para tentar anular outros atos da Operação Lava-Jato – bem como a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que o considerou um ficha-suja.

Cabe ao ministro relator na Segunda Turma, Gilmar Mendes, definir uma data para o exame do HC sobre a suspeição. Segundo fontes próximas, o ministro entende que o tema é delicado demais para ser examinado por videoconferência, mas pondera a falta de perspectivas para o fim da pandemia. De todo modo, agora, ele tende a esperar que se resolva no plenário o embate entre PGR e força-tarefa de Curitiba sobre o compartilhamento de dados da Operação Lava-Jato.

A atenção se volta para a presença ou não do ministro Celso de Mello no julgamento, em razão do seu estado de saúde – o STF divulgou que ele pode ser submetido a uma nova cirurgia em breve. O decano é tido como o “fiel da balança”: há dois votos contra a suspeição (Edson Fachin e Cármen Lúcia) e outros dois que tendem a reconhecer os supostos abusos. Um empate, por exemplo, favoreceria o réu.

A equipe de Lula tem atuado em três frentes – uma no Brasil, outra nos Estados Unidos e uma terceira na Suíça. No que chamam de “investigação defensiva”, os advogados tentam acessar novas evidências que comprovem a sua teoria: a de que as investigações ocorreram mediante cooperação ilegal com autoridades estrangeiras e contaram com documentos adulterados da Odebrecht. O acesso ao acordo de leniência da empreiteira, concedido pelo STF na semana passada, é um dos pontos-chave dessa nova fase. A aposta dos advogados é a de que a leniência possa esclarecer as supostas irregularidades.

No Superior Tribunal de Justiça (STJ), há um pedido para que o governo brasileiro esclareça se a cooperação com o FBI, agência de inteligência norte-americana, passou pelo crivo do Ministério da Justiça – como prevê um acordo bilateral – ou se ocorreu de maneira informal. A Procuradoria-Geral da Suíça e o Departamento de Justiça dos EUA não concederam cópias documentais à defesa, nem se manifestaram sobre a existência ou não de tratativas alheias aos canais oficiais.

Na semana passada, a Segunda Turma do STF entendeu que Moro tentou, com seus atos judiciais, interferir no resultado da eleição de 2018, da qual saiu vencedor o presidente Jair Bolsonaro, cujo governo ele viria a integrar como ministro da Justiça. Isso porque o ex-juiz, a seis dias do primeiro turno, retirou o sigilo da delação premiada do ex-ministro Antonio Palocci, anexando-a aos autos da ação que apura propina da Odebrecht a Lula, na forma de um terreno em São Bernardo do Campo (SP).

Os dois votos que formaram a maioria (só havia três ministros presentes na sessão) deram o tom do que pode vir a ser o julgamento sobre a suspeição. O ministro Ricardo Lewandowski disse que Moro quis “gerar um fato político” e atuou de forma “completamente extravagante”. Já o ministro Gilmar Mendes falou em “indicativos da quebra da imparcialidade”.

Um outro efeito do julgamento pode se dar na seara eleitoral. Pela primeira vez de forma colegiada, os ministros sinalizaram que as decisões do Comitê de Direitos Humanos da ONU são vinculantes, ou seja, de cumprimento obrigatório pelo Brasil. Em 2018, o comitê afirmou que Lula tinha direito de disputar eleições enquanto a sua condenação não fosse definitiva. O TSE, contudo, manteve impugnada a sua candidatura. Até esse ponto, o ex-presidente figurava à frente de Bolsonaro nas pesquisas.

A Odebrecht não quis comentar; Moro, em nota, nega ter agido com intenções políticas.

Valor Econômico