MDB cumpre vocação adesista e se aproxima do governo

Todos os posts, Últimas notícias

Foto: Leonardo Rodrigues/Valor – 28/10/2019

Visto hoje como principal alternativa para a oposição garantir que o próximo presidente da Câmara mantenha independência em relação ao presidente Jair Bolsonaro, o MDB tem sido um partido quase tão governista nas votações quanto os demais do Centrão que aderiram ao governo. Desde maio, os deputados da sigla deram 90% de seus votos seguindo a orientação do Executivo – os de PP e Republicanos, “núcleo duro” da nova base aliada, tiveram índice de 94%.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), eleito três vezes com apoio da oposição, está impedido de concorrer. O deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) era visto como favorito para ser o candidato dele, mas perdeu espaço dentro do próprio partido e agora as apostas se voltam para o presidente do MDB e líder da sigla na Câmara, Baleia Rossi (SP). Seus adversários e a oposição, porém, têm ressalvas à imagem de independência.

Baleia tenta acabar com a fama de fisiológico e governista do MDB e afirma que o partido é independente. Dá como exemplo as notas em defesa da democracia após Bolsonaro acenar com um golpe militar e defende que a alta taxa de apoio ao governo na Câmara é pela posição favorável aos projetos liberais na economia. “Mas, quando algo nos incomoda e entendemos que devemos votar contra, votamos”, disse. O alto percentual de apoio ocorreu, na visão dele, porque o combate à covid-19 uniu a todos.

Nas votações em que não houve consenso entre os partidos, porém, os emedebistas estão entre os mais alinhados ao governo, segundo dados tabulados pela equipe de Análise Política da XP Investimentos. Eles acompanharam o Executivo em 89% dos projetos e requerimentos votados pelo plenário entre maio e julho – foram 102 votações. O apoio é igual ao do PSD e acima dos 88% do PSC, ambos assumidamente governistas

Outras siglas ditas independentes divergiram mais, como DEM (índice de governismo de 83%), Novo (82%), PSDB (78%) e Cidadania (62%). Já a oposição teve taxas entre 26% (PDT) e 6% (PT). PP, PL e Republicanos, que lideraram a aliança com Bolsonaro, seguiram o governo em 93% das vezes. Antes de maio (quando foi selada a aliança), o MDB seguia posição parecida dos demais partidos do Centrão e também votava mais contra os interesses do Executivo.

Nem todos os projetos em que MDB e governo estiveram alinhados tem relação com a pandemia ou a agenda econômica. A sigla apoiou quase que integralmente a proposta de flexibilizar as lei de trânsito – foram 17 votações e apenas uma divergência.

De fato, o MDB foi responsável, junto com o grupo liderado por Maia, por derrotas do governo, como a aprovação do auxílio emergencial para os profissionais do esporte. Mas, na oposição, a palavra “independente” é evitada para classificá-los. “Não tem isso de base versus independentes. A Câmara está dividida entre grupo do Arthur Lira [líder do PP], o grupo do Maia e a oposição”, diz um líder influente.

Outra postura vista com ressalvas na oposição – e citada por Lira para atrair votos deles na disputa pela presidência – são os cargos do MDB no governo, em funções nos Estados e até nacionalmente. Os emedebistas dizem que isso é natural por apoiarem parte dos projetos e que o DEM, que também se diz independente, tem inclusive mais espaço, com os Ministérios da Agricultura e da Cidadania e a Codevasf – controlada por outro pré-candidato do grupo, Elmar Nascimento (DEM-BA).

Baleia diz que os cargos são indicação direta dos parlamentares, sem aval do partido, mas ele próprio é apontado como padrinho do secretário nacional de Habitação do Ministério do Desenvolvimento Regional, que coordena o Minha Casa Minha Vida. O presidente do MDB afirma que Alfredo Santos é um empresário de Ribeirão Preto (SP), sua base eleitoral, e que foi consultado sobre as qualificações, mas nega que tenha pedido a nomeação. “Qualquer pessoa que estiver no governo e que tenha sua permanência atribuída ao MDB, o governo pode substituir.

Para nós não muda nada”, disse. Para o analista político da XP, Paulo Gama, historicamente a Câmara tem uma resistência a presidentes nitidamente apoiados pelo governo e por isso os pré-candidatos tentam afastar essa marca. “Mas, independentemente de o grupo do Maia ter ou não posições no governo, a maneira como a história está sendo contada facilita para eles oferecerem um candidato que se promova como mais independente do governo”, opina. “Será mais difícil para o Lira, precisando exercer a função de líder informal do governo, conseguir carimbar o outro grupo”, diz.

Há, também, um movimento de aproximação mais “institucional”. Bolsonaro tem se aconselhado com o ex-presidente Michel Temer (MDB) e até o convidou para chefiar a missão que levará ajuda ao Líbano – e acompanhará pessoalmente o embarque amanhã.

Valor Econômico